Senado volta a analisar regras para pesquisas clínicas com seres humanos

Da Agência Senado | 15/01/2024, 20h33

Está de volta ao Senado o projeto que cria regras para a pesquisa clínica com seres humanos e o controle das boas práticas clínicas por meio de comitês de ética em pesquisa (CEPs). O PL 6.007/2023 é um substitutivo (texto alternativo) da Câmara dos Deputados ao PLS 200/2015, dos ex-senadores Ana Amélia, Waldemir Moka e Walter Pinheiro. A intenção dos autores era acelerar a liberação de pesquisas clínicas no Brasil.

Aprovado em 2017 pelo Senado, o projeto foi analisado pelos deputados, que apresentaram um novo texto em substituição ao dos senadores, com mais artigos e definições ligadas à pesquisa. Aprovado em dezembro, o substitutivo agora será analisado pelo Senado. O texto, do deputado Pedro Westphalen (PP-RS), prevê direitos para os participantes voluntários das pesquisas e deveres para os pesquisadores, os patrocinadores e as entidades envolvidas.

O substitutivo traz 54 definições de termo ligados à pesquisa, além de exigências éticas e científicas para a realização de pesquisas com pessoas. Além disso, institui  o Sistema Nacional de Ética em Pesquisa Clínica com Seres Humanos, e cria regras para fabricação, uso, importação e exportação de bens ou produtos para esse tipo de pesquisa. Também estão previstas regras para o armazenamento e a utilização de dados e de material biológico humano.

Uma das inovações com relação ao texto do Senado é o prazo de 90 dias para que a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) analise petições primárias de ensaios clínicos com seres humanos para fins de registro sanitário do produto sob investigação. A exceção será para produtos complexos, cujo prazo é de 120 dias. Esses prazos não constavam no texto original. Caso os prazos sejam descumpridos, o desenvolvimento clínico poderá ser iniciado, desde que contenha as aprovações éticas pertinentes.

Regras

As pesquisas, de acordo com o texto, deverão atender a exigências éticas e científicas, como embasamento em relação risco-benefício favorável ao participante; respeito a seus direitos, segurança e bem-estar; e respeito a sua privacidade e ao sigilo de sua identidade.

Para que a pesquisa possa ocorrer com a participação de seres humanos, seja um ensaio clínico de medicamento já existente ou similar ou terapias experimentais, o pesquisador deverá submeter o pedido (protocolo de pesquisa) ao comitê de ética vinculado à instituição que realizará a pesquisa. O comitê será composto por equipe multidisciplinar, nas áreas médica, científica e não científica e terá em sua composição um representante dos participantes da pesquisa.

Se a pesquisa envolver um grupo especial, representante desse grupo poderá participar como membro ad hoc e, se for o caso, também um consultor familiarizado com a língua, os costumes e tradições da comunidade (povo indígena, por exemplo). Esse integrante convidado não participa da deliberação, que caberá somente aos membros efetivos.

O prazo para que esses comitês analisem os protocolos de pesquisa submetidos a eles com as informações necessárias é de 30 dias, com a possibilidade de pedidos de documentos adicionais ao pesquisador. O parecer será pela aprovação da pesquisa, não aprovação, aprovação com pendência se houver necessidade de correção; ou suspensão, quando pesquisa aprovada e em andamento deve ser interrompida por motivo de segurança. Dessa decisão caberá recurso ao próprio comitê.

Quando a pesquisa for de interesse estratégico para o SUS (definido pelo Ministério da Saúde), terá prioridade na análise ética e contará com procedimentos especiais de análise, nos termos de regulamento.

Voluntários

A participação nos estudos é voluntária e sem remuneração, mas os participantes podem receber algum tipo de pagamento se a pesquisa envolver ensaios clínicos de fase 1 ou de bioequivalência, como os realizados para atestar a funcionalidade de vacinas ou a efetividade de medicamentos genéricos.

Para isso, o interessado deve integrar o Cadastro Nacional de Voluntários em Estudos de Bioequivalência, não participar de mais de uma pesquisa ao mesmo tempo e, em caso de teste de avaliação da dose máxima tolerada ou avaliação de biodisponibilidade e bioequivalência, terá de esperar seis meses entre uma pesquisa e outra.

A participação em qualquer pesquisa dependerá de um termo de consentimento livre e esclarecido (TCLE) assinado pelo participante ou seu representante legal. Esse termo deverá ser redigido de forma clara e legível com informações necessárias para o completo esclarecimento sobre a pesquisa. O participante poderá desistir da pesquisa a qualquer momento, sem ônus ou prejuízo, além de ter direito ao ressarcimento de despesas como transporte e alimentação, ainda que envolvam seus acompanhantes.

Medicamento experimental

Após a participação do voluntário na pesquisa clínica, o projeto prevê que o pesquisador deverá avaliar a necessidade da continuidade do fornecimento do medicamento experimental. Ao contrário do garantido atualmente por normas infralegais, o fornecimento de medicamento pesquisado poderá ser interrompido em algumas situações.

Uma delas é após cinco anos da disponibilidade comercial do medicamento no país. O prazo previsto no projeto do Senado era de dois anos. Outra hipótese incluída no substitutivo é quando o medicamento experimental estiver disponível no Sistema Único de Saúde (SUS).

Entre as hipóteses que autorizam a interrupção também estão a decisão do participante, a cura da doença, o agravamento da saúde, a introdução de alternativa terapêutica satisfatória, a falta de benefício do uso continuado (considerando-se a relação custo/benefício); reações adversas que inviabilizem a continuidade,  impossibilidade de obtenção ou fabricação do medicamento por questões técnicas ou de segurança.

Material biológico

No termo que terá de assinar, o participante deverá autorizar ou não o armazenamento de seu material biológico para outras pesquisas de forma gratuita. Para isso, terá direito a ser informado sobre potenciais benefícios e riscos inerentes à disposição de seu material biológico. Também poderá ter acesso às informações associadas a seu material, principalmente quanto a achados em pesquisas que revelem potenciais danos à sua saúde, e será informado sobre a transferência, a perda, a alteração ou o descarte do material.  O consentimento pode ser retirado pelo participante a qualquer tempo.

O projeto prevê que o material biológico e os dados da pesquisa serão utilizados exclusivamente para a finalidade do respectivo projeto, exceto se no termo de consentimento houver autorização expressa para uso em pesquisas futuras. O comitê poderá autorizar a dispensa desse consentimento prévio se a pesquisa for de relevante valor social e não for viável ou exequível sem essa dispensa.
Além disso, por meio de um termo de transferência, o material biológico poderá ir para outros pesquisadores, inclusive no exterior.

Indenização

A proposta determina ainda a indenização do participante por danos sofridos por sua participação na pesquisa. Nesses caos, ele deve receber assistência à saúde necessária para solucionar esses danos. Caberá ao patrocinador pagar a indenização e a assistência.

No caso de pesquisas patrocinadas por governos, agências governamentais nacionais ou internacionais ou instituições sem fins lucrativos, a instituição de pesquisa brasileira poderá assumir as responsabilidades pela indenização, isentando os patrocinadores dessa obrigação. Essa exceção foi incluída no texto pela Câmara.

Com informações da Agência Câmara

Agência Senado (Reprodução autorizada mediante citação da Agência Senado)