Chanceler: proposta na ONU foi “vitória diplomática” e prioridade é retirar brasileiros

Da Agência Senado | 18/10/2023, 18h08

A Comissão de Relações Exteriores (CRE) recebeu nesta quarta-feira (18) o ministro Mauro Vieira, do Itamaraty, para uma audiência sobre a atuação do Brasil no conflito entre Israel e a organização extremista palestina Hamas. O chanceler afirmou que o país conquistou uma “vitória diplomática” ao liderar uma proposta de cessar-fogo no Conselho de Segurança das Nações Unidas (CSNU), apesar de ela não ter sido aprovada. Também disse que a prioridade do governo neste momento é a retirada dos brasileiros que estão na zona de conflito.

O Brasil está na presidência do CSNU e conduziu a elaboração de uma proposta de resolução que pedia cessação das hostilidades, segurança para crianças e idosos, liberação de estrangeiros e permissão para a entrada de recursos assistenciais para a população local. Doze dos 15 membros do Conselho apoiaram a proposta, incluindo China e França, que são membros permanentes. Os Estados Unidos votaram contra e, como também são um membro permanente, a rejeição representa veto à proposta.

Mauro Vieira explicou que alcançar um número de votos suficientes para a aprovação de uma resolução no CSNU é raro, e, por isso, o esforço do Brasil deve ser visto como bem-sucedido. O motivo do veto americano foi a ausência, no texto da proposta, de uma menção ao direito de Israel à autodefesa.

— Não temos uma resolução aprovada [no CSNU] desde 2016, e na maioria das vezes não há número suficiente [de votos]. Só se produz o veto se há condições de [a proposta] ser aprovada. Foi um caso único. Foi uma vitória diplomática brasileira ter conseguido reunir 12 países que uniram forças com o Brasil. É uma grande conquista.

O chanceler observou também que uma nova tentativa de resolução pode ser feita, mas será preciso esperar “novas circunstâncias”. A presidência do Brasil tem duração de apenas um mês e se encerra no final de outubro.

Brasileiros

Vieira explicou que a operação para retirada dos brasileiros que desejam sair de Israel está “em estágio avançado”. A expectativa do Itamaraty é retirar cerca de 1500 pessoas do país na primeira fase, dedicada a turistas, e depois atender os que moram no país. São cerca de 14 mil brasileiros residentes em Israel e outros 6 mil na Palestina, a maioria na Cisjordânia.

— O Brasil foi o primeiro país a iniciar uma operação de repatriação de nacionais, com altíssima eficiência. Temos cidadãos em necessidade de assistência dos dois lados do conflito. É nosso dever e prioridade atender a ambos o mais rapidamente possível. A determinação do presidente da República é não deixar nenhum brasileiro para trás. Quero agradecer ao apoio de muitos parlamentares que entraram em contato e nos ajudaram a identificar pessoas que precisam de ajuda, tanto em Israel quanto na Palestina.

A situação dos brasileiros em Gaza é “mais complexa”, segundo o ministro, o território está sob bloqueio israelense e o único ponto de saída, na fronteira com o Egito, está fechado. São 32 pessoas que manifestaram a vontade de retornarem ao Brasil, incluindo 13 crianças. Vieira explicou que o Itamaraty está em contato com “todas as partes” para negociar a passagem dos brasileiros.

Questionamentos

Senadores de oposição questionaram o chanceler pela postura que consideraram insuficiente da diplomacia brasileira contra o Hamas. Apesar de elogiarem o esforço de repatriação dos brasileiros, os parlamentares disseram desaprovar o fato de o Brasil não ter classificado o Hamas como um grupo terrorista.

Para o senador Carlos Viana (Podemos-MG), o Brasil “precisa repensar a sua política externa”.

— No momento em que o Brasil propõe um acordo sem observar os crimes que foram cometidos em Israel, estamos dando apoio político e diplomático a terroristas. Condenar os ataques não é suficiente. A proposta apresentada não inclui apoio a desarmar o Hamas. Não se refere ao direito de Israel se defender. O Brasil não pode tergiversar sobre isso.

O senador Sergio Moro (União-PR) também se disse insatisfeito, destacando que cidadãos brasileiros estão entre os mortos nos ataques promovidos pelo Hamas.

— Eu exigiria uma posição mais dura da diplomacia brasileira sobre esses fatos. As notas do Itamaraty estão abaixo do tom necessário. Falam em falecimento [dos brasileiros], mas não nomeiam os responsáveis.

Mauro Vieira explicou que o Brasil segue a posição da Organização das Nações Unidas, que não classifica o Hamas como um grupo terrorista. O chanceler também argumentou que adotar uma postura mais dura poderia dificultar as negociações tanto para repatriar brasileiros quanto no âmbito do Conselho de Segurança. Também disse que a prática diplomática brasileira é de “diálogo”, sem assumir “posições políticas”.

O presidente da CRE, senador Renan Calheiros (MDB-AL), fez eco a essa posição.

— A tradição da diplomacia brasileira sempre foi de buscar paz em qualquer conflito, em qualquer parte do planeta, quaisquer que sejam os atores internacionais envolvidos. O Brasil vem mantendo a reputação de nação equidistante de litígios, com autoridade para propor soluções viáveis e confiáveis no rumo da pacificação.

A senadora Mara Gabrilli (PSD-SP) quis saber se o Brasil vai criar vistos humanitários para refugiados do conflito, assim como já fez em benefício de refugiados afegãos, sírios e ucranianos. Vieira respondeu que essa iniciativa depende da “capacidade de atenção” dos postos diplomáticos brasileiros e de ação conjunta com o Ministério da Justiça.

Amorim

Ao final da reunião com Mauro Vieira, a CRE aprovou requerimento (REQ 32/2023) convidando o ex-chanceler Celso Amorim, hoje assessor especial da Presidência da República, para participação uma audiência na comissão. Moro afirmou que Amorim também é "personagem relevante" na diplomacia brasileira e merece ser ouvido sobre a situação em Israel.

Agência Senado (Reprodução autorizada mediante citação da Agência Senado)