Desertificação é avançada em mais de 20 núcleos do Semiárido, diz especialista

Da Redação | 09/07/2015, 18h07

Em audiência pública no Senado, nesta quinta-feira (9), especialistas alertaram para os riscos de crescente desertificação na região do Semiárido. De acordo com Iêdo Bezerra de Sá, pesquisador da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), mais de 20 núcleos territoriais da região já apresentam alto grau de degradação. Assinalou que a desertificação não resulta apenas das variações climáticas, mas também do peso da ação humana sobre o ambiente.

— Se deixar chegar a esse ponto [desertificação] é quase impossível para se recuperar, porque leva tempo e envolve um custo muito grande – advertiu o pesquisador, defendendo medidas para evitar que mais áreas avancem para o mesmo estágio.

A audiência foi realizada pela Comissão Mista Permanente sobre Mudanças Climáticas. O pedido foi feito pelo presidente do colegiado, senador Fernando Bezerra (PSB-PE), que também dirigiu os trabalhos. Foram exibidas fotografias de propriedades degradadas, onde a cobertura de caatinga praticamente desapareceu. De modo rarefeito, restam cactáceos xique-xiques e arbustos de jurema, espécies endêmicas e mais resistentes da vegetação de caatinga.

— Numa propriedade dessas, uma pessoa pode ter dois mil hectares e passar fome, não terá nenhuma capacidade de sobreviver, pois daí não consegue tirar nada – observou Iêdo.

Ao abrir a reunião, Bezerra festejou aprovação pela Casa, no dia anterior, de projeto de Lei do Senado (PLS 70/2007) que cria a Política Nacional de Combate à Desertificação e Mitigação dos Efeitos da Seca, matéria que já seguiu para sanção presidencial. Tanto ele como os outros parlamentares que participaram da audiência, entre senadores e deputados, destacaram a necessidade de implantação urgente das medidas previstas.

— É importante que essa lei vingue – defendeu o presidente.

Dimensão

O semiárido brasileiro tem cerca de um milhão de hectares, dentro de um polígono que se estende por oito estados do Nordeste e ainda por área do norte de Minas Gerais, envolvendo 1.134 municípios. A área foi delimitada com base em estudos que levaram em conta regiões onde índice pluviométrico apresenta média história até 800 mm por ano. As áreas mais desertificadas já somam 21 mil hectares.

De acordo com os convidados, entre os fatores que mais impactam o ambiente e estimulam a desertificação estaria o tradicional sistema de agricultura itinerante, sem insumos tecnológicos adequados. Depois de duas ou três colheitas, a área é esgotada e abandonada, buscando-se outro local para plantação. Os solos rasos e pobres não resistem a esse modelo produtivo, com avanço da salinização.

Igualmente grave seria a crescente derrubada da caatinga para aproveitamento como fonte de energia. Entre os segmentos industriais que abastecem seus fornos com lenha desse bioma está o siderúrgico. Em Pernambuco, particularmente, há uma indústria gesseira que atende 95% da demanda do país. De acordo com Iêdo, 70% da lenha usada são de origem clandestina da caatinga.

— Isso é um grande crime ambiental – acusou.

Iêdo salientou que há planos e ações para deter a degradação, a começar pelas diretrizes do Plano Nacional de Combate à Desertificação, ligado ao Ministério do Meio Ambiente. Segundo ele, a dificuldade é implementar as ações e envolver todos os elos, inclusive os municípios, “onde as coisas de fato acontecem”.

Assunto de pobre

Antônio Rocha Magalhães, assessor do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI), que atua no Centro de Estudos Estratégicos, detalhou os mecanismos de governança que tratam o tema da desertificação, entre os quais a Convenção de Combate à Desertificação e Mitigação dos Efeitos da Seca (UNCCD), das Nações Unidas. Observou que, em contraste com a Convenção sobre as Mudanças Climáticas, a que trata da desertificação não alcança maior projeção, sem conseguir apoio político e financiamento para estudos.

— Por isso, alguns chamam essa convenção de 'Convenção dos Pobres'. Não é por acaso, pois nas regiões afetadas pelo problema vivem 50% dos pobres do mundo – afirmou.

No Brasil, Antônio Rocha explicou que diversos ministérios se ocupam de diferentes aspectos do tema, mas sem a necessária integração entre eles. Para Antônio Rocha, em parte a deficiência de governança reflete a perda da capacidade de planejamento hoje no país.  A seu ver, é necessário clareza sobre qual órgão deve ser responsável por tratar da questão, além de definição sobre quem deve atuar no nível local.

Fernando Bezerra pediu aos convidados para oferecerem sugestões que possam ser levadas ao governo, no sentido de provocar o interesse dos países mais ricos em políticas e ações de combate à desertificação. Explicou que uma boa oportunidade para tratar do assunto será esse ano em Paris, na nova rodada da Convenção sobre as Mudanças Climáticas.

Diversidade

Vanderlise Giongo, também pesquisadora da Embrapa, reforçou o papel da ação humana no processo de desertificação. Depois, apresentou resultados de estudos desenvolvidos pela Embrapa Semiárido sobre solos, cruzados com dados climáticos, além de informações sobre pesquisas com cultivos que podem contribuir para deter a degradação do Semiárido. Salientou que não é possível um modelo único para toda a região, que apresenta mais de 100 áreas com específicas características ambientais.

Participou ainda Adriano Veturieri, chefe da Embrapa Amazônmia Oriental, que apontou similaridades de problemas enfrentados pelo Semiárido e a Amazônia, como a exploração ilegal de recursos naturais e a ocupação de áreas com atividade agrícola de baixa produtividade. Salientou a realização de trabalho de zoneamento para atividades produtivas sustentáveis.

Agência Senado (Reprodução autorizada mediante citação da Agência Senado)