Debate apoia eólicas em alto-mar, mas incentivo a térmicas traz divergências

Da Agência Senado | 20/08/2024, 14h49

Um projeto de lei sobre o aproveitamento de potencial energético offshore (em alto-mar) para expandir a produção de energia elétrica no país foi tema de amplo debate em audiência pública na Comissão de Infraestrutura (CI) nesta terça-feira (20). Apesar de obter apoio, a matéria (PL 576/2021 - Substitutivo) suscitou discordâncias entre os debatedores com relação às emendas inseridas na Câmara ao texto originado no Senado.

O projeto original, de autoria do ex-senador Jean Paul Prates, regulamenta a oferta e outorga de áreas para exploração de energia em alto mar, como por geração eólica. A proposta foi aprovada no Senado e enviada à Câmara em agosto de 2022. Como foi modificado pelos deputados, o texto retornou aos senadores na forma de um substitutivo, que tem na relatoria o senador Weverton (PDT-MA).

O substitutivo traz, por exemplo, a prorrogação de subsídios para a contratação de térmicas a carvão mineral com contrato de compra de energia no ambiente regulado, atualmente com prazo de término em 2028, e a contratação compulsória de térmicas a gás inflexíveis.

Um dos autores do requerimento para a audiência pública, o senador Marcos Rogério (PL-RO) disse que recebeu mensagem de Jean Paul Prates em que o ex-senador salienta que seu texto original tratava apenas da questão das eólicas offshore. 

Para Marcos Rogério, é preciso fazer uma discussão com “uma visão mais alargada”. O parlamentar afirmou que este é um tema que interessa a todos os consumidores e que é preciso conhecer bem as fontes de energia e o impacto que cada uma representa. Não se pode desconsiderar, segundo o senador, que as fontes hidráulicas são intermitentes em razão dos períodos de chuva e seca que há no Brasil. Ele também enfatizou que os números com relação ao setor não são claros.

— Não temos uma codificação que nos diz exatamente o que é cada custo. Nós não temos uma matriz de referência legal para discutir a questão — salientou Marcos Rogério. 

Da mesma forma, o senador Esperidião Amin (PP-SC) disse que “estamos vivendo o momento em que a demonização de formas de obter energia ignora as inovações tecnológicas”.

— Vencer os preconceitos e abrir a cabeça para a evolução que a inovação tecnológica pode nos propiciar vale a pena — defendeu.

Para o senador, o debate sobre o tema também deveria ocorrer com a participação dos entes federados.

Aumento de custos

Para o presidente executivo da Associação Brasileira de Distribuidores de Energia Elétrica (Abradee), Marcos Madureira, as emendas adicionadas ao projeto na Câmara dos Deputados vão aumentar valores a serem pagos para o consumidor: algo em torno de 11% até 2050.

— Todas as fontes são necessárias, mas não da maneira como elas estão sendo trazidas, de forma compulsória — disse Madureira.

O presidente da Abradee apoia a aprovação do projeto originado no Senado, sem alterações inseridas pelos deputados. 

Presidente da Frente Nacional de Consumidores de Energia (FNCE), Luiz Eduardo Barata Ferreira afirmou que “temos um país da energia barata e da conta de luz cara”. Ele também se manifestou favorável à aprovação do PL das eólicas offshore, mas salientou que as emendas oriundas da Câmara poderão onerar a conta dos consumidores em mais de R$ 650 bilhões nos próximos 25 anos.

— Essas emendas não devem ser aprovadas aqui no Senado, porque temos energia hoje suficiente para atender a nossa população. Essas emendas não foram sustentadas por nenhum estudo técnico. (...) Além disso, algumas dessas emendas vão levar à agressão ao meio ambiente, em especial as usinas térmicas.

O grande objetivo do país deveria ser oferecer energia limpa, barata e segura, segundo o presidente da Associação Brasileira de Grandes Consumidores de Energia (Abrace Energia), Paulo Pedrosa.

— A sociedade paga energia na conta de luz, mas paga duas vezes mais por aquilo que se compra no mês, como em uma bandeja de frango. Esse projeto, se aprovado como está, vai comprometer a produtividade da indústria nacional, encarecer os produtos brasileiros e facilitar a competição dos produtos importados, que deslocam a produção nacional, comprometem os empregos e a arrecadação dos governos.

Eólicas offshore

Segundo o gerente-executivo de Relações Governamentais do Instituto Brasileiro de Petróleo e Gás (IBP), Daniel Antunes, o mundo tem olhado para as eólicas offshore, que se “notabilizam por inaugurar oportunidades”:

—  A gente vislumbra que, no médio e longo prazo, nós podemos ter uma ampliação de criação de posse de trabalhos, receitas governamentais para os estados, para os municípios. É uma cadeia extensa que vai gerar uma movimentação de aumento da capacidade produtiva, infraestrutura portuária e até mesmo da indústria naval. É uma cadeia que vai da fabricação das pás até as turbinas e até mesmo às operações de descomissionamento. Então, há uma grande oportunidade.

Representante do Conselho Global de Energia Eólica, Roberta Cox enfatizou que as eólicas offshore têm potencial de trazer muitos investimentos ao país.

— O Brasil é um mercado muito interessante. Inclusive no Sul, os ventos offshore são de grande qualidade. (...) Espalhado por todo o país temos um potencial muito elevado, com grande possibilidade de trazer essas indústrias para o Brasil — disse Roberta. 

Diretor de Novos Negócios da Associação Brasileira de Energia Eólica (ABEeólica), Marcelo Cabral apontou que as eólicas podem gerar 1.200 gigawatts (GW), número que não pode ser desprezado.

— Isso porque não tem lei. Imagina quando tivermos um marco estabelecido. (...) Se a gente não começar agora, a gente perde o bonde da história. O momento é agora — disse Cabral.

Já o presidente executivo da Associação Brasileira de Geração de Energia Limpa (Abragel), Charles Lenzi, afirmou que “o projeto traz avanços importantes para o desenvolvimento de uma matriz elétrica equilibrada, segura e confiável e com ênfase na modicidade tarifária”.

Termelétricas

Consultor de Relações Institucionais da Associação Brasileira de Geradoras Termelétricas (Abraget), Edvaldo Luís Risso lembrou que no Brasil 95% da energia é renovável, mas apontou a importância das termelétricas, que tem sua ”energia contratada, firme” passível de atender em 100% do tempo.

Durante as enchentes no Rio Grande do Sul, as usinas termelétricas a carvão desempenharam um papel fundamental para garantir o atendimento quando outras fontes não puderem atender, segundo Risso.  

Já o diretor-presidente da Associação Brasileira dos Produtores Independentes de Energia Elétrica (Apine), Guilherme Jorge Velho, afirmou que a contratação com aumento de teto para as térmicas a gás inflexíveis irá gerar R$ 155 bilhões em acréscimo nos custos. Ele também enfatizou não ser necessária a contratação de eólicas no Sul, assim como a contratação de térmicas a carvão.

O presidente da Associação Brasileira do Carbono Sustentável (ABCS), Fernando Luiz Zancan, defendeu que o carvão mineral é uma fonte barata, mas é um combustível esquecido.

— Se a gente precisa de térmicas, as mais baratas estão na região de Candiota [RS]. E na questão das emissões é irrelevante, somente 0,3% das emissões brasileiras.

Tendo o carvão mineral como sua principal riqueza, o município de Candiota tem as “usinas mais modernas do mundo”, segundo o prefeito Luiz Carlos Folador. O gestor defendeu a manutenção da produção dessa energia no município, com benefícios de forma direta e indireta à população.

— Não é subsídio, é incentivo. Aprovem sem medo esse projeto que trará impacto positivo para todo o país — pediu Folador.

Também participaram o diretor técnico-comercial da Associação Brasileira das Empresas Distribuidoras de Gás Canalizado (Abegás), Marcelo Mendonça e o representante do Sindicato das Indústrias de Energia e de Serviços do Setor Elétrico do Estado do Ceará (Sindienergia), Lucio de Castro Bomfim Junior.

Agência Senado (Reprodução autorizada mediante citação da Agência Senado)