Adiada votação do projeto que susta política de transporte rodoviário

Da Redação | 06/08/2020, 21h48

O Senado adiou a votação do Projeto de Decreto Legislativo (PDL) 752/2019, que suspende a Política Federal de Estímulo ao Transporte Rodoviário Coletivo Interestadual e Internacional de Passageiros. Essa política é regulamentada pelo Decreto 10.157, de 2019, editado pelo presidente Jair Bolsonaro em dezembro do ano passado.

Inicialmente, a votação do PDL estava prevista para a sessão desta quinta-feira (6). O senador Marcos Rogério (DEM-RO) chegou a ler seu relatório durante a sessão, mas houve divergências sobre a matéria. O senador Izalci Lucas (PSDB-DF) se disse desconfortável para votar a matéria e sugeriu o adiamento, que também foi solicitado pela senadora Rose de Freitas (Podemos-ES). O senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP) declarou que seria cômodo para a oposição tentar impor uma derrota ao governo, mas reconheceu a controvérsia sobre a constitucionalidade do decreto do governo.

O senador Eduardo Gomes (MDB-TO), que presidiu a sessão, informou que a votação do PDL deve ocorrer na próxima semana, depois que houver um entendimento entre os líderes partidários e o presidente do Senado, Davi Alcolumbre.

Autorização

O decreto do governo permite a outorga do transporte rodoviário coletivo para empresas privadas por meio de autorização, em vez de concessão. A concessão é um contrato firmado após um processo de licitação, com prazo definido e diretrizes para a prestação do serviço. Já a autorização é um ato discricionário (ou seja, não depende de processo seletivo) e pode ser entregue ou retirada a qualquer momento.

Autor do PDL 752/2020, o senador Weverton (PDT-MA) afirma que o decreto do governo tem irregularidades. Sua argumentação é que a iniciativa do governo, ao permitir a autorização, vai contra a Constituição e prejudica a oferta dos serviços em regiões menos lucrativas do país — visto que, sem as regras de uma licitação, a empresa prestadora poderia atuar apenas onde ela escolher. Para Weverton, a norma acabou se excedendo em seu poder regulamentar, porque esse serviço público só poderia ser outorgado à iniciativa privada mediante concessão ou permissão, e sem dispensa de licitação.

Inconstitucional

A divergência entre os senadores ocorreu diante da interpretação da norma do governo como inconstitucional. O relator da matéria, Marcos Rogério, defendeu o projeto de Weverton. Marcos Rogério argumentou que, com o decreto, o Executivo pretende, "na prática, permitir que as transportadoras escolham livremente as linhas de ônibus que irão ofertar à população, prejudicando os passageiros, que perderão a garantia de deslocamento entre localidades que não forem consideradas economicamente viáveis”. O relator também defendeu o entendimento de que o transporte rodoviário coletivo é serviço público que não pode ser outorgado por autorização, de acordo com o texto constitucional.

— Tal medida, evidentemente, compromete o direito da população à locomoção — alertou o senador.

Na visão do senador Rodrigo Pacheco (DEM-MG), há uma “manifesta inconstitucionalidade” no decreto do governo. Ele lembrou que a licitação é importante, inclusive, para as finanças da União. Para o senador Otto Alencar (PSD-BA), a sustação do decreto é correta e importante. O senador Acir Gurgacz (PDT-RO), além de elogiar o relatório de Marcos Rogério, afirmou que a sustação é uma forma de proteger os passageiros.

Por outro lado, o líder do governo no Senado, Fernando Bezerra Coelho (MDB-PE), defendeu o decreto do Executivo. Ele disse que o decreto apenas regulamenta a Lei 10.233, de 2001, e tem fundamento legal e constitucional. Para o Bezerra, a decisão do governo oferece mais segurança jurídica e não extrapola o poder regulamentar. Ele também argumentou que o decreto amplia o mercado do setor, trazendo benefícios para o usuário. Segundo Bezerra, a sustação dessa política seria um retrocesso.  

— O decreto promove a abertura do mercado e a livre concorrência, a fim de ofertar serviços de qualidade e com segurança para os passageiros — disse o líder do governo.

O senador Esperidião Amin (PP-SC) anunciou voto contrário à sustação e lembrou que sempre defendeu a realização dessa votação após a pandemia. Ele disse que, na prática, os municípios não estão lidando com novas autorizações, e destacou que considerar o decreto do governo como inconstitucional é, “no mínimo, uma temeridade”.

Diante da controvérsia, a matéria foi retirada de pauta.

ANTT

Em seu relatório, Marcos Rogério acrescentou uma emenda que susta a Deliberação 955, de 2019, da Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT), à exceção do artigo 1º da norma. Ele argumenta que a deliberação trata de assunto correlato ao PDL 752/2020 e vai contra o artigo 175 da Constituição — que determina que o serviço público somente pode ser prestado mediante licitação. Além disso, de acordo Marcos Rogério, a deliberação é contrária a previsões legais e até mesmo a regulamentos da própria agência.

Agência Senado (Reprodução autorizada mediante citação da Agência Senado)