Debatedores apoiam Ciências sem Fronteiras, mas cobram avaliação do programa

Da Redação | 25/08/2015, 15h03

O Programa Ciência sem Fronteiras é importante para o processo de internacionalização do ensino brasileiro e contribui para a formação de recursos humanos para o país, mas ainda apresenta problemas como a falta de um sistema de acompanhamento e avaliação dos estudantes que voltam para o Brasil. A conclusão é dos debatedores que participaram nesta terça-feira (25) de audiência pública na Comissão de Ciência e Tecnologia (CCT).

Os dirigentes das universidades que enviaram alunos para o programa registraram o salto que as instituições obtiveram, apesar dos problemas e burocracias iniciais. O nome brasileiro ganhou mais visibilidade no cenário da educação superior, e mais parcerias com estrangeiras foram firmadas, disseram.

— A internacionalização sempre aconteceu nas universidades brasileiras em níveis diferentes. Algumas nem tinham uma política de relações internacionais. Havia uma predominância da cooperação internacional pela pesquisa, e não pelo ensino. O Ciência sem Fronteiras foi uma inovação — disse Márcio Barbosa, secretário de Relações Internacionais e Interinstitucionais da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN).

Entretanto, todos admitiram não existir uma avaliação sistematizada do conhecimento obtido pelos alunos nas parceiras estrangeiras, e muito menos um acompanhamento de suas trajetórias no mercado de trabalho após a temporada de estudos no exterior. Segundo os debatedores, essa deficiência dificulta a mensuração de resultados concretos do programa para a sociedade.

— Essa é uma preocupação que temos, a falta de controle e avaliação, como que o egresso do programa está. A UnB não tem condições de fazer a avaliação e o acompanhamento — resumiu Marcelo Rezende, diretor de Acompanhamento e Integração Acadêmica da Universidade de Brasília.

Dúvidas

O senador Cristovam Buarque (PDT-DF), presidente da comissão, se manifestou favoravelmente ao programa, que, em sua opinião, deve continuar a existir, mas com aperfeiçoamentos.

— O Brasil é melhor tendo o Ciência Sem Fronteiras do que não tendo. O que a gente precisa discutir é como fazer com que, de fato, esse programa se torne um instrumento de transformação, colocando o país no mundo da inovação —ressaltou.

Já o senador Omar Aziz (PSD-AM), apesar de se dizer favorável ao programa, criticou o envio de alunos da graduação para o estudo em universidades do exterior, justamente o maior número de bolsistas beneficiados. Na opinião do senador, a prioridade deveria ser aos alunos de pós-graduação, mestrado e doutorado que pudessem disseminar para estudantes que ficaram no Brasil o conhecimento e os diferenciais obtidos no ensino privilegiado e pago com o dinheiro da população. Aziz é o responsável pela análise dessa política pública em 2015, e para isso pediu a audiência.

No mesmo sentido opinou o vice-reitor da Universidade Federal do Amazonas (Ufam), Hedinaldo Narciso.

— Acredito que a pós-graduação deveria ser mais incentivada a participar. E, sobretudo, o programa deveria trazer gente do exterior para ajudar na formação de recursos humanos aqui — observou.

O vice-reitor lembrou que o investimento no Ciência sem Fronteiras é muito alto, em detrimento de demandas básicas de algumas instituições, como a qualidade e a velocidade da internet. Além disso, Narciso salientou o grande número de estudantes selecionados para o intercâmbio oriundos do centro-sul, com número mais baixo das Regiões Norte e Nordeste.

Na análise do programa, os representantes das universidades também apontaram falhas na proficiência dos estudantes nos idiomas estrangeiros, uma lacuna a ser preenchida, e na falta de comunicação direta entre a universidade brasileira e a parceira estrangeira. Também foi mencionada a necessidade de investir no caminho contrário, com estrangeiros vindo estudar nas escolas brasileiras, a chamada internacionalização ativa.

O assessor de Apoio à Cooperação de Assessoria de Relações Externas da Universidade Estadual de São Paulo (Unesp), Carlos Vergani, participou igualmente da audiência.

Alunos

Empolgados com a oportunidade que tiveram fora do país, os ex-bolsistas que participaram da audiência defenderam o programa, que, disseram, pode ajudar a corrigir o déficit de pessoal qualificado nas áreas tecnológicas. Eles relataram suas experiências e o enriquecimento cultural e educacional obtidos no exterior. O método de estudo das universidades americanas, principalmente, que estimulam a pesquisa e focam nas aulas práticas, e o incentivo à inovação sem burocracia impressionaram Lucas Pinheiro, engenheiro mecânico que estudou em Ohio.

Ele relatou o estágio em empresas de tecnologia e a vivência nos laboratórios altamente equipados, muitas vezes a partir de parcerias público-privadas, algo que poderia ser copiado no país, disse. Sua experiência na academia americana o levou a contribuir com uma empresa criada em Brasília. Ele criou um motor elétrico para ventiladores que supera em 300% a eficiência energética de outros motores com selo A para o eletrodoméstico.

— Acreditem mais nos bolsistas e nos recursos humanos que estão sendo formados — desafiou.

Guilherme Manços, ex-bolsista e mestrando da Universidade de São Paulo (USP), fundou a Rede CsF, para integrar os ex-beneficiários do programa. Ele destacou o déficit de engenheiros no Brasil ao apresentar um estudo comparativo dos países que formam o Brics (Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul), mostrando que o país forma 40 mil engenheiros por ano, frente aos 650 mil na China, 220 mil na Índia e 190 mil na Rússia. Mas citou dificuldades para inovar e trabalhar no país.

— O Ciência sem Fronteiras é uma demanda do país, e é importante que se mantenha o foco na solução desses problemas. A segunda reflexão é o retorno, como a gente vai manter esses recursos humanos, esses profissionais aqui no Brasil e como a gente vai dar infraestrutura, recursos e um ecossistema capaz para reter desenvolver e fomentar esses talentos — disse.

Agência Senado (Reprodução autorizada mediante citação da Agência Senado)