Concebida para funcionar como centro agregador de ações, a Casa da Mulher Brasileira tem levado esperança aos que lutam pelo fim da violência doméstica contra a mulher. O lugar revoluciona o atendimento por integrar, num mesmo espaço, diversos serviços especializados, como delegacia e juizado; Ministério Público; Defensoria Pública; apoio psicossocial; promoção da autonomia econômica; brinquedoteca para os filhos das vítimas; alojamento de passagem; e central de transporte. Esse modelo evita a peregrinação da mulher por várias repartições, roteiro capaz de ressuscitar a experiência psíquica do trauma.
O ambiente arejado da Casa contribui de imediato para a recuperação do bem-estar das vítimas, segundo Thais Marques, da equipe de coordenação da unidade de Brasília, onde, desde junho de 2015, já foram atendidas 800 mulheres, num total de 3 mil ações. Como o local ainda não funciona 24 horas por dia, o alojamento de passagem tem utilização restrita.
Além da Casa de Brasília, inaugurada com a presença da presidente Dilma Rousseff, há outra em Campo Grande. Durante audiência no Senado, a secretária de Enfrentamento à Violência da Secretaria de Políticas para as Mulheres (SPM), Aparecida Gonçalves, informou que mais seis estão em construção em Boa Vista, Curitiba, Fortaleza, São Luís, São Paulo e Salvador. Ela citou o “excesso de burocracia” entre os empecilhos à instalação desse serviço nas capitais restantes.
Superar entraves administrativos foi o que fizeram em 28 de março a subsecretária de Políticas para as Mulheres do Distrito Federal, Lúcia Bessa, e a coordenadora da Casa de Brasília, Iara Lobo, ao discutirem com representantes do Programa Nacional de Ensino Técnico (Pronatec) formas de levar ao local cursos destinados a capacitar vítimas e libertá-las do jugo econômico de seus companheiros.
Lúcia Bessa usa a palavra “sonho” para definir a Casa e conclama mais mulheres a procurarem atendimento ali. Apesar da localização muito próxima ao centro da capital, na Quadra 601 Norte, o espaço está subutilizado. As explicações para esse fato são o relativo desconhecimento da população sobre a existência da Casa, a resistência maior da classe média a se expor, apesar da situação resguardada do lugar, e a capilarizada rede de serviços de atendimento à mulher no DF.
Tanto a Casa de Brasília quanto a de Campo Grande, inaugurada em fevereiro de 2015, foram construídas com recursos do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC 2). A de Brasília, com 3.671 metros quadrados, custou R$ 7,9 milhões. Mais R$ 877,6 mil foram investidos em mobiliário e eletrodomésticos. A de Campo Grande teve investimento de R$ 18,2 milhões (R$ 7,8 milhões para a construção e o restante para custeio e aparelhamento).
Banalização
Por enquanto, as Casas da Mulher estão vinculadas à Secretaria de Políticas para as Mulheres, mas serão repassadas em algum momento ao Governo do Distrito Federal e à Prefeitura de Campo Grande.
Iara Lobo defende a concentração de recursos nesses espaços pelo potencial que têm de atingir um grande público e resolver vários problemas ao mesmo tempo. Ela avalia positivamente as políticas públicas para o enfrentamento da violência contra as mulheres e os resultados de leis como a Maria da Penha e a do feminicídio. “Não estamos enxugando gelo. É que as mudanças são lentas mesmo. Termos os homens de mãos dadas pode acelerar esse ritmo.” Iara assinala que a violência doméstica está presente em todas as classes sociais. Além do machismo, o uso de álcool, pobreza e outros tipos de vulnerabilidade aumentam as chances de uma agressão.
Para o agente de polícia Sérgio Canguçu, que trabalha no discreto posto da Delegacia da Mulher da Casa, a concepção do local dá conforto e privacidade às vítimas. Sua experiência como policial, porém, o fez ver que, além do universo específico de algumas políticas públicas, o país precisa mudar quanto a valores: “A banalização da violência e a pouca responsabilização pessoal são assustadoras. Nos acostumamos a achar que o mal está só no que os outros fazem”.
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