Ministro argentino defende que o novo Código Civil reconheça direitos coletivos
A Comissão de Juristas criada pelo Senado para elaborar uma proposta de atualização do Código Civil brasileiro (Lei 10.406/2002) ouviu nesta segunda-feira (26) o ministro da Suprema Corte Argentina, Ricardo Lorenzetti. Ele defendeu os princípios da interpretação favorável ao consumidor e da proteção ao meio ambiente como guias para as decisões do Judiciário e reconhecimento dos bens coletivos.
Transcrição
O SENADO RECEBEU O MINISTRO RICARDO LORENZETTI, DA SUPREMA CORTE ARGENTINA, PARA DEBATER O NOVO CÓDIGO CIVIL BRASILEIRO.
ELE DEFENDEU OS PRINCÍPIOS DA INTERPRETAÇÃO FAVORÁVEL AO CONSUMIDOR E PROTEÇÃO AO MEIO AMBIENTE COMO GUIAS PARA AS DECISÕES DO JUDICIÁRIO E O RECONHECIMENTO DOS BENS COLETIVOS.
A REPÓRTER MARCELLA CUNHA TEM OS DETALHES
A comissão de juristas criada para debater a reforma do Código Civil recebeu nesta segunda-feira o ministro Ricardo Lorenzetti, da Corte Suprema da Argentina. O objetivo foi ouvir as contribuições do ministro baseadas na sua experiência coordenando a reforma da legislação do país vizinho. Para Lorenzetti, os conflitos entre direitos individuais e bens coletivos são um problema atual em todo o mundo e precisam ser compatibilizados no novo código brasileiro.
"Temos agora direitos sobre bens jurídicos coletivos. Se vocês decidem não incluir isso, está bom mas vai ter um problema. Temos direito à propriedade, mas tem que ser compatível com os bens comuns. E não deve afetar o funcionamento e a sustentabilidade dos ecossistemas, de fauna, flora, biodiversidade, água, os valores culturais. Isso é quase revolucionário no Código, mas é a prática judiciária atual".
Lorenzetti também ponderou sobre a necessidade de coerência através da comunicabilidade dos princípios jurídicos, já que é comum observar em todo o mundo leis especiais que vão em uma direção contrária aos tratados internacionais. Segundo ele, o operador do direito precisa ter uma leitura transversal de todas as normas disponíveis. O jurista defendeu que o Brasil se espelhe no modelo argentino de tutela preventiva e crie mecanismos que evitem danos às pessoas, e não apenas à propriedade.
"Mas, se ela quer agredir ou causar dano à honra da pessoa, pode - não tem tutela preventiva, somente pagando um dinheiro. E se causa dano ao ambiente é a mesma coisa: paga um dinheiro e segue. Então, essa é uma desarticulação dos valores, porque, se nós sustentamos que o sistema jurídico protege a pessoa, mas na prática tem mais instrumentos para proteger a propriedade que a pessoa é uma incoerência lógica".
Durante a audiência, o ministro Edson Fachin, do Supremo Tribunal Federal, elogiou a condução da reforma na Argentina, e disse que o novo Código Civil vai levar o Brasil para o século 21.
"A demanda já não é por Códigos ideais. Nós somos nós e a nossa circunstância, Portanto a nossa circunstância hoje é a Natureza está perdendo sua capacidade e resiliência, e um Código Civil não pode alienar-se dessa natureza e dessa esperança. Um Código está dentro da história, é um texto num contexto".
O presidente da Comissão de Juristas, o ministro Luis Felipe Salomão, do Superior Tribunal de Justiça, garantiu que o debate está só começando. E que vai buscar o consenso para dar mais força ao texto proposto.
"A primeira semana de abril vai ser inteira dedicada a esses debates e a essas votações. Por isso que nós trouxemos essas visões mútiplas aqui dos juristas que elaborarm o novo Código Civil da Argentina, do ministro Fachin que traz uma visão hoje do civilista que é das questões que assolam mais de perto ali, como ministro da Suprema Corte. É importante que tenhamos um consenso em grande parte do texto para que ele possa ter legitimidade e força para caminhar no Parlamento".
A audiência pública também contou com a participação da relatora do colegiado que revisou o Código Civil argentino, Aida Kemelmajer, e da professora de direito Maria Fernanda Pires. Da Rádio Senado, Marcella Cunha