Representantes de órgãos de direitos humanos denunciam falência do sistema prisional brasileiro

Da Redação | 18/12/2007, 13h54

Representantes de vários órgãos ligados aos direitos humanos denunciaram nesta terça-feira (18), na Comissão de Direitos Humanos e Legislação Participativa (CDH), a falência do sistema prisional brasileiro nos moldes em que se encontra atualmente. Eles participaram de uma audiência pública realizada com o objetivo de discutir irregularidades cometidas em prisões brasileiras, especialmente a permanência, na mesma cela, de adolescentes, mulheres e homens.

Esse foi o segundo encontro para discutir o tema, motivado por recente episódio ocorrido no Pará e denunciado por toda a imprensa brasileira, quando uma menor de idade ficou por vários dias presa numa cela com cerca de 30 homens, sofrendo todo tipo de abuso e situação humilhante.

Ao iniciar a audiência, o diretor do Departamento Penitenciário Nacional, Maurício Kuehne, afirmou que é "lamentável" a situação carcerária diagnosticada, hoje, no Brasil, onde as celas chegam a ser "verdadeiros depósitos de seres humanos". Representante do ministro da Justiça, Tarso Genro, ele destacou que, em termos de legislação para o setor, o Brasil é privilegiado, principalmente em regras voltadas para o tratamento de presos.

- O problema é que a questão prisional no Brasil lamentavelmente sempre ficou relegada ao esquecimento, com a sujeira sendo varrida para debaixo do tapete para que a sociedade não visualizasse a imensa tragédia humana que existe no país - afirmou Maurício Kuehne, para quem os responsáveis pela prisão não podem ser também responsáveis pela manutenção dos presos nas cadeias.

- A mão que prende não pode ser a mão que cuida. Hoje, mais do que nunca, está provado que temos que partir para esse aspecto - enfatizou.

Discriminação

A diretora de Programa da Subsecretaria de Articulação Institucional, subordinada à Secretaria Especial de Políticas para as Mulheres, Maria Elizabete Pereira, relatou, na audiência, vários tipos de discriminação por que passam as quase 26 mil mulheres encarceradas, atualmente, no Brasil.

- Se o governo federal não consegue dar uma resposta a essas mais de vinte e cinco mil mulheres, o que dizer então para o sistema prisional como um todo? - destacou Elizabete Pereira, referindo-se aos últimos dados divulgados pelo Ministério da Justiça, relativos a junho de 2007, que revelaram um total de 419.551 mil pessoas privadas de liberdade no Brasil, entre homens, mulheres e adolescentes.

Ao destacar as atividades do grupo de trabalho interministerial recém-criado com a finalidade de propor uma reformulação no sistema prisional feminino, Elizabete fez um apelo ao Senado, para que auxilie na celebração de uma parceria entre governo federal e estados.

- Se os estados não quiserem fazer essa pactuação e não quiserem entrar nessa parceria para rever a situação, o governo federal vai ficar de mãos atadas - observou.

Já o presidente do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB),Cezar Britto, relatou que, apesar de os presídios brasileiros estarem superlotados, ainda há, em todo o país, um deficit de mais de 170 mil vagas. Ele defendeu a criação de defensorias públicas em todas as cidades brasileiras, para que o "direito à assistência seja cumprido", e criticou algumas soluções que estão sendo debatidas em âmbito nacional para resolver o problema da criminalidade, como a redução da maioridade penal de 18 para 16 anos e os julgamentos de presos via teleconferência.

-Com a teleconferência, estamos impedindo que o preso converse diretamente com o juiz, olhe nos olhos dele e tenha a coragem de denunciar irregularidades como os maus-tratos - explicou o representante da OAB.

Ao concluir sua exposição, Cezar Britto destacou ainda que a OAB está disposta a ajudar a restabelecer a dignidade no sistema carcerário brasileiro, mas desde que o preso seja visto como um ser humano e não como um cliente, e que o sistema prisional, em vez de ser encarado como um castigo e uma forma de isolamento, seja visto como um modo de ressocializar o preso.

Socioeducação

Por último, falou a presidente do Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente (Conanda) - órgão subordinado à Secretaria dos Direitos Humanos da Presidência da República. Carmem Silveira de Oliveira defendeu a instituição de um sistema socioeducativo regionalizado como forma de recuperação dos presos. Essa regionalização, no entender dela, tem de ser geral, incluindo o funcionamento, em municípios, de delegacias e Varas da Infância e da Juventude, entre outros serviços necessários que possam ficar à disposição dos presos.

- É possível que casos como esse, ocorrido no Pará, possam ser evitados ao passarem por um controle do gestor, por meio do sistema socioeducativo - esclareceu.

Carmem Oliveira lembrou ainda que o governo federal, ao criar o Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo (Sinase), subordinado ao Conanda, está aumentando sensivelmente os recursos destinados a recuperar os presos brasileiros. Mas, para que o Sinase dê certo, alertou ela, é preciso um pacto federativo e ainda que o Congresso Nacional aprove projeto de lei, já em tramitação, que faz com que a adoção do sistema seja obrigatório em todo o país.

- Só com o compromisso necessário vamos resolver esse problema - avisou.

Agência Senado (Reprodução autorizada mediante citação da Agência Senado)

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