Assistente da acusação aponta fraude contábil e vê crimes de responsabilidade de Dilma em 2015

Da Redação | 05/07/2016, 20h02

Em audiência na Comissão Especial do Impeachment nesta terça-feira (5), a economista Selene Péres Nunes afirmou que, em 2015, a presidente afastada Dilma Rousseff assinou decretos orçamentários incompatíveis com a meta fiscal e cometeu fraude contábil ao omitir dívidas do Tesouro com bancos públicos. Selene Nunes foi indicada pela acusação para elaborar laudo pericial auxiliar sobre documentos do processo contra Dilma.

A economista, que é especialista em Finanças Públicas, concordou com o laudo da perícia técnica feita por servidores do Senado e encomendada pela Comissão de Impeachment. Ela disse que, em sua análise, a presidente afastada incorreu em crimes de responsabilidade no ano passado. No caso dos decretos orçamentários, Selene Nunes afirmou que eles foram editados pelo Executivo sem preocupação com a situação das contas públicas no momento em que cada um entrou em efeito.

— Não havia espaço para a abertura de créditos suplementares porque havia uma situação de previsão de déficit, em que era preciso fazer novos contingenciamentos. Eles não foram realizados na magnitude necessária, e os próprios decretos tinham um efeito fiscal negativo.

Conforme a assistente pericial, a verificação da meta fiscal é um exercício constante ao longo do exercício financeiro, e cada ação que tenha algum efeito sobre o resultado primário das contas públicas só pode ser realizada a partir de projeções favoráveis.

— A meta é aferida bimestralmente, por exigência da Lei de Responsabilidade Fiscal, e, nesse momento, se confrontam as receitas arrecadadas com as previstas e as despesas executadas com as programadas. Em função dos dados do momento e da projeção para o final do exercício é que se verifica se há ou não condições de cumprir a meta e se é ou não compatível a abertura de créditos.

A economista disse que, a partir do terceiro bimestre de 2015, o governo federal passou a fazer projeções de impacto fiscal com base em projeto de lei que flexibilizava a meta, mas que só seria aprovado pelo Congresso no final do ano. Segundo Nunes, essa postura foi equivocada.

— Em cada momento [da análise de compatibilidade] vale a meta que estiver vigente, não a proposta, que não faz parte do mundo jurídico.

A assistente foi questionada por senadores se seria correto verificar o impacto fiscal dos decretos antes da sua execução efetiva, e se não seria mais adequado considerar que eles afetam a meta fiscal apenas ao final do ano. Ela refutou essa ideia.

— Ao levar ao cabo essa interpretação, então toda a lei orçamentária seria desnecessária, já que o próprio Orçamento não possui impacto imediato. Mas a lógica da Lei de Responsabilidade Fiscal começa com o planejamento, e o Orçamento é uma peça essencial desse processo.

Pedaladas

Em relação aos atrasos nos repasses do Tesouro para bancos públicos a título de equalização de juros do Plano Safra (as chamadas “pedaladas fiscais”) ao longo do ano de 2015, Selene Nunes concluiu que eles podem ser configurados como operações de crédito a partir de uma interpretação contábil da Lei de Responsabilidade Fiscal. Dispositivo da lei proíbe que essas operações sejam realizadas entre a União e os bancos que ela controla, e define quais procedimentos devem ser considerados como operações de crédito.

— A base [da análise] é o princípio da essência sobre a forma. Quando se elaborou a LRF, a opção legislativa foi escrever uma definição de operação de crédito bastante abrangente, justamente para evitar burlas. A parte final fala em 'outras operações assemelhadas', ou seja, qualquer coisa que se enquadre na essência.

A economista reconheceu que não há participação pessoal registrada da presidente nos atos apontados pela denúncia, mas disse entender que isso é “da natureza” do fato. Como a fraude é caracterizada por uma omissão na contabilidade, explicou, não se supõe a existência de uma assinatura.

— A operação em questão envolve um atraso de pagamentos, que eram devidos porque o capital pertencia à instituição financeira, não ao Tesouro. Nesse sentido, não há um contrato formal. É muito semelhante a um cheque especial: não assino contrato a cada vez que uso, mas há uma presunção de arcar com o pagamento, em virtude de eu ter utilizado um capital que não me pertence.

Interpelações

Selene Nunes é analista de Finanças e Controle da Secretaria do Tesouro Nacional. A senadora Gleisi Hoffmann (PT-PR) perguntou se, nessa condição, a economista não teria tomado conhecimento dos fatos denunciados, e, se tomou, porque não alertou nenhuma autoridade. Nunes disse que em 2015 estava licenciada do cargo.

Gleisi Hoffmann também inquiriu a assistente pericial sobre sua filiação partidária. A senadora afirmou que a advogada da acusação, Janaína Paschoal, foi remunerada do PSDB para elaborar o parecer que deu origem à denúncia contra Dilma Rousseff, e perguntou se Nunes também recebeu dinheiro para produzir o seu laudo. A perita afirmou que não possui filiação partidária e que fez o trabalho gratuitamente, por “dever cívico”. O senador Ricardo Ferraço (PSDB-PB) reclamou da pergunta e classificou-a uma “agressão”.

A senadora Vanessa Grazziotin (PCdoB-AM) manifestou desagrado com o fato de o laudo pericial ter classificado as pedaladas como um “acobertamento”. Vanessa Grazziotin acusou a assistente de “leviana”, o que gerou críticas de outros senadores da Comissão de Impeachment. O presidente da Comissão, Raimundo Lira (PMDB-PB) determinou que a palavra fosse retirada dos autos, e a Vanessa Grazziotin retificou a declaração para dizer que a forma como os fatos estavam descritos na perícia é "inadequada".

Agência Senado (Reprodução autorizada mediante citação da Agência Senado)