Sob a bandeira da cooperação, China vai à África para garantir recursos naturais, dizem analistas

Da Redação | 30/05/2011, 22h03

Em busca de minérios, água e terra agricultável, os chineses estão desembarcando em vários países africanos com as bandeiras da cooperação e do desenvolvimento. Essa movimentação política e econômica do país que tem a segunda maior economia do planeta foi identificada e discutida pelos convidados do painel "A influência da China e da Al-Qaeda na África", promovido nesta segunda-feira (30) pela Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional (CRE), dentro do ciclo de debates sobre os rumos da política externa brasileira.

O professor Henrique Altemani de Oliveira, da Pontifícia Universidade Católica (PUC) de São Paulo, observou que a China legitima a sua presença na África apresentando-se como um "parceiro para o desenvolvimento". Para isso, ressaltou o professor, não estabelece condicionalidades, respeita a soberania dos países africanos e ressalta o princípio da não-intervenção em assuntos internos de outras nações.

- A China tem uma percepção mundial alternativa, de respeito aos diferentes sistemas políticos. É um ator interessante para o continente africano, pois sua presença não é ideológica e baseia-se em defesa de soberania e direito ao desenvolvimento, sem condicionalidades. É como se dissesse: 'Não vim cobrar democracia ou direitos humanos' - disse Altemani em sua exposição aos senadores.

Crescimento

Entre os dez países que mais cresceram no mundo na última década, mencionou o professor Antônio Jorge Ramalho da Rocha, que presta assessoria à Secretaria de Assuntos Estratégicos da Presidência da República, seis são africanos. Naquele continente, prosseguiu, encontra-se o segundo maior manancial de água doce do planeta, além de grandes extensões de terras aráveis.

Os chineses, segundo o professor, estão comprando ou alugando terras e construindo a infraestrutura de acesso a essas áreas. Mas seus investimentos começam a "gerar ruído" em alguns países africanos, uma vez que nas obras que patrocinam 70% dos trabalhadores são chineses e apenas 30% locais. Os chineses, prosseguiu, trabalham mais de oito horas por dia, sete dias por semana.

- O que se observa na África é a ocupação de pedaços de território por empresas e trabalhadores chineses, em busca de recursos minerais, terra agricultável e água - observou Ramalho.

Fronteira

A China conquistou a simpatia das elites africanas porque se apresenta como país em desenvolvimento, comentou o professor Severino Bezerra Cabral Filho, do Instituto Brasileiro de Estudos da China, Ásia e Pacífico (Ibecap). Os chineses atuam de forma diferente das antigas potências coloniais, prosseguiu o professor, e "jogam dinheiro" na África sem impor condições. Ao chamar atenção para a necessidade de acompanhamento dos movimentos dos chineses naquele continente, ele lembrou que África é a "fronteira leste" do Brasil, essencial ao futuro do país.

Ao traçar um histórico das relações entre a China e a África, o professor Antonio Barbosa, consultor do Senado Federal, citou o encontro de países não alinhados, realizado em 1955 em Bandung, na Indonésia, como importante momento de aproximação. Ao questionar se a China estaria exercendo um novo tipo de imperialismo no continente africano, ele traçou uma comparação histórica com os europeus.

- Em 1855, na Conferência de Berlim, os países ocidentais dividiram a África. Em 2006, em Beijing, foi realizado um foro de cooperação África-China, com a presença de líderes de 48 países. A China estabeleceu um modelo de relação sem condicionalidade, sem bases militares no exterior e sem a idéia de ajuda, mas de investimento, em busca de matérias primas para alimentar o seu desenvolvimento.

Terrorismo

O professor Jorge Lasmar, da PUC de Minas Gerais, foi o único a comentar unicamente a presença da rede terrorista Al-Qaeda na África. Essa presença, disse ele, tem sido pouco debatida, mas teria grande importância para o Brasil, por causa dos interesses de empresas brasileiras no continente africano. Ele observou que o leste africano se tornou prioridade para as ações da Al-Qaeda desde a década de 90. O próprio Osama Bin Laden, recordou, morou no Sudão.

- Os agentes mais ativos da Al-Qaeda estão na África, especialmente em países onde não há muito controle sobre a lavagem de dinheiro e onde existe alto grau de informalidade das economias - afirmou.

O presidente da comissão, senador Fernando Collor (PTB-AL), observou que a presença da China na África ocorre pela busca de recursos naturais.

- Ela percebe que somente se afirmará como grande potência mundial quando estabelecer parcerias estratégicas, e elegeu a África como parceira - disse.

Para o senador Cristovam Buarque (PDT-DF), os Estados Unidos e a Europa estariam experimentando um momento de "fragilidade moral", por falta do que chamou de um "projeto alternativo para a civilização". E questionou se um país poderá exercer hegemonia sobre o resto do mundo "sem força moral".

Agência Senado (Reprodução autorizada mediante citação da Agência Senado)

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