Conselho de Comunicação se manifesta por fim a restrições para biografias

Patrícia Oliveira | 21/11/2013, 21h10

O Conselho de Comunicação Social do Congresso Nacional entende que é preciso mudar o artigo 20 do Código Civil para proibir a censura prévia hoje aplicada às biografias de pessoas públicas. Esse ponto de vista foi defendido pelo advogado e representante do conselho Ronaldo Lemos nesta quinta-feira (21), em audiência pública realizada no Supremo Tribunal Federal (STF) para debater as biografias não autorizadas.

Os resultados da audiência foram divulgados pelo site do STF.

De acordo com Ronaldo Lemos, o conselho tem parecer de 2012 que recomenda a aprovação do Projeto de Lei nº 393/11, do deputado federal Newton Lima, por entender que a matéria contempla o equilíbrio necessário entre o direito da personalidade e o direito da liberdade de manifestação do pensamento, “além do seu corolário, que é o direito à informação”.

Para o conselho, "a vida humana é um fenômeno complexo, posto que está inserida na história”. Assim, “quanto mais relatos a respeito da trajetória de uma personalidade pública, maior será a precisão alcançada no entendimento daquela trajetória e também menor será a repercussão de alegações infundadas que acabam se diluindo em trabalhos mais bem pesquisados e formulados”. Nas palavras do conselheiro: “Más biografias devem ser respondidas com boas biografias”.

O projeto de Newton Lima explicita de maneira clara que o juiz não poderá determinar o recolhimento ou a obstrução à circulação da obra. Trata‐se de dispositivo em consonância com a jurisprudência da Corte Interamericana de Direitos Humanos.

Ofensas

Se houver a prática de ato ilícito, ressaltou o conselheiro, está prevista indenização, resposta judicial a ser exigida a posteriori. Tudo isso, sem prejuízo de outras sanções. É o caso, por exemplo, da prática de crimes como calúnia, difamação e injúria, que são definidos de forma autônoma no Código Penal.

- A melhor reação a um discurso ou relato considerado problemático é a resposta a ele na esfera pública. Em vez de supressão ou tolhimento, mais discursos, mais versões, mais contraditório. Essa é a praxe saudável de uma sociedade que se governa sob um Estado Democrático de Direito - assinalou o advogado.

Além do PL 393/11, o conselho analisou outros dois projetos de lei em tramitação na Câmara do Deputados: o 395/2011, da deputada Manuela D’ávila (PCdoB-RS), e 1422/2011, do deputado Otávio Leite (PSDB-RJ).

O conselheiro apontou os obstáculos jurídicos que sujeitam autores, editores, websites a "uma grande insegurança e temor quanto às consequências do ato de biografar".

Ao comparar a rigidez da legislação brasileira com a de outros países democráticos, onde não há proibição semelhante, ele citou o caso dos Estados Unidos, onde o cantor Michael Jackson e o próprio presidente Barack Obama têm, cada um, cerca de 150 biografias diferentes.

- É necessário encontrar posição de equilíbrio que permita tanto o exercício dos direitos fundamentais referentes à liberdade de expressão e acesso à informação quanto os direitos fundamentais que protegem a personalidade do indivíduo - advertiu Lemos.

Audiência

Participaram do debate no STF 17 expositores, entre editores, escritores, parlamentares e representantes de entidades como a Academia Brasileira de Letras, o Ministério da Cultura, a Universidade Federal do Rio de Janeiro e a Comissão de Direito Autoral da OAB-SP.

As biografias não autorizadas estão em discussão na Ação Direta de Inconstitucionalidade (Adin) 4815, ajuizada pela Associação Nacional dos Editores de Livros (Anel) e que tem como relatora a ministra Cármen Lúcia. Por meio da Adin, a entidade requer a declaração de inconstitucionalidade parcial, sem redução de texto, dos artigos 20 e 21 do Código Civil (Lei 10.406/2002).

Conforme a Anel, os dispositivos seriam incompatíveis com a liberdade de expressão e de informação previstos na Constituição.

Polêmica

Com base nessa lei, em 2007, o cantor Roberto Carlos proibiu a circulação da biografia “Roberto Carlos em Detalhes”, escrita pelo jornalista Paulo Cesar Araújo. A obra chegou a ser lançada, mas teve toda a tiragem recolhida das livrarias. À época, a atitude do artista foi alvo de críticas por partes de diversos autores, entre eles, o escritor Paulo Coelho.

Enquanto isso, artistas como Caetano Veloso, Chico Buarque e Gilberto Gil também têm se manifestado contra a publicação de biografias não autorizadas. Chegaram a criar, com Roberto, e sob a coordenação da produtora Paula Lavigne, a associação Procure Saber.

As discussões seguem dividindo a classe artística. Recentemente, foi direcionada a Caetano Veloso uma carta aberta do americano Benjamin Moser, biógrafo de Clarice Lispector, na qual condena a postura do cantor.

Agência Senado (Reprodução autorizada mediante citação da Agência Senado)

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