Senadores lembram vítimas do Holocausto e condenam discurso de ódio

Rodrigo Baptista | 10/02/2022, 12h35

Em uma semana em que as redes sociais foram sacudidas pela declaração de um influenciador digital em defesa da criação do partido nazista, em nome da "liberdade de expressão", o Senado fez uma sessão especial para homenagear e relembrar as vítimas do Holocausto. A sessão desta quinta-feira (10) serviu também para marcar a cerimônia do Yom HaShoá, ou Dia da Lembrança do Holocausto. 

A data remete a 27 de janeiro de 1945, dia em que o exército soviético libertou judeus do campo de concentração de Auschwitz, maior símbolo das atrocidades cometidas pelos nazistas durante a 2ª Guerra Mundial. Durante a sessão, senadores e representantes da comunidade judaica e da Unesco repudiaram as falas do influenciador e apresentador de podcast Monark e manifestações de outros que tentam diminuir os horrores do regime que perseguiu e assassinou milhões de judeus — além de ciganos, pessoas com deficiência, homossexuais e testemunhas de Jeová. O recado foi claro: "tolerância zero" com racismo e com discursos de ódio. 

De origem judaica, Jaques Wagner (PT-BA) afirmou que lembrar as atrocidades cometidas pelos nazistas é fundamental para evitar o crescimento de pensamentos racistas na sociedade. Para o senador, não há que se tolerar os intolerantes. 

— Nesta semana, com muita preocupação, acompanhamos declarações de pessoas ditas influenciadoras defendendo abertamente a criação de um partido nazista (para a minha tristeza, incluo também a presença nessa lista de um deputado federal do Parlamento brasileiro) e uma rádio demitindo comentarista depois de gesto similar ao da saudação nazista. Essa ideologia autoritária, segregadora e intolerante é inaceitável, além de criminosa. Nós não podemos tolerar a intolerância, porque ela é a semente da erva daninha que produziu esse maior crime humanitário da história da humanidade — disse Wagner.

Tolerância zero

Embaixador de Israel no Brasil, Daniel Zohar Zonshine avaliou que o discurso de Monark é um sinal de que, mesmo após 77 anos do Holocausto, muitos não assimilaram o perigo da conexão entre ideias racistas e ações violentas. Ele defendeu tolerância zero com discursos de ódio. 

— O Holocausto e o extermínio de 6 milhões de judeus não aconteceram do nada; foram baseados em ideologias nazistas e no discurso de ódio de mentes perturbadas. A lição que podemos e devemos tirar disso é ter zero tolerância a esse tipo de situação: zero tolerância ao racismo, zero tolerância ao discurso de ódio, zero tolerância ao antissemitismo. O exemplo que tivemos esta semana no Flow Podcast [canal de entrevistas de Monark na internet] pode parecer bobagem, mas atesta que a mensagem não foi bastante assimilada pelas pessoas e pela sociedade — afirmou Zonshine.

Para Marlova Jovchelovitch Noleto, representante da Unesco no Brasil, episódios como o do Flow Podcast não podem ser banalizados e exigem atuação das autoridades e da sociedade.

— Nós assistimos chocados e perplexos a esse Flow Podcast, incitando não apenas a ideia de um partido nazista, mas também a possibilidade de se ser antijudeu. De que maneira esses influenciadores se sentem à vontade e com liberdade para propor isso? Como é possível ser antijudeu? Como é possível ser antinegro, anti-índio, anti seja lá o que for, se nós temos como premissa da vida em sociedade o exercício da humanidade e do respeito aos direitos humanos? É muito importante que situações como essas não sejam banalizadas e tampouco minimizadas, porque minimizando situações desse tipo é que situações assim progridem, ganham escala e se tornam verdade para muitos — alertou. 

Marlova Noleto apontou que a Unesco tem defendido a importância de trabalhar o tema do Holocausto nas escolas para evitar o fomento de negacionismos históricos. Ela relatou que a instituição fez um levantamento junto ao TikTok, rede social popular entre o público jovem, e identificou que 17% do conteúdo publicado relacionado ao tema nega ou distorce a existência do Holocausto. Segundo ela, a empresa responsável pela rede social e a Unesco se uniram para enfrentar o problema. 

Presidente da Confederação Israelita do Brasil (Conib), Claudio Lottenberg reforçou que liberdade de expressão tem limites quando vivemos em coletividade.

— Temos um marco constitucional que é abundante, robusto, em todo o seu conteúdo, e lá está prevista, sim, a liberdade de expressão, mas ela não pode afrontar outras liberdades e as garantias individuais — argumentou.

Repúdio

Os senadores Lasier Martins (Podemos-RS), Flávio Arns (Rede-PR) e Leila Barros (Cidadania-DF) também repudiaram a defesa da criação de um partido nazista.

Lasier recordou que foi às lágrimas ao visitar, em Jerusalém, o Memorial do Holocausto, símbolo da memória aos judeus assassinados durante a 2ª Guerra Mundial. Arns afirmou que é preciso se rebelar contra aqueles que não respeitam a diversidade e pediu atenção nas eleições de 2022, para que o eleitor não vote em candidatos com discurso de ódio. Leila Barros, por sua vez, defendeu a aprovação de projetos como o que criminaliza a negação do Holocausto (PL 1.044/2020); o que proíbe a veiculação de anúncios publicitários em sites que divulgam fake news e discurso de ódio (PL 2.922/2020) e o que eleva as penas previstas na Lei Antirracismo (PL 3.054/2020). 

— Defender a criação de um partido nazista, meus amigos, é infringir a Constituição brasileira e ofender principalmente toda a comunidade judaica. A liberdade de expressão não pode servir como anteparo para a propagação de discursos de ódio.  É importante deliberar sobre medidas que possam impedir que grupos de pessoas continuem tentando ressuscitar discursos nazistas e disseminar o ódio contra os negros, os imigrantes, os judeus e os homossexuais — disse a senadora.

Agência Senado (Reprodução autorizada mediante citação da Agência Senado)