Jovem com síndrome de Down encara sogro e pede mão de colega em namoro

Ricardo Westin | 02/08/2016, 09h36

O pai toma um susto quando um jovem com síndrome de Down o aborda pedindo autorização para namorar a filha adolescente dele, que também tem Down. O desinibido pretendente afirma que não é “de se jogar fora” nem “cafajeste”. Ela sorri e pega na mão dele. Encorajado, o rapaz continua a persuasão, garantindo que é “bacana, inteligente e trabalhador”.

A comovente cena ocorreu no final de 2014, em São Paulo, mas só em maio deste ano se tornou conhecida no Brasil inteiro, depois que o vídeo, gravado com um celular, foi postado no Facebook e viralizou. O pedido de namoro já teve 19 milhões de visualizações e 520 mil compartilhamentos.

Os argumentos convenceram. Passados quase dois anos, o namoro continua firme e forte. Rebeca agora tem 17 anos e Bruno, 22. O pai dela, o empresário Ricardo de Oliveira Martins, de 47 anos, conta que ficou “sem chão” quando ouviu o ousado pedido.

A seguir, trechos do depoimento de Martins ao Jornal do Senado:

“Eu esperava a Rebeca sair da aula de dança e, de longe, vi que ela estava de mãos dadas com um colega. Senti um frio na barriga. O Bruno veio na minha direção e foi logo disparando todas aquelas palavras com sinceridade e inocência. Fiquei um pouco sem chão na hora, mas acabei permitindo. Achei muito nobre que ele, sem nunca ter me visto, tomasse aquela coragem. Vi que era uma coisa muito pura.

O namoro deles é bem ingênuo. Eles se falam todos os dias pelo telefone e se veem nos fins de semana. O Bruno passa alguns domingos na nossa casa, almoça conosco. Eles ficam de mãos dadas, se abraçam, se beijam. É muito gostoso ver os dois juntos. Dá para ver a felicidade nos olhos deles.

Na realidade, eles namoram e nós namoramos juntos. Os dois passeiam no shopping, mas minha mulher e eu ficamos uns dez passos atrás. No cinema, nos sentamos a duas ou três fileiras de distância deles. Acho que eles ainda não têm maturidade suficiente para andar sozinhos.

Logo depois de dar autorização ao Bruno, fiquei com a sensação de que o namoro naquele momento seria muito precoce. A Rebeca só tinha 15 anos. Mas logo em seguida concluí que aquilo poderia fazer bem para a minha filha e ajudar no desenvolvimento intelectual dela. A Rebeca se espelha muito em duas primas que já têm namorado. Entendi que ela, também namorando, sentiria que é tão normal quanto as primas.

O Estatuto da Pessoa com Deficiência é um avanço imenso. Só quem tem uma pessoa com deficiência na família sabe como são as barreiras que se enfrentam. Mas acho que a lei deveria ter sido criada muito tempo antes. Minha mulher e eu tivemos bastante dificuldade para encontrar uma escola que aceitasse a nossa filha. Não nos abriam as portas. Os diretores diziam que não tinham professores capacitados para alunos com síndrome de Down. E isso foi há bem pouco tempo, no começo dos anos 2000. Hoje, felizmente, a realidade é outra. Não fazia sentido que a lei não conferisse a mais completa proteção à pessoa com deficiência. Ela também precisa ter o direito de estudar, de se casar, de não ficar escondida dentro de casa, de não ser discriminada. Excetuando a deficiência, ela é exatamente como eu: sorri, chora, sente dor, sente saudade, tem sexualidade, deseja, sonha. Então por que os meus direitos eram uns e os dela eram outros? Não fazia sentido.”

Agência Senado (Reprodução autorizada mediante citação da Agência Senado)