Ministério Público e pesquisadores defendem manutenção da área da Embrapa Cerrados

Iara Guimarães Altafin | 15/05/2014, 15h45

Se o governo do Distrito Federal (GDF) implementar projeto para construção de conjunto habitacional em parte da área hoje ocupada pela Embrapa Cerrados estará colocando em risco nascentes de importantes bacias hidrográficas e levando à destruição de experimentos desenvolvidos há pelo menos 35 anos no local.

O alerta foi feito pelo Ministério Público e por pesquisadores da Embrapa e da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), durante audiência pública nesta quinta-feira (15) na Comissão de Agricultura e Reforma Agrária (CRA).

A unidade da Embrapa realiza desde 1975 pesquisas em cerca de mil hectares nas proximidades da cidade de Planaltina, no Distrito Federal, e o GDF anunciou que pretende destinar uma parte dessa área, às margens da BR-020, para a construção de moradias para reduzir o déficit habitacional da capital.

Conforme lembrou Cristina Montenegro, promotora de Justiça do Distrito Federal, a região onde está localizada a unidade de pesquisa é denominada Águas Emendadas por concentrar nascentes que dão origem às bacias do Tocantins e do Paraná-Prata.

– Adensar ainda mais a região é fechar os olhos para problemas que a população já enfrenta. Não estamos num jogo de trocar uma coisa por outra. Temos que entrar no jogo de ganha-ganha – disse. Para ela, a manutenção da área com a Embrapa ajuda o governo a preservar os recursos hídricos e a empresa a manter pesquisas para exploração sustentável do cerrado.

Avanços

O chefe-geral da Embrapa Cerrados, José Roberto Peres, e a pesquisadora Ieda Mendes explicaram aos senadores que o local foi escolhido por ser representativo do relevo, solos e vegetação do cerrado. Conforme disseram, os experimentos ali desenvolvidos geraram conhecimentos que viabilizaram o crescimento da produção agropecuária na região central do país.

Desde a criação da Embrapa, frisaram, a área cultivada na região cresceu 31% e a produção cresceu 366%, o que demonstra que a agropecuária avançou a partir de ganho tecnológico.

– Se as terras forem utilizadas para o empreendimento habitacional, vamos perder 35 anos de pesquisa. Essa área é uma memória fidedigna de tudo o que foi feito na agricultura de cerrado. Se formos para outra área, vamos começar do zero – explicou Ieda Mendes.

Para Helena Narder, presidente da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), é preciso proteger esse patrimônio científico e reconhecer que a distribuição de renda no país se deve, em grande parte, ao desenvolvimento da agropecuária, com base em conhecimento gerado pela Embrapa.

Interesse social

Conforme Paulo Valério Silva Lima, da Secretaria de Habitação, Regularização e Desenvolvimento Urbano do GDF, o governo elaborou projeto para construir habitações na parcela porque o Plano Diretor de Ordenamento Territorial indicou a área como de uso urbano e de interesse social.

Ele disse que o empreendimento deverá ocupar 10% da área hoje ocupada pela Embrapa e atenderá a uma população que já vive na região e ainda não dispõe de moradia.

– Estamos falando de uma área que pertence ao conjunto da sociedade do Distrito Federal, que é malha urbana, é zona especial de interesse social. Não se coloca em dúvida a importância da Embrapa ou o mérito do conhecimento gerado, mas estamos debatendo uma área que tem instrumento pactuado com a sociedade – disse.

De acordo com Luciano Nóbrega, da Agência de Desenvolvimento do Distrito Federal (Terracap), o déficit habitacional do DF chega a 450 mil moradias e o governo também está desenvolvendo projetos habitacionais em outras regiões, mas não dispõe de outra área de tamanho semelhante que já não esteja ocupada.

Já Sérgio Gonçalves, da Superintendência do Patrimônio da União no DF, disse acreditar em uma solução negociada, que propicie a regularização das terras ocupadas pela Embrapa.

Falta de bom senso

Para os senadores Rodrigo Rollemberg (PSB-DF) e Ana Amélia (PP-RS), autores do requerimento para realização do debate, a construção de moradias na área da Embrapa Cerrados seria uma demonstração de falta de bom senso do governo do Distrito Federal.

– O que estão querendo fazer com a Embrapa Cerrados, o que estão querendo fazer com a sociedade brasileira nesse caso é uma agressão ao bom senso  - disse Rollemberg.

O senador considerou equivocada qualquer tentativa de colocar em oposição a pesquisa agropecuária realizada pela Embrapa e a construção de moradias, ambas consideradas importantes e relevantes.

Após ouvir os representantes do GDF e concluir que o governo se mantém firme na disposição de fazer o conjunto habitacional, Ana Amélia fez nova tentativa de entendimento, mas também reafirmou sua confiança no Ministério Público e na Justiça.

– Faço um apelo, vamos encontrar um caminho, uma solução. Mas se não houver, que seja o caminho a judicialização – disse a senadora.

Agência Senado (Reprodução autorizada mediante citação da Agência Senado)

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