Donos de haras criticam método de controle de doença por meio do abate de cavalos

Iara Guimarães Altafin | 25/02/2016, 15h35

O país não dispõe de exames conclusivos para detecção da doença mormo, que ataca cavalos. A afirmação foi unânime entre os donos de haras que participaram de debate nesta quinta-feira (25) na Comissão de Agricultura e Reforma Agrária (CRA). Eles defendem que, por isso, os órgãos de Defesa Agropecuária não poderiam interditar propriedades e obrigar o sacrifício dos animais.

O mormo é uma doença bacteriana grave e contagiosa que ataca equinos, mas pode também ser transmitida ao homem e a outros animais. Os sintomas são corrimento nas narinas e nódulos nas mucosas nasais e nos pulmões do animal, sendo também frequentes casos assintomáticos. Constatada a doença, o cavalo é geralmente sacrificado para evitar a contaminação de outros animais.

No debate, Sophia Baptista de Oliveira, proprietária da Agro Maripá, apontou falta de credibilidade nos laboratórios credenciados pelo Ministério da Agricultura para realizar testes nos animais com suspeita da doença. A empresa tem 400 cavalos e está interditada há 19 meses, devido a resultado positivo para mormo. Nove cavalos já foram sacrificados, revelou.

Sophia de Oliveira apontou discrepância entre resultados de exames em um mesmo animal, realizados em duas unidades do laboratório Lanagro, credenciado para realização dos testes.

— O mesmo animal é negativo, depois fica positivo, depois ele fica negativo de novo. Não há coerência nos resultados — frisou.

Como não obteve sucesso nas tentativas de esclarecer o caso junto a órgãos sanitários, a empresa consultou especialistas internacionais, os quais apontaram falhas no diagnóstico e nas ações de erradicação do mormo no Brasil.

Sem solução

Outro exemplo relatado no debate foi o da Coudelaria Souza Leão, em Pernambuco, interditada desde 2009 e onde já foram sacrificados mais de 200 cavalos, “praticamente sem sintomas”, como afirmou seu presidente, Joaquim de Souza Leão.

— Eu tive mais de duas centenas de animais sacrificados em exames realizados por laboratórios que não tinham a devida acreditação para realizá-los, o que fui descobrir apenas no ano passado. É uma loucura, você sai matando cavalo e não resolve nada — protestou.

Também Simone Matheus Pongitore, proprietária do Haras Quatro Irmãos, apontou falhas no trabalho dos órgãos públicos, mas ressaltou a disposição do setor em contribuir para erradicar a doença.

— Nenhum criador quer o mormo na sua propriedade. Nenhum criador tem interesse em manter um animal doente na sua propriedade. O que nós queremos é que o diagnóstico seja correto. Eu também não quero matar animais sadios sem comprovação da doença — disse, ao relatar que o haras recorreu ao Judiciário para continuar atuando.

Frente aos relatos, o senador Otto Alencar (PSD-BA) disse não ver justificativa para a manutenção das interdições das fazendas de criação de cavalos.

— Eu não conheço nenhum país do mundo onde isso aconteça. Não se pode ficar por dois anos interditado, ou dez meses, ou oito meses, pois isso destrói completamente a condição comercial e atrapalha totalmente o banco genético desses haras, como é o caso do Haras Quatro Irmãos — lamentou.

Ocorrências

Conforme Guilherme Marques, do Ministério da Agricultura, o mormo reapareceu no Brasil em 2000 e os registros, antes restritos ao Nordeste, hoje ocorrem em todo o país.

Ele alega que as normas de controle da doença são nacionais, mas os estados têm autonomia para fazer a gestão da propriedade, determinando o início e o fim da interdição na propriedade, bem como a condenação de animais.

Conforme esclareceu, foram realizados 680 mil exames em 2015, resultando na condenação de 180 animais, frente a um universo de cerca de cinco milhões de cavalos existentes no país.

— [O sacrifício de animais] é um número pontual, cirúrgico, que estamos buscando, para zelar a maior parte [dos animais], que são os 99,8% em que nada tem sido detectado — frisou.

Críticas

Autor do requerimento para realização do debate, o senador Ronaldo Caiado (DEM-GO) disse que os testes para detectar o mormo só são feitos em animais que participam de competições esportivas e de feiras, ficando a descoberto todos os outros milhares de animais de serviço e lazer.

Ele também criticou a demora na entrega de resultado dos testes, que pode levar até 60 dias, tempo em que o cavalo com suspeita da doença poderá contaminar outros animais.

A instalação de mais laboratórios nos estados conta com o apoio dos empresários, como afirmou Flávio Obino Filho, representante da Associação Brasileira de Criadores e Proprietários do Cavalo de Corrida.

— Se for necessário colocar verba privada para que esses laboratórios funcionem, vamos colocar. Esperamos que nosso país tenha condições de aplicar esse exame, não tendo só um laboratório de referência — disse.

Olimpíadas

Ronaldo Caiado questionou o representante do Ministério da Agricultura quanto à liberação da área onde serão realizadas as provas de hipismo nas Olimpíadas, no Complexo Militar de Deodoro, apesar de suspeitas de mormo entre animais da Escola de Equitação do Exército, que funciona na região.

Guilherme Marques afirmou ao senador que os animais foram retirados da área onde ocorrerão as provas, só ficando animais cujos testes deram negativos.

Para o senador, o Ministério adotou medida diferente da que submete o setor privado.

— Vocês têm dois pesos e duas medidas. Ao criador, o massacre, a eutanásia, a interdição. Ao Estado, que quer fazer com que aquela área seja autorizada, achamos um cantinho para botar os animais e lá já está saneado. Isso é um absurdo — protestou.

Durante o debate, a presidente da CRA, senadora Ana Amélia (PP-RS), e os senadores Waldemir Moka (PMDB-MS), Wellington Fagundes (PR-MT), Flexa Ribeiro (PSDB-PA), Donizeti Nogueira (PT-TO) e José Medeiros (PPS-MT) também manifestaram preocupação com as dificuldades relatadas pelos criadores de cavalos.

Agência Senado (Reprodução autorizada mediante citação da Agência Senado)