Senado discute propostas para enfrentar desinformação
Do Marco Civil da Internet à aprovação da proposta contra a adultização infantil, o Senado Federal vem debatendo questões que envolvem o ambiente digital com o olhar voltado para o futuro, preocupado com a desinformação e seus efeitos sobre as instituições públicas e democráticas.
A aprovação do Marco Civil da Internet (Lei 12.965/2014), em 2014, foi um avanço importante no debate e aprovação de propostas legislativas para enfrentar a desinformação, embora sem tratar diretamente do fenômeno das fake news. A lei estabeleceu princípios para o uso da internet no país, como liberdade de expressão, proteção de dados e responsabilidade das plataformas.
O PL 2.630/2020, conhecido como Lei das Fake News, é outro marco no debate sobre o combate à desinformação. O projeto exige transparência das redes sociais, prestação de contas sobre moderação de conteúdo e, mais uma vez, a responsabilização das plataformas. Foi aprovado pelo Senado em 2020 e continua em tramitação na Câmara dos Deputados.
Em agosto de 2025, o Senado deu mais um passo: aprovou o projeto contra a adultização infantil, que estabelece regras para a proteção de crianças e adolescentes em ambientes digitais.
Autor do PL das Fake News e do PL contra a adultização, o senador Alessandro Vieira (MDB-SE) diz que “o Brasil precisa enfrentar com seriedade o desafio da desinformação”. Segundo ele, “o ambiente digital não pode continuar funcionando como uma terra sem lei, onde conteúdos nocivos circulam sem controle e sem responsabilidade". Ele defende ser urgente avançar em uma legislação que dê segurança para todos.
Desinformação em saúde
Durante a pandemia de covid-19, quando circularam boatos sobre vacinas e tratamentos, surgiram propostas que vão desde a responsabilização de plataformas digitais até a criação de regras para o uso ético de inteligência artificial (IA). A CPI da Pandemia apresentou, em 2021, propostas para coibir a criação e a disseminação de notícias falsas por meio da internet e para criminalizar a criação e divulgação de notícias falsas, especialmente em casos envolvendo a saúde pública.
Inteligência artificial
Em 2024, o Senado aprovou o projeto que regulamenta a inteligência artificial (IA) no Brasil (PL 2.338/2023), resultado de um longo período de debates. O texto trata de temas como conceitos, compreensão e classificação de inteligência artificial; impactos da inteligência artificial; direitos e deveres; prestação de contas, governança e fiscalização. A matéria está em análise na Câmara dos Deputados.
A discussão começou em março de 2022, na comissão de juristas criada pelo então presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG). A comissão recebeu contribuições de vários setores da sociedade e promoveu sessões públicas e reuniões de trabalho, além de um seminário internacional, para consolidar o anteprojeto apresentado nove meses após o início dos trabalhos.
Antes de ser votado pelo Plenário, o texto foi analisado também por uma comissão temporária que, durante quatro meses, realizou 14 audiências públicas com a participação da sociedade civil, representantes de órgãos públicos e da iniciativa privada, além de especialistas em tecnologia e inovação.
Para o autor da proposta, senador Rodrigo Pacheco (PSD-MG), a análise desse projeto foi uma das decisões mais importantes do Senado, em 2024, por dialogar diretamente com decisões e entendimentos do Supremo Tribunal Federal (STF).
Fake news e crime eleitoral
Também em 2024 o Congresso Nacional debateu o veto apresentado pelo então presidente Jair Bolsonaro, que impediu a punição para quem espalha fake news durante as eleições. Essa possibilidade estava prevista no texto do Projeto de Lei 2.108/2021 que gerou a Lei 14.197, de 2021 e que revogou a Lei de Segurança Nacional (Lei 7.170, de 1983). De acordo com o texto original, a tipificação de crimes contra o Estado democrático incluía a criminalização das fake news durante o período eleitoral. O veto (46/2021) foi mantido pelo Congresso.
Mas esse tipo de crime não fica sem punição no Brasil. O Código Eleitoral (Lei nº 4.737/1965) e resoluções do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) incluem dispositivos que proíbem a propagação e o impulsionamento de conteúdos que desinformam ou criam estados mentais ou emocionais prejudiciais para a tomada de decisão pelo eleitor. Como punição, o crime pode resultar em prisão ou multa. A pena pode ser aumentada se o crime for cometido por meio de comunicação, pela internet ou rede social ou se for transmitido em tempo real.
Regulação de redes sociais
A crescente preocupação com os impactos das redes sociais na democracia, na infância e na vida das pessoas tem levado o Senado Federal a propor projetos para regulamentar o uso das plataformas digitais.
Especialistas e autoridades defenderam a regulamentação das redes sociais durante debate realizado pelo Conselho de Comunicação Social (CCS) do Congresso Nacional, alertando que a regulação passa por usuários, modelo econômico e Marco Civil da Internet.
O Senado também acompanhou decisão recente do Supremo Tribunal Federal (STF) sobre o Marco Civil da Internet. Pela manifestação do STF, as redes sociais deverão ser responsabilizadas por postagens criminosas ou ofensivas de seus usuários. O STF entendeu que as regras vigentes hoje — remoção só com decisão judicial — não são suficientes para preservar a dignidade das pessoas e estabeleceu como se dará essa responsabilização das redes. A decisão deve ser aplicada até que o Congresso Nacional atualize a legislação.
A decisão repercutiu no Senado. Em entrevista para a Rádio Senado, o senador Humberto Costa (PT-PE) afirmou, na ocasião, que “responsabilizar as plataformas é fundamental para conter a crescente disseminação de conteúdos falsos, discursos de ódio, fraudes e violência nas redes sociais”. Ele avaliou que não se trata de censura, mas de “proteger a vida, a segurança e a própria democracia brasileira”.
Já o senador Eduardo Girão (NOVO-CE) entende que o STF invadiu a competência do Congresso Nacional ao reinterpretar uma norma aprovada pelo Legislativo em 2014 que protege a liberdade de expressão e impede a censura nas plataformas digitais. Para ele, a censura foi institucionalizada no Brasil pelo STF.
Adultização
Em meio ao acirramento do debate público sobre a exposição infantil nas redes sociais, o Congresso Nacional retomou com urgência a apreciação do PL 2628/2022, conhecido como PL contra a Adultização ou ECA Digital, de autoria do senador Alessandro Vieira (MDB-SE). A proposta ganhou novo fôlego em agosto de 2025 após a repercussão nacional do vídeo “Adultização”, produzido pelo influenciador Felca, que denunciou práticas de exploração infantil promovidas ou toleradas por redes sociais e plataformas de vídeo.
O impacto foi imediato: mais de 40 milhões de visualizações em poucos dias, mobilizações on-line, protestos em frente ao Congresso e uma série de manifestações de artistas, juristas e organizações de proteção à infância.
O PL 2628/2022 havia sido aprovado pelo Senado em 2022, mas aguardava deliberação na Câmara dos Deputados. Sob intensa pressão popular, a Câmara aprovou substitutivo ao projeto em agosto de 2025. O texto voltou ao Senado, onde foi rapidamente pautado e aprovado uma semana depois, consolidando-se como uma das legislações digitais mais abrangentes do mundo no que se refere à proteção de menores. A proposta foi sancionada e aLei 15.211 publicada no Diário Oficial da União.
Frente parlamentar
Uma frente de senadores e deputados federais deverá ser criada no Congresso para manter um fórum permanente de debates no legislativo federal. A ideia da Frente Parlamentar Mista da Inteligência Artificial, Tecnologia da Informação, Segurança Cibernética e Combate à Desinformação — também chamada de Frente Parlamentar da Segurança Digital, — é do senador Angelo Coronel (PSD-BA).
— Como a tecnologia avança mais rápido que a legislação, esse espaço contínuo para ideias, discussões e audiências com especialistas oferece aos parlamentares mais subsídios para enfrentar os desafios regulatórios de um setor cada vez mais fundamental no espaço público — esclarece o senador.
A instalação da frente depende da aprovação do Projeto de Resolução que está em análise pela Comissão de Comunicação e Direito Digital (PRS 93/2023).
| >>Veja aqui as propostas, seus objetivos e o estágio atual de tramitação.<< |
