Ajuste fiscal gira em torno de 5% do PIB, aponta debate da IFI

Da Redação | 19/06/2018, 23h40

O deficit estrutural das contas públicas no Brasil está numa situação altamente preocupante e o próximo governo, a  ser eleito este ano, terá necessariamente que aprofundar o ajuste fiscal em curso. Esta foi a conclusão do seminário Cenários Fiscais — desafios e dificuldades para superá-los, realizado nesta terça-feira (19) pela Instituição Fiscal Independente do Senado (IFI).

O diretor da IFI, economista Felipe Salto, disse que o Brasil precisa de um ajuste fiscal da ordem de 5% do produto interno bruto (PIB), projeção coincidente com a de outros participantes do seminário.

Devido ao buraco nas contas, Salto alerta que o próximo governo tem grandes possibilidades de descumprir tanto o limite de teto dos gastos públicos (a emenda constitucional 95) quanto a chamada "regra de ouro" já a partir do ano que vem. A regra de ouro, prevista pela Constituição, proíbe que o governo se endivide para financiar gastos correntes.

— Para que as contas públicas saiam do vermelho e retomemos um superavit daqui a 5 ou 6 anos, é necessário uma combinação de redução nas despesas e aumento das receitas próximo a 5% do PIB. Isto é muita coisa, um desafio enorme para o país, que torna o ajuste necessariamente a prioridade zero para o próximo governo. As despesas discricionárias terão que continuar sendo espremidas, mas a solvência da máquina estatal só será possível caso as reformas avancem sobre as despesas obrigatórias — afirmou o economista.

O assessor orçamentário do Senado, Leonardo Ribeiro, advertiu que o rombo já calculado para que a União se encaixe na "regra de ouro" em 2019 chegou a R$ 360 bilhões, ou seja, R$ 100 bilhões a mais do que o valor recentemente divulgado pelo próprio governo.

Dívida explosiva

O debate também apontou que as despesas obrigatórias apresentam seu quadro mais agudo no deficit crescente da Previdência Social. Salto avalia que, caso a agenda reformista não se aprofunde no próximo governo, a dívida poderá chegar rapidamente a 100% do PIB.

Ele e outros participantes do debate, como o jornalista Rolf Kuntz, do jornal O Estado de S. Paulo, alertaram que a dívida pública "está no limite", atualmente apontando uma tendência de crescimento de 0,5% ao mês. Há 5 anos, ela equivalia a 50% do PIB. Hoje gira em torno de 75%, segundo os critérios adotados pelo governo. Mas se forem consideradas metodologias internacionais, como as adotadas pelo Fundo Monetário Internacional (FMI), já se aproxima de 86% do PIB. Um índice muito superior ao mundialmente verificado pelas nações emergentes, ainda em torno de 50% do PIB, como afirmou o secretário do Tesouro Nacional, Mansueto Almeida.

Os participantes avaliaram ainda que, além da reforma da Previdência, outras medidas estruturais terão que ser adotadas no curto prazo para que o endividamento público não fuja do controle.

Entre essas medidas deverá estar a revisão de algumas das renúncias fiscais concedidas nos últimos anos. Segundo dados apresentados pelo Tribunal de Contas da União, estes gastos tributários já desfalcam as contas públicas em cerca de R$ 283 bilhões por ano — isto sem nenhuma avaliação sobre a geração de postos de trabalho ou aumento de investimentos por parte das empresas beneficiadas.

Mansueto Almeida também defendeu que o próximo governo adote medidas visando aumentar a tributação sobre os mais ricos. O secretário do Tesouro chamou a atenção para o fato de o Brasil ter virado um "caso único no mundo", em que o Imposto de Renda alivia os ricos em detrimento da classe média.

— Uma pessoa que ganha R$ 80 mil, R$ 100 mil por mês, por meio de dividendos ou porque se caracteriza como uma pessoa jurídica, vem sendo taxada em torno de 10%. Em compensação, um assalariado que recebe R$ 5.000 arca com 27%. Algo impressionante, em que o Imposto de Renda deixou de considerar a renda. Evidentemente, esta situação precisa ser alterada — reclamou.

Outros riscos

Josué Pellegrini, que também atua na IFI, pediu uma atenção dos gestores para as garantias dadas pela União às dívidas de diversos estados, cujos operações já ultrapassaram R$ 280 bilhões. Muitas destas unidades federativas apresentam um quadro fiscal sufocado, o que levou recentemente a que algumas contra-garantias não fossem honradas. Os impasses só foram superados no âmbito de novas renegociações sob um regime de recuperação.

Reforçando este cenário, Gustavo Lino, representante da Casa Civil, afirmou que a dívida de todos os entes, se somadas, passa dos R$ 500 bilhões.

Para Leonardo Ribeiro, o principal gargalo sobre o déficit público vem se dando no pagamento de juros, que só no ano passado consumiu R$ 360 bilhões. Curiosamente, o mesmo montante calculado de rombo visando o cumprimento da regra de ouro para 2019, segundo alertou o analista.

No enfrentamento a esse quadro, o representante do Banco Mundial Antonio Nucifora não recomenda ao Brasil realizar o ajuste sob o lado da receita. Ele acredita que, se esta for a opção adotada, equivalerá a um "tiro no pé", pois levará a uma queda ainda maior da atividade econômica.

Por fim, houve um consenso dos participantes para que o país flexibilize a execução orçamentária, pois a situação atual é de uma verdadeira "camisa-de-força", segundo o ministro do Planejamento, Esteves Colnago. Se for levado em conta o mínimo de gastos em custeio e investimentos para que a máquina pública não fique totalmente paralisada, então 100% do que é previsto já está de fato engessado, segundo Fernando Rezende, professor da Fundação Getúlio Vargas (FGV).

Agência Senado (Reprodução autorizada mediante citação da Agência Senado)