Debate sobre capital externo no setor aéreo vai da abertura total ao avanço gradual

Da Redação | 08/09/2016, 19h56

O fim de restrições à participação de capital estrangeiro em companhias aéreas brasileiras foi debatido, nesta quinta-feira (8), pela comissão especial de senadores que analisa o projeto de lei (PLS 258/2016) do novo Código Brasileiro de Aeronáutica. Houve posições a favor da total abertura para o capital externo, com a queda do limite atual de 20% sobre o capital votante, ao lado de propostas para um avanço gradual, inicialmente para até 49%, com salvaguardas para proteger o mercado de trabalho de aeronautas e acordos de reciprocidade com os demais países.

A visão mais flexível foi defendida pelos representantes da área governamental, que lembraram a situação de escassez de poupança no país, o que eleva o custo de capitalização das empresas aéreas. De acordo com o secretário de Política Regulatória da Secretaria de Aviação Civil, Rogério Teixeira Coimbra, mais investimentos via capital externo, em qualquer setor, significa maior oferta de serviços e mais concorrência, com melhores preços e mais variedade de opções para os passageiros.

- Então, eu entendo que é um contrassenso a gente querer tudo isso e, ao mesmo tempo, limitar os investimentos que podem viabilizar isso. A permanência de limitações a investimentos no setor só é positiva para quem não deseja mais concorrência – concorrência essa, diga-se de passagem, em bases iguais - observou.

O assessor de Relações Institucionais da Gol, Alberto Fajerman, foi o único entre os representantes das companhias aéreas a defender a abertura total do capital aos investidores externos. Primeiro, ele observou que a companhia é a única do país que opera em bolsa de valores. Com a abertura, a empresa poderá compor seu capital de modo a ter acesso ao segmento mais atrativo das bolsas, o chamado “novo mercado”. Ao contrário dos representantes do governo, ele disse, no entanto, não existir correlação entre a medida com queda nos preços de passagens ou com a qualidade dos serviços.

- O Brasil já tem um nível de aviação excepcional, em pontualidade, preço, etc. Eu não acho que a discussão da retirada da restrição do capital estrangeiro tenha necessariamente uma relação com isso. É simplesmente o capital que existe no mundo poder ascender a um setor se assim o desejar – afirmou.

Estratégia militar

Favorável ao fim da restrição, o representante da Agência Nacional de Aviação Civil (Anac), Ricardo Bisinotto Catanant, observou que a questão dos limites ao capital estrangeiro surgiu no cenário de conflitos mundiais do século passado, por questão de estratégia militar. Como as aeronaves poderiam ser requisitadas, a qualquer momento, para a mobilização de tropas, havia o interesse dos governos que o setor fosse controlado por nacionais. Porém, disse que aviação mudou muito desde então, e que hoje sequer as aeronaves pertencem às companhias, mas sim a grupos de leasing (arrendatários) internacionais.

A discussão sobre a flexibilização, ainda segundo o representante da Anac, não ocorre somente no Brasil. Na União Europeia, já haveria uma abertura até 49% do capital externo entre os países membros, com diretriz para estudos para a medidas de flexibilização se estenda a nações de fora do espaço comum. Disse ainda que os Estados Unidos já vêm tentando implementar essa flexibilização há mais de uma década.

– Desde 2005, já há notícia de que se tenta discutir o assunto por lá, mas ainda não foi adiante. Mas me parece uma questão irrefreável. A questão é: quando vai acontecer e se o Brasil vai dar esse passo neste momento - comentou.

Concessões mútuas

A representante da companhia aérea Azul, Patrizia Xavier, diretora de Relações Institucionais da empresa, foi a primeira a defender uma solução gradualista, a começar pela discussão sobre os termos de reciprocidade (concessões mútuas) entre o Brasil e outros países, e não por uma abertura unilateral. Além do mais, lembrou que restrições ao capital externo ainda é uma regra em todo mundo. No caso da Nova Zelândia, disse, a medida só serve para determinadas rotas. Quanto ao Chile, observou que o país exige reciprocidade.

- Então, enfim, estamos fazendo algo inovador. Não existe no mundo nenhum país que abriu 100% do seu capital - sustentou.

Para Tarcísio Geraldo Gargioni, vice-presidente comercial da Avianca, a liberação imediata para 100% pode de fato envolver riscos. Sua posição é de que seja feita um escala inicial maior de participação estrangeira, até 49% do capital votante. Até porque, na sua visão, os problemas de infraestrutura aeroviária e as incertezas econômicas atuais desmotivariam o capital estrangeiro.

Guilherme Leite, gerente jurídico da Latam, disse que a empresa vê com “bons olhos” a discussão sobre a flexibilização do capital acionário, não se posicionando sobre o nível ideal de abertura para o capital estrangeiro nesse momento. Também disse que não esse não seria o ponto para “salvar” as empresas nacionais e fazer o negócio voltar a crescer. Na sua visão, o debate tem que ser acompanhado da revisão dos encargos trabalhistas, que seriam muito altos no país, e ainda de mudanças na cobrança do ICMS.

- São ferramentas para que o nosso setor volte a crescer no Brasil, para que a gente volte a ter rentabilidade, competitividade com os estrangeiros – argumentou.

Integrante da diretoria do Sindicato Nacional dos Aeronautas, José Adriano Castanho Ferreira, o comandante Castanho, deixou claro que a entidade não é contra ampliar a participação estrangeira no capital das empresas. Alertou, no entanto, que o sindicato não abre mão de “medidas mitigatórias” para evitar a fragilização dos interesses nacionais, especialmente no que se refere aos direitos dos trabalhadores do setor, inclusive para evitar que a mão de obra embarcada seja substituída por estrangeiros.

Agência Senado (Reprodução autorizada mediante citação da Agência Senado)