Mulheres discutem valorização do papel das parteiras

Da Redação | 28/11/2017, 19h16

Parteiras tradicionais do Amapá, de Pernambuco e de Goiás participaram nesta terça-feira (28) da 48ª Pauta Feminina, no Senado Federal, para discutir a valorização do papel das parteiras tradicionais, como parte da programação dos 16 Dias de Ativismo pelo Fim da Violência contra a Mulher. A atividade foi organizada pela Procuradoria Especial da Mulher do Senado e pela Secretaria da Mulher da Câmara dos Deputados, entre outros parceiros.

Reivindicações

Mediadora da conversa, a deputada Janete Capiberibe (PSB-AP) lamentou o desmonte, em seu estado, de uma política pública voltada para as parteiras tradicionais, baseada na capacitação, registro e remuneração das parteiras tradicionais, que prestam gratuitamente um trabalho onde nem o estado e muito menos a iniciativa privada chegam. Estruturada em 1995, no governo João Capiberibe, a experiência no Amapá inspira a atuação legislativa da deputada em defesa da regulamentação da atividade da parteira tradicional.

Para Sandra de Souza Maciel, socióloga, parteira aprendiz e Coordenadora Nacional do Movimento Curador, que investe na formação de novas parteiras, há três pontos fundamentais: retratação pública, com indenização para parteiras maiores de 60 anos; remuneração para o parto domiciliar realizado por parteiras, a partir das notificações; reunião da documentação já existente sobre as parteiras tradicionais, nascida de iniciativas acadêmicas; e adoção de uma abordagem “holística” para "um novo rural”.

- Não dá pra tratar nada isoladamente: o trabalho das parteiras, com todo o seu saber sobre as ervas, tem a ver com temas como permacultura, agrofloresta,  agronegócio, pois ervas tradicionais, conhecidas por seus poderes medicinais são descartadas como mato -  disse Sandra.

Reconhecimento

Procuradora Especial da Mulher no Senado, a senadora Vanessa Grazziotin disse que as parteiras têm “um conhecimento empírico e científico ao mesmo tempo”.  A senadora fez um paralelo entre a luta das parteiras e a luta pelo reconhecimento dos soldados da borracha.

- O Norte e o Nordeste têm uma história muito bonita. Morreram mais brasileiros na Amazônia brasileira, nesse esforço de produzir a borracha para a guerra, do que no front. Depois de muita luta, conseguimos aprovar uma emenda constitucional para repará-los, e eu me comprometo, aqui, junto com a deputada Janete, a ser uma guerreira pelo reconhecimento do valor do trabalho das parteiras - disse a senadora.

Conceitos e preconceito

Maria Luiza Dias, presidente da Rede Estadual de Parteiras Tradicionais do Amapá, mencionou o imenso preconceito em relação ao conhecimento das parteiras, lembrando que eram chamadas de bruxas, feiticeiras e macumbeiras e o receio com que atenderam à iniciativa do governo João Capiberibe de valorizá-las.

- Como havia vigias no Palácio, houve receio, da parte de algumas parteiras, de que pudessem ser acionados para prendê-las - recordou Maria Luiza Dias.

Verónique Durand, doutora em Antropologia e autora do libro Órfãs de Esperança – Violências contra a Mulher – Alguns relatos no mundo, disse que na França as parteiras são conhecidas como sages femmes (mulheres sábias). Ela lembrou que no Ocidente as parteiras sempre tiveram muito prestígio, por saberem acompanhar as mulheres no parto. Até 1.560, a profissão era exclusivamente privada e feminina. Um marco da masculinização da obstetrícia foi a determinação de Luis XIV para os médicos acompanharem o parto de seus filhos.

Parteiras

- Quem não nasceu por mim, na sala de parto, passou por mim na sala de vacina - disse Adiles Sebastiana de Sá, conhecida como Irmã Soledade em Santo Antônio do Descoberto, onde se radicou há mais de 40 anos e ajudou a montar a estrutura dos serviços de saúde.

Filha e neta de parteira, ela “partejou” os últimos irmãos. Só mais tarde, estudou, formou-se e fez uma pós-graduação. Os estudos a ajudaram "em alguma coisa", disse ela, "mas não do fundamental".

- Naquela época a gente esquentava a tesoura, hoje esteriliza – lembrou.

Quilombola de Goiás, às vésperas de completar 80 anos, Florentina Santos –  Dona Flor – fez 329 partos desde os 18 anos. Os 18 filhos que teve nasceram sozinhos. Sua sabedoria indica quando encaminhar para os médicos os casos mais graves.

- Nenhuma mulher morreu nas minhas mãos - diz, orgulhosa.

Há algum tempo quebrou o braço direitos e teme não completar os 330 partos. Mesmo sendo analfabeta e tendo passo a vida sem documentos, ela repassa saberes a um grupo de discípulas e guardiãs, entre as quais Daniela Ribeiro de Souza.

Ao lado de Lílian Galvão, do grupo A Parteira Souvenirs, Daniela quer fundar a Escola de Saberes Tradicionais Flor do Moinho, para realizar um sonho de Dona Flor. De acordo com Daniela, “Esses mestres e mestras são os sacerdotes e as sacerdotisas dos saberes tradicionais de nossa humanidade”.

Também participou do encontro a professora Silvéria Santos, parteira, enfermeira obstétrica, professora da Universidade de Brasília (UnB)e escritora, autora de Esse Dom que Deus me Deu: A arte e o ofício das parteiras tradicionais do DF e GO, que destacou a importância do trabalho das parteiras para as famílias que delas necessitam.

Da assessoria da Procuradoria da Mulher

Agência Senado (Reprodução autorizada mediante citação da Agência Senado)

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