Voto feminino faz 90 anos, mas mulheres alertam que desigualdade ainda é grande
Mais de 77 milhões de brasileiras devem votar nas eleições de outubro. Mas nem sempre as brasileiras tiveram o direito de escolher seus representantes. Instituído no Brasil há 90 anos, em 24 de fevereiro de 1932, o voto feminino é um importante marco na luta das mulheres por igualdade de direitos com os homens.

Transcrição
MAIS DE 77 MILHÕES DE BRASILEIRAS DEVEM VOTAR NAS PRÓXIMAS ELEIÇÕES, EM OUTUBRO.
MAS NEM SEMPRE AS BRASILEIRAS TIVERAM O DIREITO DE ESCOLHER SEUS REPRESENTANTES. O VOTO FEMININO NO BRASIL FOI INSTITUÍDO HÁ APENAS 90 ANOS, EM 24 DE FEVEREIRO DE 1932.
AQUELA CONQUISTA NÃO FOI O FINAL E SIM UM IMPORTANTE MARCO DA LUTA DAS MULHERES POR DIREITOS IGUAIS COM OS HOMENS.
CONFIRA A HISTÓRIA DA APROVAÇÃO DO VOTO FEMININO NO BRASIL NESTA REPORTAGEM DE ADRIANO FARIA. A PRODUÇÃO É DE ANA BEATRIZ SANTOS E WANESSA ALVES. E A SONORIZAÇÃO, DE ANTÔNIO CARLOS SOARES:
"Caía a tarde feito um viaduto /// E um bêbado trajando luto /// Me lembrou Carlitos..." (cai aqui pra BG)
Elas representam 53 por cento do eleitorado brasileiro: 77 milhões e oitocentas mil mulheres estão registradas na Justiça Eleitoral para votar. Muitas delas vão fazer isso pela primeira vez em outubro de 2022. É o caso de Estela. Adolescente de 17 anos, a estudante mistura sentimentos como orgulho, ansiedade e até um certo nervosismo:
Eu me sinto bastante orgulhosa, sabe? É um grande passo para a minha vida adulta, e eu sinto que é uma grande responsabilidade. Ao mesmo tempo,confesso que eu sinto uma leve insegurança, não somente por ser a primeira vez votando, mas também por causa de toda essa polarização que tem ao redor da política no Brasil. Mas é exatamente por conta disso que eu me sinto no dever de votar.
Luíza tem 18 anos e também é estudante. O ambiente de eleição, voto e urna não é estranho pra ela. Mas, na próxima vez que ela for à seção eleitoral, em outubro, vai ter algo novo: um voto pra chamar de seu:
Votar com certeza vai ser uma experiência nova para mim, mas que eu venho esperando que aconteça há muito tempo. Porque eu sempre acompanhei a minha família no dia de eleição, e eu sempre achei o máximo essa ideia de fazer uma escolha ativamente com minhas próprias mãos: de fazer uma escolha que pode mudar o futuro de um país inteiro.
Estela e Luíza vão se juntar a outras mulheres que já votam em nosso país — algumas há muito tempo. Uma delas é Paraguassu Abrahão, de 90 anos. Não se atreva a dizer pra ela que o voto no Brasil é obrigatório até os 70 anos e que não precisa mais votar. Essa ideia não passa pela cabeça da veterana de muitas eleições, que é só empolgação quando fala do próximo encontro dela com a urna:
Eu acho que meu voto vai somar, representando o que quero para meu país.
Os 90 anos de dona Paraguassu coincidem com uma data marcante para as mulheres brasileiras: a conquista do direito ao voto. Em 24 de fevereiro de 1932, um decreto do então presidente Getúlio Vargas criou o Código Eleitoral e, com ele, novidades para a época, como a Justiça Eleitoral, o voto secreto e o voto feminino. Foi uma luta de pelo menos 100 anos. Já em 1831, ainda no Império, a proposta de permitir o voto de mulheres em eleições locais foi recusada pela Assembleia Geral Legislativa, formada só por homens. A monarquia caiu, veio a República, e o voto para as mulheres ainda demoraria mais de 40 anos para ser implantado – e mesmo assim depois da insistência de figuras como a professora Maria Lacerda de Moura e a bióloga Bertha Lutz, que, nos anos 20, fundaram a Liga para a Emancipação Internacional da Mulher. O objetivo? A igualdade política das mulheres. Em um país em que hoje as mulheres são maioria entre os eleitores, pode causar espanto que o direito ao voto por muito tempo tenha ficado restrito aos homens. Enilda Costa, de 80 anos e que votou pela primeira vez na eleição presidencial de 1960, não esconde o espanto e a indignação:
Como assim, a mulher não poder participar de uma coisa tão importante?! Tem que ter o voto da mulher! Como não?!
O 24 de fevereiro de 1932 entrou para a História como o dia em que o direito ao voto passou a ser uma possibilidade para as mulheres em todo o País. Mas algumas brasileiras já tinham obtido essa conquista alguns anos antes. O Rio Grande do Norte foi pioneiro no voto feminino no Brasil, como explica a senadora potiguar Zenaide Maia:
Em 1928, já teve o voto porque o governador do Rio Grande do Norte, Juvenal Lamartine, introduziu na Constituição do estado o direito ao voto das mulheres. É tanto que a professora Celina Guimarães, de Mossoró, foi a primeira mulher a votar no Brasil. E nós tivemos também a primeira mulher eleita prefeita da América Latina, que foi Alzira Soriano, em 1928.
Líder da bancada feminina no Senado, a senadora maranhense Eliziane Gama comemora os 90 anos do voto das mulheres no Brasil, mas alerta que a luta das brasileiras pelo espaço que têm direito na política não pode parar:
Essa foi uma grande conquista da mulher brasileira. Nòs temos muito ainda a conquistar, mas jamais temos de deixar de reconhecer o que conseguimos até agora.
(Sobe aqui) "Chora a nossa pátria, mãe gentil // Choram Marias e Clarices no solo do Brasil" (cai aqui pra BG)
"Marias", "Clarisses", mas também "Berthas", "Celinas", "Alziras", "Paraguassus" e "Enildas" são algumas personagens da participação das mulheres na história política brasileira. Para a senadora Eliziane Gama, os 90 anos do voto feminino no Brasil incentivam uma reflexão: a maioria do eleitorado brasileiro ainda é minoria na representação política:
Não há dúvida nenhuma que temos muita coisa a conquistar. Porque, muito embora nós tenhamos o direito a voto e o direito a ser votada, nós ainda somos minoria absoluta. Nossa posição em nível mundial é uma posição muito vergonhosa. Então nós precisamos mudar esse quadro com a presença muito mais forte da mulher nos parlamentos brasileiros e também no Poder Executivo brasileiro.
Na expectativa de votar pela primeira vez em 2022, Luíza, de 18 anos, vê a sua participação nas eleições como uma forma de reconhecer o que fizeram outras gerações de mulheres:
Eu posso votar hoje em dia porque milhares de mulheres que vieram antes de mim lutaram para isso fosse possível. E eu sou extremamente agradecida por isso.
As eleitoras que votam há décadas também exaltam a conquista do voto pelas mulheres. Com a palavra, dona Paraguassu, que fala com a autoridade de uma eleitora de 90 anos, a mesma idade do voto feminino no Brasil:
As mulheres são a maioria deste país: trabalham, produzem, criam os filhos... Naturalmente elas têm o direito de escolher o melhor para nosso país.
Com produção de Ana Beatriz Santos e Wanessa Alves e sonorização de Antonio Carlos Soares, da Rádio Senado, Adriano Faria.
(Sobe aqui) "Azar /// A esperança equilibrista /// Sabe que o show de todo artista /// Tem que continuar" (Até 3'14")