Sem vontade política, Brasil recicla apenas 3% do lixo urbano

Iara Guimarães Altafin | 23/04/2014, 15h24

Apenas 3% dos resíduos sólidos produzidos nas cidades brasileiras são reciclados, apesar de 1/3 de todo o lixo urbano ser potencialmente reciclável. E mesmo o reaproveitamento desse pequeno volume só é viabilizado pelo esforço de catadores, que enfrentam a falta de apoio do poder público e o desconhecimento da população quanto à separação do lixo.

A situação foi apresentada em debate nesta quarta-feira (23) na Subcomissão Temporária de Resíduos Sólidos, ligada à Comissão de Meio Ambiente, Defesa do Consumidor e Fiscalização e Controle (CMA).

Conforme Carlos Roberto Vieira Filho, diretor da Associação Brasileira de Empresas de Limpeza Pública e Resíduos Especiais, o país produz 63 milhões de toneladas de resíduos sólidos por ano, sendo o quinto maior gerador de lixo urbano.

O diretor conta que o brasileiro produz 383 quilos de lixo per capta por ano, volume que cresceu 21% nos últimos dez anos, enquanto a população brasileira aumentou 9,6% no mesmo período. Carlos Roberto informou que 60% dos municípios brasileiros têm “alguma iniciativa” de coleta seletiva.

– No entanto, isso não significa que tenham coleta seletiva em todo o território ou que tenham programa formalizado porta a porta, mas apenas que o município está aberto ao tema – observou.

A distância entre a teoria e a prática foi exemplificada por Roney Alves da Silva, representante do Movimento Nacional dos Catadores de Materiais Recicláveis. Conforme afirmou, o material proveniente da coleta seletiva em Brasília é despejado em lixões e lá os catadores fazem a coleta do material a céu aberto e sem estrutura adequada.

– Coleta seletiva não é só pintar o caminhão de verde. É a população separar seus resíduos em casa e, em dias alternados, recolher os secos e os orgânicos, destinar os perigosos para pontos de coleta específicos e assim por diante. Infelizmente isso não aconteceu. Hoje a coleta seletiva vai para o Lixão da Estrutural, onde o material é separado pelos catadores, se houver chuva, na chuva, e se houver sol, é no sol – disse.

Comunicação com a população

Além da falta de vontade política, Carlos Roberto apontou, entre os obstáculos ao avanço da reciclagem no país, a falta de uma cultura de valorização da prática na sociedade brasileira. Ele sugeriu programas permanentes de esclarecimento e incentivos à separação do lixo e punições para descarte de materiais recicláveis no sistema regular de limpeza urbana.

Sugeriu ainda que a taxa para coleta seja proporcional à geração de resíduos.

– Aquele que mais gerar lixo deve custear o sistema, pela taxa do poluidor pagador – opinou.

Já a representante do Ministério do Meio Ambiente, Zilda Veloso, apontou a necessidade de integração dos atores envolvidos na logística reversa, que é “a restituição dos resíduos sólidos ao setor empresarial para o reaproveitamento, em seu ciclo ou em outros ciclos produtivos, ou outra destinação final ambientalmente adequada”.

Ela aponta como corresponsáveis na logística reversa não apenas os consumidores e os fabricantes e comerciantes, mas também o órgão público responsável pelos serviços de manejo de resíduos sólidos e os catadores.

– São muitos atores envolvidos, mas precisamos trabalhar para pensar antes de descartar e reduzir a geração de lixo – frisou Zilda Veloso.

O papel dos catadores no processo foi destacado por José Antônio da Mota Ribeiro, da Fundação Nacional de Saúde (Funasa). Conforme informou, existem no país cerca de 500 mil catadores de materiais recicláveis, mas apenas 10% desse contingente participa de alguma das 1.100 associações existentes.

Ribeiro apresentou ações do governo federal de apoio à organização produtiva dos catadores, destacando o financiamento de instrumentos para triagem de materiais e de veículos usados na coleta de materiais.

No debate, o senador Cícero Lucena (PSDB-PB), que preside a subcomissão, manifestou preocupação com a restrição de recursos públicos previstos este ano para a gestão de resíduos sólidos.

– É o menor orçamento do governo federal dos últimos anos, insuficiente para cumprir a lei que nós aprovamos e que foi sancionada pelo governo – disse, ao se referir à Lei 12.305/2010, que instituiu a Política Nacional de Resíduos Sólidos.

Ao final do debate foi aprovado requerimento para realização de audiência pública sobre o custeio da política de logística reversa e a tributação no setor de resíduos sólidos.

– Precisamos discutir essas questões, pois nos debates que temos promovidos tem sido dito que, muitas vezes, a matéria prima virgem é mais barata que a reciclada, em função da bitributação e dos custos que isso representa  – afirmou Cícero Lucena.

Agência Senado (Reprodução autorizada mediante citação da Agência Senado)

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