CPI: Witzel diz que perseguição política começou com investigação de Marielle
Da Agência Senado | 16/06/2021, 17h05
O ex-governador do Rio de Janeiro Wilson Witzel afirmou, nesta quarta-feira (16), na CPI da Pandemia, que seu processo de impeachment foi resultado de uma perseguição política desencadeada após ele determinar a investigação da morte da vereadora Marielle Franco. Além de criticar o presidente Jair Bolsonaro, ele levantou suspeitas sobre a parcialidade de membros do Superior Tribunal de Justiça (STJ) e do Ministério Público Federal (MPF) no processo que levou à cassação de seu mandato. Em protesto contra essas acusações, o senador Flávio Bolsonaro (Patriota-RJ) disse que elas são muito graves e precisam ser apuradas. E o senador Jorginho Mello (PL-SC), ao questionar o ex-governador, lembrou das suspeitas de corrupção contra o ex-governador.
Witzel também declarou que a corrupção na área da saúde do estado do Rio de Janeiro continuou após seu impeachment. Ele disse que promoveu uma auditoria em 2019 nas organizações sociais de saúde para coibir desvios, o que teria incomodado o que chamou de “máfia da saúde”.
O ex-governador citou uma série de organizações sociais (OSs) que seriam utilizadas para atos ilícitos e continuariam operando no estado, e que entraram no lugar da Unir (OS que está no centro das investigações contra Witzel). Entre elas estão a Associação Filantrópica Nova Esperança, o Instituto Mahatma Gandhi, o Instituto Lagos e a Viva Rio. Essas organizações operam unidades de saúde (Unidades de Pronto Atendimento - UPAs) e hospitais no estado.
— Eu vou encaminhar aqui o nome dessas OSs, e esta CPI pode e deve fazer a quebra de sigilo delas, porque ali nós vamos encontrar para onde está indo o dinheiro.
Caso Marielle
Ao alegar que é vítima de perseguição política, Witzel afirmou que isso foi consequência das investigações sobre o assassinato de Marielle Franco, então vereadora da cidade do Rio de Janeiro, ocorrido em março de 2018.
— Tudo isso começou porque eu mandei investigar, sem parcialidade, o caso Marielle. Quando foram presos os dois executores da Marielle, o meu calvário e a perseguição contra mim foram inexoráveis.
Witzel disse que foi acusado de forma leviana de interferir na polícia do Rio de Janeiro para que a investigação do caso Marielle fosse adiante, e que passou a receber retaliações do governo federal.
— Ver um presidente da República, numa live lá em Dubai, acordar na madrugada para me atacar, para dizer que eu estava manipulando a polícia do meu estado, ou seja, quantos crimes de responsabilidade esse homem vai ter que cometer até que alguém o pare? — criticou.
A partir de então, Witzel relata ter ficado em uma situação de vulnerabilidade, e que não era recebido mais no Palácio do Planalto nem por ministros.
— Depois desse evento, eu não fui recebido mais no Palácio do Planalto e nós tínhamos dificuldade de poder falar com os ministros para sermos atendidos. Eu encontrei o ministro [Paulo] Guedes no avião e fui falar com ele. Ele virou a cara e saiu correndo: "Não posso falar com você". Então, esse não é o comportamento republicano — disse Witzel ao responder questionamento feito pelo relator da CPI, senador Renan Calheiros (MDB-AL).
O ex-governador também relatou um encontro que teria ocorrido no ano passado com Sergio Moro, então ministro da Justiça. Moro teria repassado um recado de Jair Bolsonaro para que Witzel parasse de dizer que queria ser presidente da República, sob pena de ser retaliado pelo governo federal.
— Esse tipo de coisa, lamentavelmente, de menino de recado, não é um papel que se espera de um magistrado.
Essa conversa ocorreu, segundo Witzel, a partir da sua solicitação para que o Ministério da Justiça não pedisse de volta cinco delegados da Polícia Federal que estavam cedidos ao governo do Rio de Janeiro. Witzel disse que foi convidado por Moro para conversar, e que achou “estranho” que o então ministro da Justiça não quisesse tirar foto com ele durante o encontro.
Segundo o ex-governador, isso ocorreu justamente depois da prisão dos acusados de assassinar Marielle Franco. Ele lembrou que o porteiro do Condomínio Vivendas da Barra, onde o presidente da República tem residência, depôs à Polícia Civil do Rio durante a investigação, e nesse depoimento afirmou que, no dia do crime, um dos acusados pelos assassinatos, o ex-PM Élcio Queiroz, teria informado que iria na Casa 58, do “Seu Jair”. Posteriormente, o porteiro mudou o depoimento.
— O porteiro, uma pessoa simples, prestou depoimento à Polícia Civil. Logo depois, o ministro Moro, de forma criminosa, lamentavelmente, requisita um inquérito para investigar crime de segurança nacional, porque o porteiro depõe, prestou um depoimento para dizer que o executor da Marielle teria chegado no condomínio [Vivendas da Barra] e mencionado o nome do presidente. Se isso é verdade ou não, não é problema meu, não tenho nada com isso, eu não sou juiz e nem delegado do caso — disse.
Segundo Witzel, esse seria um dos exemplos de intervenção indevida do governo federal no estado do Rio de Janeiro. Alguns detalhes da investigação não foram revelados pelo ex-governador durante seu depoimento — ele pediu para falar sobre isso em uma reunião reservada, somente com a presença dos integrantes da CPI.
Em vários momentos, Witzel afirmou que é vítima de uma perseguição e que há uma politização do Ministério Público. Ele classificou seu julgamento como um tribunal de exceção e criticou as delações premiadas, que batizou de “pau de arara moderno” (em referência a um sistema de tortura utilizado durante a ditadura militar para obter confissões de presos políticos). Também comparou a sua situação à do ex-presidente Lula.
— Eu tenho aqui todas as delações que foram feitas pelo senhor Edmar Santos, pelo senhor Edson Torres. A delação hoje é o pau de arara moderno. O sujeito é preso, aí ele vai e remonta uma história com fatos da imprensa, como fizeram outros delatores. E nós estamos vendo agora, em relação ao que aconteceu com o presidente Lula, a anulação de um processo em que o juiz está sendo reconhecidamente — lamentavelmente, porque foi meu colega — parcial.
Ainda segundo Witzel, a pandemia é a “pedra de toque” de uma série de atos de perseguição política, não apenas em relação a ele, mas a vários governadores.
— Por trás do meu impeachment estão aqueles que se aliaram a esse discurso de perseguição aos governadores — declarou.
Máfia da saúde
Logo ao chegar ao Senado, Witzel já demonstrava que não pouparia o governo federal durante seu depoimento à CPI. Em declaração à imprensa, ele afirmou ser vítima de perseguição. Réu em processo que apura corrupção, lavagem de dinheiro e superfaturamento em compras de equipamentos para o combate à covid-19, Witzel foi denunciado em consequência das investigações da Operação Lava Jato no Rio de Janeiro. A suspeita é de que o ex-governador tenha recebido, por intermédio do escritório de advocacia da esposa, pelo menos R$ 554,2 mil em propina. Em setembro do ano passado, Witzel sofreu impeachment por crime de responsabilidade na gestão de contratos na área da saúde durante a pandemia.
Witzel diz que seu mandato foi cassado porque combateu a corrupção. Também afirmou que corre risco de vida. Segundo ele, não foi encontrado “um centavo” relacionado a desvios da saúde em sua conta, e que, se ainda estivesse no cargo, investigaria as denúncias. E declarou que a máfia da saúde segue em operação no estado.
— Eu corro risco de vida. Eu tenho certeza disso, porque a máfia da saúde no Rio de Janeiro [está envolvida] e tenho certeza que tem miliciano envolvido atrás disso. Eu e a minha família corremos risco de vida.
Em resposta à senadora Eliziane Gama (Cidadania-MA), Witzel chegou a sugerir que a CPI quebre sigilos do ex-ministro Mandetta e do empresário Roberto Bertholdo para apurar se houve interferência para contratação do Instituto de Atenção Básica e Avançada à Saúde (Iabas) na construção de hospitais de campanha. Ele também defendeu a quebra de sigilos do atual governador do estado, Cláudio Castro. Segundo Witzel, o então vice-governador estava em Brasília na véspera de uma ação de busca e apreensão contra ele (Witzel).
— Não mandei o vice-governador vir para cá [Brasília]. Ele estava em Brasilia. Não me disse o que estava fazendo em Brasília. Eu acho que isso merece uma quebra de sigilo.
STJ
Witzel também levantou suspeita sobre a parcialidade de membros do Superior Tribunal de Justiça (STJ) e do Ministério Público Federal (MPF) no processo que levou à cassação de seu mandato.
O senador Flávio Bolsonaro (Patriota-RJ) interrompeu o depoimento de Witzel e classificou a fala do depoente como “muito grave”.
— Pelo que eu me lembre, ele foi afastado por decisão do ministro Benedito Gonçalves, do STJ, e em seguida o afastamento dele foi prorrogado pela Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça. Então, o que o depoente está dizendo aqui agora é que há um conluio de ministros do STJ para persegui-lo. E isso é muito grave. Isso é muito grave. Tinha que haver alguma comunicação da CPI com o Superior Tribunal de Justiça para que se apurasse o que está sendo trazido por ele.
O senador Jorginho Mello (PL-SC) perguntou sobre a então primeira-dama do estado ter recebido pouco mais de meio milhão de reais em propina. Witzel disse que o valor não é propina, mas resultado de honorários advocatícios, que estaria declarado. Mas Jorginho Mello rebateu:
— O senhor acha todo mundo é contra o senhor, então? É só o senhor que está certo? — questionou.
Wtizel voltou a citar o ex-presidente Lula, que ficou preso por 580 dias até que o Supremo Tribunal Federal declarou inconstitucional a decisão que levou Lula à prisão.
— Olha, quanto tempo demorou para dizer que o presidente Lula estava certo? Que ele estava sendo julgado por um juiz parcial? Demorou, né? Uma hora nós vamos chegar lá — disse.
Agência Senado (Reprodução autorizada mediante citação da Agência Senado)
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