Participantes de audiência na CRE alertam para riscos de isolamento da Rússia

Da Redação | 24/04/2017, 23h20

A Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional (CRE) realizou na noite desta segunda-feira (24) a terceira audiência pública do seu ciclo de painéis sobre a atual conjuntura global. O tema do debate foi a Rússia e seu papel na geopolítica mundial.

Segundo os convidados da audiência, as potências ocidentais atuam historicamente para isolar a nação eurasiana e impedi-la exercer uma influência mais ampla sobre blocos de países fora do leste europeu. No entanto, alertaram eles, essa postura tem alimentado uma reação de cunho nacionalista e pode terminar por gerar um efeito oposto ao pretendido.

As análises se concentraram na figura do presidente Vladimir Putin e em seu papel na condução da Rússia através de eventos como a guerra com a Geórgia, em 2008, a anexação da Crimeia e o conflito com a Ucrânia, desde 2014, e a atual crise na Síria. Segundo avaliaram os convidados, esses eventos têm relação com a orquestração ocidental e contribuíram para o fortalecimento da liderança de Putin.

O coronel Marco Antônio de Freitas Coutinho, que foi adido militar do Brasil em Moscou, explicou que no início do século 20, com a revolução bolchevique e a formação da União Soviética, a influência russa na Europa passou a ser contida através de um “cordão sanitário” geopolítico, devido ao temor de que o comunismo se espalhasse pelo continente. Essa postura se manteve ao longo dos anos.

- A teoria da contenção balizou a política americana e de seus aliados ocidentais durante toda a Guerra Fria. Considerar a Rússia como um player europeu não é o desejo das potências ocidentais - disse.

Para o jornalista português Carlos Fino, que trabalhou como correspondente da Rádio e Televisão Portuguesa (RTP) na Rússia durante a dissolução da União Soviética, essa estratégia foi bem-sucedida em dissociar diversas repúblicas do controle de Moscou, mas mesmo assim ela não desmontou a força do país.

- Mesmo depois da redução estratégica a que foi submetida, a expansão russa é incrível. Ainda hoje ela é o maior país do mundo em termos territoriais e continua a ser uma potência em termos populacionais e de riquezas naturais - notou.

Para a professora Lenina Pomeranz, da Universidade de São Paulo (USP), o sentimento interno preponderante entre os russos é pela retomada do protagonismo internacional do país, e o presidente é capaz de encarnar isso.

- O nacionalismo cresceu e Putin é hoje avaliado positivamente por mais de 80% da população, porque ele seria o defensor dos interesses nacionais da Rússia. O “tiro” está dando resultados, mas não os que eram esperados - avalia.

Gustavo Trompowsky Heck, professor da Associação dos Diplomados da Escola Superior de Guerra (Adesg), fez uma comparação para projetar o que significaria a continuidade ou o recrudescimento da política de enfrentamento hoje adotada pelos países da Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan).

- Com o fim da Guerra Fria, houve um total abandono do Ocidente em relação à Rússia. Isso também aconteceu no pós-1ª Guerra Mundial em relação à Alemanha. O que aconteceu? A emergência de uma liderança populista - alertou, traçando um paralelo com a ascensão ao poder de Adolf Hitler e o estabelecimento do III Reich - lembrou.

Os participantes da audiência pública defenderam uma maior aproximação das grandes lideranças ocidentais em relação à Rússia e a construção de uma cooperação internacional que respeite os interesses de todos os lados. No caso da Rússia, segundo explicaram, isso significa a manutenção de bases navais na Crimeia e na Síria. O fim da escalada militar nessas regiões é visto como uma necessidade.

Agência Senado (Reprodução autorizada mediante citação da Agência Senado)