Entenda a representação por quebra de decoro contra Delcídio do Amaral

Da Redação | 10/05/2016, 16h33

O país foi surpreendido nas primeiras horas da manhã de 25 de novembro de 2015 com a notícia de que o líder do governo no Senado, Delcídio do Amaral, então filiado ao PT do Mato Grosso do Sul, havia sido preso pela Polícia Federal. Além disso, estavam sendo realizadas buscas nas residências e no gabinete do senador.

A prisão foi determinada pelo ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Teori Zavascki. A alegação foi que Delcídio atuava para atrapalhar as investigações da Operação Lava Jato, da Polícia Federal, que investiga a corrupção Petrobras.

Segundo documentação encaminhada pelo ministro do STF ao Senado, Delcídio negociara a facilitação de fuga do ex-diretor da Área Internacional da Petrobras Nestor Cerveró para evitar uma possível colaboração premiada com a Justiça. Em troca do silêncio, seriam oferecidos R$ 50 mil mensais à família de Cerveró. A conversa foi gravada por Bernardo Cerveró, filho de Nestor, e o teor da gravação foi publicado na imprensa.

Por lei, cabia ao Senado autorizar a detenção de um senador no exercício do mandato. A votação em Plenário aconteceu na noite do próprio dia 25. Com 59 votos favoráveis, 13 contrários e uma abstenção, os senadores acolheram a decisão do Supremo e Delcídio permaneceu detido até 19 de fevereiro, período em que ele próprio firmou acordo de delação premiada, acusando de corrupção dezenas de políticos, funcionários públicos, lobistas e empresários.

Quebra de decoro

Em 1º de dezembro, a Rede Sustentabilidade e o Partido Popular Socialista (PPS) entraram com representação contra Delcídio do Amaral no Conselho de Ética e Decoro Parlamentar pedindo a instauração de procedimento disciplinar para verificar se houve quebra de decoro pelo senador. No documento, os dois partidos alegaram que recaía sobre o parlamentar a acusação de ter oferecido a Nestor Cerveró a facilitação de soltura, uma rota de fuga e uma mesada a seus familiares em troca do silêncio do ex-diretor da Petrobras.

Com o processo instaurado no Conselho de Ética (PRS 29/2016), Delcídio foi oficialmente informado no dia 22 de dezembro sobre o teor do procedimento. Após a notificação, foi concedido um prazo aos advogados do senador para a entrega da defesa preliminar. Devido ao recesso parlamentar, isso só aconteceu em meados de fevereiro passado.

O primeiro senador sorteado para relatar o processo no Conselho de Ética foi Ataídes de Oliveira (PSDB-TO). Entretanto, a defesa pediu a substituição de relator com a argumentação de que Ataídes integra o Bloco Parlamentar da Oposição, do qual também faz parte um dos apoiadores da representação, Ronaldo Caiado (DEM-GO). Na ocasião, Delcídio ainda estava filiado ao PT, do qual saiu após negociar sua delação. Novo sorteio aconteceu em 2 de março e a tarefa foi transferida ao senador Telmário Mota (PDT-RR).

Uma semana depois, o parlamentar de Roraima apresentou o relatório recomendando a continuidade da representação contra Delcídio do Amaral por quebra de decoro e abuso das prerrogativas parlamentares. Ele alegou a existência de indícios suficientes para a cassação do mandato.

Ausências

Nos meses de processo contra Delcídio do Amaral no Conselho de Ética, o ex-senador foi convocado por quatro vezes a apresentar sua defesa. Não compareceu a nenhuma delas. A Resolução 20 de 1993, que disciplina o funcionamento do Conselho, traz a possibilidade de audiência do acusado, mas ao representado é facultado o direito de não ir, o que não impede o andamento do processo. Durante o período de análise da representação Delcídio ingressou junto ao Senado com sucessivos pedidos de licença para tratar da saúde e de interesses particulares.

A perda do mandato foi pedida pelo relator do caso, Telmário Mota. De acordo com Telmário, não havia dúvidas de que Delcídio do Amaral abusou das prerrogativas constitucionais ao ter uma conversa considerada incompatível com a conduta de um parlamentar. O parecer do Conselho foi aprovado em 3 de maio, com 13 votos favoráveis, uma abstenção, uma ausência e nenhum voto contrário.

— Quando um senador se propõe a auxiliar na fuga de um criminoso e a intervir no funcionamento de um tribunal, ele não só atinge o decoro parlamentar, como também macula a imagem do próprio Senado — argumentou Telmário.

A defesa de Delcídio do Amaral alegou que o processo não tinha cabimento devido à ausência de provas legais que incriminassem o parlamentar.

— Esse processo disciplinar, sob a nossa ótica, carece de um mínimo necessário de provas e de elementos. O senador tem uma biografia sem jaça, enquanto alguns que o acusam não podem dizer a mesma coisa. Muitos daqueles que o querem ver cassado estão com contas no exterior — declarou o advogado Antônio Augusto Figueiredo Basto.

Constitucionalidade

O processo foi encaminhado à Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ), onde o relator, senador Ricardo Ferraço (PSDB-ES) apresentou, na última quarta-feira (4), parecer considerando constitucional a decisão do Conselho de Ética. A pedido do senador José Agripino (DEM-RN), a comissão concedeu mais uma oportunidade para a defesa de Delcídio. O senador compareceu, então, à reunião da CCJ de segunda-feira (9).

Na Comissão de Constituição e Justiça, Delcídio reconheceu que errou no caso da conversa com o filho de Nestor Cerveró, motivo de sua prisão em novembro de 2015. Ele pediu desculpas à população brasileira, afirmou que agiu “a mando” e alegou não ter cometido qualquer irregularidade que justificasse a cassação de seu mandato.

Informados de um aditamento feito à denúncia contra Delcídio no Supremo, produzido pela Procuradoria-Geral da República (PGR), os integrantes da CCJ decidiram esperar os novos documentos juntados para votar o parecer, pois a representação contra o parlamentar era baseada na denúncia que corre no STF. Horas depois, o presidente da CCJ, senador José Maranhão (PMDB-PB), informou que os documentos no processo encontram-se em segredo de justiça, o que impediria o compartilhamento do Supremo com a CCJ.

Na noite da própria segunda-feira (9), a Comissão de Constituição e Justiça fez uma reunião extraordinária no Plenário do Senado e aprovou o relatório do senador Ricardo Ferraço recomendando a constitucionalidade da cassação do mandato de Delcídio por quebra de decoro e abuso das prerrogativas parlamentares.

A votação final do processo (PRS 29/2016) foi marcada para esta terça-feira (10), em sessão plenária do Senado.

Agência Senado (Reprodução autorizada mediante citação da Agência Senado)