Senado inaugura exposição permanente de obra de Vik Muniz sobre o 8 de janeiro

Rodrigo Baptista | 07/02/2024, 17h29

Cerca de um ano e um mês depois do ataque ao Congresso Nacional, o Senado passa a contar com “uma espécie de cicatriz”, uma obra para marcar a reconstrução da Casa após a tentativa de golpe contra a democracia brasileira. O artista plástico Vik Muniz entregou nesta quarta-feira (7) um painel fotográfico que registra uma imagem do Palácio do Congresso Nacional criada a partir de vidro despedaçado, cartuchos de balas e restos de carpete azul coletados após a invasão ao Senado em 2023.

Batizada de 8 de janeiro de 2023, a obra ficará em exposição permanente no Salão Azul, afixada em local próximo à entrada do Plenário da Casa.  O evento de entrega do painel, aposição do quadro e descerramento de placa contou com a presença do presidente do Senado Federal e do Congresso Nacional Rodrigo Pacheco; das senadoras Zenaide Maia (PSD-RN) e Jussara Lima (PSD-PI); dos senadores Randolfe Rodrigues (sem partido-AP) e Renan Calheiros (MDB-AL);  da diretora-geral, Ilana Trombka, além de Vik Muniz, que doou a obra à Casa. 

Pacheco afirmou que o 8 de janeiro já foi superado, mas é importante lembrar para jamais esquecer do ocorrido e assim evitar novos ataques contra a democracia.

— Que as pessoas que aqui estejam sejam bem-vindas e pisem neste tapete para exercer democracia.  Um dos fatos que coroa os 200 anos do Senado e reafirma a democracia é esse enorme ato de generosidade, de respeito e de consideração de um artista consagrado para com o Congresso Nacional, o Senado Federal e a democracia, fazendo dos cacos e dos resquícios e dos resíduos de atos antidemocráticos uma belíssima obra de arte que estará aqui neste prédio eternizada como um símbolo de resistência democrática — acrescentou o presidente do Senado.

Pacheco agradeceu à iniciativa da diretora-geral, Ilana Trombka, que firmou a parceria com Vik Muniz, e lembrou da rápida recuperação estrutural da Casa após os ataques. Vik ressaltou que a arquitetura modernista nem sempre deixa “marcas" pelo tipo de material utilizado nas construções e pela facilidade de reforma. A ideia, portanto, foi deixar uma “cicatriz” como uma memória do triste episódio recente:

— Um prédio com arquitetura moderna não remete muito a essas cicatrizes, a esses amassadinhos. Geralmente têm superfícies lisas. Fiquei imaginando como colocar um lembrete da história aqui na sede do Senado. A arte pode ser uma ferramenta poderosa para continuar a discussão sobre a fragilidade que ronda todas as democracias. A gente esquece disso — falou.

Sobre a obra, o artista apontou que a proposta era passar a ideia de reconstrução do Palácio do Congresso Nacional.

— Quando eu tive contato com este material, eu não senti que deveria fazer um comentário sobre destruição. Acho que era necessário nesse momento trazer a ideia de reconstrução; era colocar tudo na ordem que estava antes. É uma imagem que vocês estão acostumados a ver feita com os restos de um momento deveras desagradável de um dia fatídico que deixou uma memória muito difícil — apontou. 

Processo

Os pedaços de cacos de vidro, carpete, cartuchos de balas e outros itens coletados após a invasão serviram de matéria-prima para o artista confeccionar a peça de aproximadamente 55 metros quadrados, uma espécie de mosaico que retrata o Palácio do Congresso Nacional cercado por nuvens. Após a montagem, o artista registrou a imagem. É essa peça fotográfica, em escala menor (cerca de 2,80x1,80 m), que ficará a partir de agora exposta no Senado e poderá ser vista por senadores, jornalistas e todos aqueles que visitarem a Casa. A obra de Vik é a única de um artista vivo no roteiro de visitações do Congresso.

Recolhido pela equipe de limpeza e organizado pelo setor de patrimônio do Senado, o material foi transportado de Brasília ao Rio de Janeiro, onde fica o ateliê do artista, por um caminhão e chegou à capital fluminense no dia 4 de maio de 2023. Cerca de 4 toneladas de destroços foram disponibilizados pelo Senado para Vik e sua equipe. 

Antes da solenidade, Vik Muniz comentou o processo de feitura da obra e suas impressões sobre o Palácio do Congresso. Em sua segunda visita a Brasília (e primeira ao Senado), o artista circulou pelos salões Verde (Câmara) e Azul (Senado), visitou o Museu do Senado, subiu a rampa do Congresso e pode ver de perto as cúpulas das duas Casas. Para Vik, o Palácio do Congresso é o principal símbolo da democracia no país. 

—  O símbolo da coisa toda é este lugar. Este lugar é um espaço dialético, de discussão, espaço onde esse projeto de democracia, de nação, pode se desenvolver, pode continuar a se fortalecer — disse o artista do alto do Congresso Nacional.

Documentário e Livro

Durante a solenidade, foi apresentado o teaser (prévia) do documentário Arte no Caos, produzido pela TV Senado, que apresenta todo o processo de elaboração da obra, no Rio de Janeiro. Um livro sobre o tema também está em fase de produção pela equipe da Agência Senado

A produção da peça faz parte das comemorações do Bicentenário do Senado.

Vik Muniz

Um dos artistas plásticos brasileiros mais renomados da atualidade, Vik Muniz é conhecido pelo uso de materiais inusitados, como chocolate, geleia e sucata. 

Entre suas obras mais célebres está a série The Sugar Children (1996), na qual o artista retrata, em açúcar, crianças caribenhas. Ele também estrelou Lixo Extraordinário, que foi indicado ao Oscar de melhor documentário e ganhou o prêmio de melhor filme do público no Festival de Sundance, nos Estados Unidos, e tem obras espalhadas por museus em diversos países.

Agência Senado (Reprodução autorizada mediante citação da Agência Senado)