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Sonhos que ficaram para trás

Nelson Oliveira
Publicado em 24/4/2020

Inaugurada há 60 anos, em um tempo de especial otimismo, Brasília foi não só o momento mais glorioso na trajetória da arquitetura moderna brasileira, mas o desafio que provou ao máximo a capacidade de realização de um povo.

A ousadia do projeto, o prazo curto para concretizá-lo, as limitações orçamentárias e os obstáculos políticos conferiram o caráter de epopeia ao período compreendido entre 1956 e 1960, com alguns repiques até o início dos anos 70. Brasília, entretanto, foi precedida de ensaios envolvendo profissionais que a desenhariam e a ergueriam dentro de um mesmo modelo de contratação por governantes do tipo desenvolvimentistas.

Na aventura fabulosa iniciada ainda nos anos 30 do século 20, além de traçados urbanos incomuns e palácios de beleza rara, saltaram das pranchetas de arquitetos aquelas edificações que redimiriam as classes pobre e média das dificuldades de encontrar moradia digna a custo baixo. As soluções para o déficit habitacional, além dos desenhos, estavam no modo de fabricação, com concreto ou  argamassa armada, componentes pré-fabricados e outros materiais e processos econômicos.

O que essas iniciativas buscavam era uma replicação que não parecesse reproduzir monotonamente, aos milhares, cubículos sem identidade e desassistidos de equipamentos públicos, como praças, escolas, unidades de saúde e comércio — em tudo ausentes de vida social e cultural. Ademais, sem conexão com o restante da cidade por meio de transporte público. A melhoria da mobilidade para o pedestre fez parte igualmente do sonho modernista, mas foi outro aspecto do urbanismo brasileiro que vive de experiência isoladas, muitas vezes vítimas de cruel abandono.

O ambiente revolucionário da Universidade de Brasília (UnB) chegou a ser o laboratório de alguns projetos de construção a baixo custo, no qual se realizou a primeira experiência com pré-moldados no Brasil. Contudo, a perseguição da ditadura militar a tudo o que cheirasse a socialismo impediu que esse sonho continuasse.

O país ficou então sem cidades-parque, expulsou a população de baixa renda para periferias cada vez mais distantes e fechou a classe média em condomínios ou prédios com atrativos antes só acessíveis aos ricos.

 Edifício Gustavo Capanema — Rio de Janeiro (RJ)

Marco da arquitetura moderna no Brasil, o Palácio Gustavo Capanema, edifício construído ainda na Era Vargas como sede do então Ministério da Educação e Saúde, no Rio de Janeiro, resultou do trabalho conjunto de arquitetos liderados por Lúcio Costa: Affonso Eduardo Reidy, Carlos Leão, Jorge Moreira , Ernani Vasconcellos e Oscar Niemeyer. Todos sob a supervisão do mestre inspirador do modernismo brasileiro, o franco-suíço Le Corbusier.

Depois de rejeitar projetos de feições mais tradicionalistas, o ministro Gustavo Capanema encomendou o projeto a Lúcio Costa.

Conforme a Enciclopédia Itaú Cultural, o resultado “reflete a tentativa do grupo brasileiro de incorporar os preceitos racionais da arquitetura corbusiana: a adoção de formas simples e geométricas, o térreo com pilotis, os terraços-jardim, a fachada envidraçada, as aberturas horizontais, a integração dos espaços interno e externo, o aproveitamento da ventilação e luz naturais por meio do uso de lâminas móveis e o trabalho com volumes puros, a partir do cruzamento de um corpo horizontal e de um vertical”.

Mas o grupo brasileiro introduziu no “léxico do racionalismo arquitetônico internacional” ingredientes e soluções que faziam parte das experiências da chamada  “escola carioca”, entre as quais, segundo o historiador Yves Bruand, podem ser mencionados “o dinamismo e a leveza do conjunto e a forte integração entre arquitetura, paisagismo e artes plásticas”. O projeto destaca-se por utilizar, pela primeira vez no mundo, fachada em vidro voltada à face menos solarizada (curtain wall). Foi pioneiro também no emprego do brise-soleil (quebra-sol)  em larga escala, depois de sua criação três anos antes por Le Corbusier e sua utilização no prédio da Associação Brasileira de Imprensa (ABI), de 1936, e na Obra do Berço (1937), escola maternal em Botafogo, da autoria de Niemeyer).

Outro destaque do Palácio Capanema é o paisagismo de Roberto Burle Marx.

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Foto: Tomaz Silva/Agência Brasil

 Grande Hotel de Ouro Preto — Ouro Preto (MG)

Com a autorização do presidente Getúlio Vargas e o apoio do Serviço de Proteção ao Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (SPHAN), a prefeitura de Ouro Preto decidiu em 1938 construir um hotel para estimular o turismo e superar as dificuldades econômicas causadas pela crise na mineração. Tombada pelo órgão naquela mesmo ano, a cidade já era Monumento Nacional desde 1933.

Rodrigo Mello Franco, diretor do SPHAN, primeiramente entregou o projeto ao arquiteto Carlos Leão, que apresentou um desenho bastante condizente com o casario de Ouro Preto, ao utilizar traços neocoloniais, o que desagradou o próprio SPHAN, já então inclinado a soluções modernas.  Com a consultoria de Lucio Costa, o projeto, em terreno não antes edificado, acabou sendo entregue a Oscar  Niemeyer. Este, nitidamente influenciado por Le Corbusier, chegou a um resultado muito contrastante com a paisagem oitocentista, que foi posteriormente adaptado, resguardando-se o ponto de vista de Costa a favor de estabelecer articulações entre as arquiteturas colonial e arquitetura moderna, em acordo com os ditames dos Congressos Internacionais de Arquitetura Moderna (Ciam).

Assim nasceu aquele que pode ser considerado o primeiro hotel da arquitetura moderna brasileira, na Rua das Flores. O terreno ganhou aterros e muros de contenção para compensar sua topografia. O diálogo com a paisagem em volta não é estridente em razão do espaço generoso, que lhe deu ainda um aspecto de monumentalidade presente em outras construções da cidade. Considerando o estilo do projeto, a natureza do processo de implantação, com a interferência do  SPHAN, e a discussão que se travou então, trata-se de um novo paradigma para o movimento moderno no Brasil, alinhado com as posições teóricas de Lúcio Costa simpáticas a articular tradição e modernidade. De linhas leves, o edifício, predominantemente em concreto armado, tem cinco pavimentos, pátio com pé direito duplo, pilotis, varandas, e incorpora sutilmente ingredientes tradicionais, como o telhado cerâmico, madeira nas vedações e muxarabis (treliças mouriscas) em azul nas varandas, além de empenas (paredes) laterais brancas e cegas.

No panorama de Ouro Preto (...), o hotel (...) coaduna-se bem com o ambiente oitocentista. Por motivos lógicos  não se esqueceram a inclinação do telhado e o uso da pedra de Itacolomi. O desenho, de linhas ousadas e  pormenores delicados, ostenta bem orientada relação com o barroco local Philip Lippincott Goodwin, 1943, para o catálogo Brazil Buids)

Fonte: Ricardo Alexandre Paiva, Lilian Vidal Freitas e Rívia Nobre Feitoza, em Patrimônio urbano, paisagens culturais e meio ambiente turismo, arquitetura moderna e patrimônio: o Grande Hotel Ouro Preto (1938) e o Hotel Tijuco (1951), em Minas Gerais.

Foto: Zonda Bez

 Conjunto arquitetônico da Pampulha — Belo Horizonte (MG)

Composto pela Casa do Baile (desativada), um Cassino (hoje Museu de Arte), o Iate Clube e a Igreja de São Francisco, o conjunto arquitetônico da Lagoa da Pampulha foi projetado por Oscar Niemeyer nos primeiros anos da década de 40, a convite do então prefeito de Belo Horizonte, Juscelino Kubitschek. Sua inauguração se deu em 1943, com a presença do presidente Getúlio Vargas.

Posteriormente, às margens da mesma lagoa, Niemeyer projetaria uma residência de veraneio para o prefeito.

Parte do plano de JK para modernizar a capital mineira, que incluiu a cidade universitária e o distrito industrial, o complexo da Pampulha tinha como objetivo ser um centro de lazer de luxo. Trabalharam com Niemeyer o calculista Joaquim Cardoso e o paisagista Roberto Burle Marx. Cada edifício é independente, mas interligado aos demais.

Na Igreja de São Francisco, considerada a obra-prima do conjunto, o arquiteto lançou mão de nova solução construtiva: “não mais a estrutura independente, com lajes de concreto apoiadas em pilares, de acordo com o léxico arquitetônico racionalista, mas uma abóbada parabólica de concreto armado, estrutura até então só empregada em obras de engenharia como o hangar de aviões do aeroporto de Orly, em Paris”, explica o site do Conselho de Arquitetura e Urbanismo do Brasil (Cau-BR).

A abóbada na capela da Pampulha é, a um só tempo, estrutura e fechamento, o que dispensa alvenaria. Dá início, portanto, ao que seria a diretriz da obra de Niemeyer dali pra frente: uma arquitetura orientada principalmente pela plasticidade da estrutura de concreto armado em prol da ousadia da forma, do inusitado, do marcante, que triunfa de forma grandiosa em Brasília

Louvadas por artistas e arquitetos, as linhas curvas e modernas da igreja escandalizou a sociedade provinciana da época e em especial as autoridades eclesiásticas. Por muitos anos, não foi permitida a consagração da capela, inclusive em razão do hoje célebre painel em azulejos de Portinari, no qual figura um cão no lugar do lobo que ladeia São Francisco de Assis.

Em 2016, o conjunto foi declarado patrimônio Cultural da Humanidade pela Unesco.

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 Fotos: Reprodução/Iepha-MG, Hugo Martins, Cláudio Salvalaio e Rodrigo Denúbila

 Hotel Tijuco — Diamantina (MG)

Construído em Diamantina, terra natal de Juscelino Kubitschek, o Hotel Tijuco (1951) tem linhas mais arrojadas do que o seu antecessor, o Grande Hotel de Ouro Preto, também projetado por Oscar Niemeyer. Disposto em meio a uma elevação, tem vista tanto para o casario colonial setecentista tombado pelo Iphan quanto para a Serra do Espinhaço. Nasceu de um anseio de JK, então governador  de Minas Gerais e amigo  de  Oscar Niemeyer, de dinamizar sua cidade. Niemeyer também projetou ali outras obras, entre as quais a Escola Júlia Kubitschek (1951), em homenagem à mãe do futuro presidente da República e fundador de Brasília.

O aproveitamento de um platô deixa a construção horizontal em destaque e estabelece um diálogo nada óbvio com o entorno. Dotado de pilotis, varandas nos quartos (segundo pavimento), e esquadrias amplas (pavimento térreo), o edifício permite uma visão quase panorâmica do exterior. Revestido em madeira, o hall em pé direito generoso exibe linhas elegantes que abrigam mobiliário em pé palito. 

"A volumetria do hotel possui uma leitura moderna mais marcante, se comparada com o hotel em Ouro Preto, gerada, sobretudo pelos pilares em “V”, tema recorrente no conjunto da obra de Niemeyer à altura", observam os arquitetos Ricardo Alexandre Paiva, Lilian Vidal Freitas e Rívia Nobre Feitoza, em estudo sobre arquitetura moderna e patrimônio em Minas Gerais.

Os pesquisadores apontam a disposição das lajes, que geram fachadas inclinadas, solução posteriormente utilizada em uma série de obras, como o Museu de Arte Moderna (1954) do Rio de Janeiro, da autoria de Affonso Eduardo Reidy.

Os muxarabis, já presentes no Grande Hotel Ouro Preto, igualmente na cor azul, guardam as varandas e valorizam a fachada. "Em comparação ao hotel de Ouro Preto, verifica-se no Hotel Tijuco um avanço nas soluções estruturais e formais, que exploram com mais ousadia o concreto armado como elemento formal", diz o estudo. As suítes forjadas como "ambientes modulados' são outra marca do Tijuco.

A linguagem moderna mais pronunciada em comparação com o de Ouro Preto pode decorrer do aumento do prestígio de Niemeyer nos 13 anos de intervalo entre um edifício e outro, o que teria permitido a ele "maior liberdade na exploração das formas". De qualquer forma, repetiu-se ali a fórmula governo, patrimônio e arquiteto.  

O tombamento recente dos dois hotéis e  a autoria de Oscar Niemeyer atribuem  a estes edifícios um capital simbólico significativo, agregando valores que são atributos privilegiados para a fruição da atividade turística Paiva, Freitas e Feitosa.

Foto: Divulgação/Hotel Tijuco

 Parque Guinle — Rio de Janeiro (RJ)

Três edifícios residenciais, de seis originalmente projetados, compõem o conjunto que Lúcio Costa criou em torno do Parque Guinle, no bairro carioca de Laranjeiras, na Zona Sul. Construídos entre 1948 e 1954 para um público de classe média alta, guardam características de quadra-parque em razão da harmonia entre os prédios e a natureza em volta.

Com uma área de quase 25 mil m², o parque nasceu nos anos 1920 como jardim do palacete do empresário Eduardo Guinle (1846-1914) no vale que se estende a partir das encostas do morro Nova Cintra. Com projeto de 1916 do paisagista francês Gérard Cochet, foi depois modificado, em parte, pelo paisagista Burle Marx.

O antigo palacete da família Guinle, que também ergueu o hotel Copacabana Palace, é o atual Palácio Laranjeiras, residência oficial do governador do estado do Estado do Rio de Janeiro. Ainda assim, os jardins do parque são franqueados ao público.

De acordo com o site ArquGuia - Rio, os edifícios Nova Cintra, Bristol e Caledônia contêm elementos típicos do repertório modernista, como pilotis, fachada livre e brises (quebra-sóis) verticais, cobogós (tijolos cerâmicos vazados) e treliças de madeira. Os elementos de proteção tiveram como função refrear a luz do sol e facilitar a ventilação em dois edifícios (Bristol e Caledônia) voltados para o poente e resultaram “em uma composição de grande riqueza plástica”, de acordo com o mesmo guia.

No Nova Cintra, os pilotis são utilizados para fins comerciais, mas nos outros dois manteve-se o princípio modernista da livre circulação. Mais três  prédios, de outros arquitetos foram erguidos no Guinle.

Foto: Eduardo P.

 Conjunto Habitacional Vila Operária da Gamboa — Rio de Janeiro (RJ)

Localizado no bairro de Santo Cristo, no Rio de Janeiro, o conjunto habitacional Vila Operária da Gamboa foi planejado pelo médico e empresário Fábio Carneiro de Mendonça na década de 1930 e recebeu projeto dos arquitetos Lúcio Costa e Gregori Warchavchik em 1933. Tombado na década de 1980, guarda até hoje a vocação para moradia popular.

Gamboa representou o segundo projeto do escritório de Costa e Wachavchik, que tentavam aprender com as rupturas em voga na arquitetura mundial. Integra catorze unidades habitacionais alocadas na rua Barão da Gamboa, área industrial, em um terreno pequeno e irregular. Emparelhados de dois a dois, os apartamentos compartilham acessos comuns por meio de extensa varanda circular, que altera a geometria cúbica do conjunto. O aproveitamento máximo do terreno foi possível graças a estratagemas como um hall central para facilitar a circulação. Cada apartamento é um quadrado dividido em quatro partes iguais: sala, dois quartos e banheiro e cozinha. 

O uso de concreto armado é parte do repertório da arquitetura modernista, com base na Carta de Atenas, resultante do IV Congresso Internacional de Arquitetura (Ciam), que vê na unidade habitacional o "núcleo inicial do urbanismo" e a célula transformadora das cidades. Quando o conjunto foi erguido, a aceleração industrial agravava as condições de moradias dos operários brasileiros, que antes contavam com sobrados da época colonial. Um dos pilares filosóficos da abordagem de Warchavchik é a conversão dos edifícios residenciais em "máquinas para habitação", o que implicava aumentar sua funcionalidade.

Veja mais sobre o Gamboa em:

 Foto: Reprodução.

 Conjunto Residencial Prefeito Mendes de Moraes, o Pedregulho — Rio de Janeiro (RJ)

Construído entre 1947 e 1952 para moradia de servidores públicos do então Distrito Federal, o Conjunto Residencial Prefeito Mendes de Moraes, conhecido como Pedregulho, foi projetado por Affonso Eduardo Reidy. Localizada no bairro de São Cristóvão, no Rio de Janeiro, a construção reúne princípios da arquitetura de Le Corbusier, como a funcionalidade e a economia de meios, controle da luminosidade e da ventilação, assim como a facilidade de circulação. Mas apresenta características da obra de Oscar Niemeyer: arcos, linhas curvas e desenhos em forma de ondas. O Pedregulho integra a chamada "fase social' da arquitetura de Reidy, que conta também com a Unidade Residencial da Gávea (1952). Elogiado pelo cáustico Max Bill e por Le Corbusier, o Pedregulho levou Reidy ao reconhecimento internacional.

O edifício acompanha os desníveis do terreno por meio de pilotis de alturas variadas e passarelas, mantendo a vista da baía de Guanabara para todos os apartamentos, que têm entre um e dois dormitórios.

Os prédios residenciais são inspirados nos edifícios do Parque Guinle (1948/1954), da autoria de Lucio Costa. A área é servida por um conjunto de escola, ginásio (decorado com painel de azulejos de Candido Portinari) e vestiários, que se beneficiam também de luminosidade e ventilação. Outros serviços públicos: centros comerciais, jardim-de-infância, maternal, berçário, escola primária, quadras esportivas, ginásios, piscina e centro sanitário.

"O conjunto do Pedregulho traz em sua concepção a naturalidade e consistência da Arquitetura Moderna Brasileira, aliadas aos preceitos urbanísticos dos CIAM’s, revelando de forma acabada a relação entre habitação social, modernização, educação popular e transformação da sociedade".

Foto: Reprodução/ArchDaily

 Edifício Copan — São Paulo (SP)

Localizado no centro da cidade de São Paulo, o edifício Copan foi projetado por Oscar Niemeyer em 1954, a propósito do quarto centenário de São Paulo, mas sua inauguração se deu apenas em 1966. A despeito das alterações em seu desenho original — que previa pilotis realmente livres, um hotel anexo ligado por galeria com garagem, cinema, teatro e comércio, possibilitando uma relação dinâmica com o entorno — é considerado um dos símbolos da arquitetura moderna brasileira: seu formato horizontal em ‘S’ e o arranjo de brise-soleil (quebra-sol) da fachada são suas marcas inconfundíveis em meio a uma paisagem urbana verticalizada.  Por isso o Copan é um ponto turístico bastante visitado.

O projeto foi encomendado pela Companhia Pan-Americana de Hotéis e Turismo (Copan), com o intento de erguer um conjunto urbanístico a la Rockfeller Center (Nova York). Iniciado em 1957 com a presença inconstante de Niemeyer, a obra foi finalizada pelo arquiteto Carlos Alberto Cerqueira Lemos, que também não teve alguns de seus ditames respeitados pelos executores.

O prédio encerra a maior estrutura de concreto armado do país, com 115 metros de altura, divididos em 32 andares e 120 mil m² de área construída. É composto de seis blocos, não visíveis de longe, com um total de 1.160 apartamentos de dimensões variadas. Estima-se que ali residam cinco mil pessoas, servidas por mais de 70 estabelecimentos comerciais. O cinema atualmente é ocupado por uma igreja evangélica.

Veja mais sobre o Copan em:

Foto: Eli Kazuyuki Hayasaka

 Conjunto Habitacional Lúcio Costa — Brasília (DF)

A  Quadra Econômica Lúcio Costa (QELC), localizada na cidade do Guará (DF), é um projeto de habitação popular elaborado pelo arquiteto Lúcio Costa no ano de 1985. Projetado para a população de baixa renda da cidade de Salvador (BA), acabou não sendo construído lá. Terminou por ser aproveitado para atender às necessidades de expansão do Plano Piloto recomendadas por Costa no documento Brasília Revisitada (1985), e foi entregue a funcionários do Governo do Distrito Federal em início de carreira e moradores de invasões — público com mais poder e estabilidade de renda que o original, formado por moradores de favelas. Por essa razão, os edifícios sofreram ao longo do tempo diversas mudanças, como a instalação de grades e a alteração do formato das janelas. À própria quadra foram acrescentados outros edifícios de feitio diferente.

As unidades projetadas por Costa e construída na quadra tinham pilotis para garantir aos moradores acesso a todos os blocos. E uma boa comunicação com a área externa, com vistas, por exemplo, ao lazer.  Os apartamentos maiores, de 52 m², continham duas camarinhas: denominação dada pelo autor a um tipo de quarto articulado à área de serviço ou à sala para atender, respectivamente, pessoas idosas dedicadas a serviços domésticos e filhos mais velhos que trabalham e chegam tarde à casa. Já a cozinha incorporava o espaço para as refeições e era dividida por uma abertura para permitir um contato visual com a sala e integrar os ambientes.

Todas essas características revelam uma preocupação do arquiteto e urbanista com um variado cardápio de necessidades domésticas e a adequação do projeto ao tipo de pessoa que moraria no apartamento — intenção afinal frustrada pela transposição do conjunto para Brasília em outra faixa de renda.

Veja mais sobre a quadra Lúcio Costa em:

Fotos: Nelson Oliveira/ Agência Senado; Reprodução/Notícias do Lúcio Costa

Passagens subterrâneas — Brasília (DF)

As passagens subterrâneas do Plano Piloto de Brasília são parte fundamental do projeto de Lúcio Costa para implantar uma via de trânsito rápido na cidade. Pelas passagens o pedestre vai da direção leste a oeste, e vice-versa, do Eixo Rodoviário, sem se expor aos altos limites de velocidade das pistas que o compõem. Foram implantadas oito passagens na Asa Sul e oito na Asa Norte, a intervalos de 800 metros.

Saída aparentemente revolucionária para harmonizar o fluxo de carros e transeuntes, as passagens, no entanto, vivem uma crise constante por falta de manutenção. Ameaçados pela violência e avessos à sujeira, muitos pedestres preferem se arriscar atravessando pistas com limite de até 80 km/h.

 Foto: Reprodução/Brasília para Pessoas

 Minha Casa, Minha Vida

Questionado por não avançar como solução para a oferta de moradias populares de boa qualidade, o Programa Minha Casa Minha Vida difere dos anteriores apenas no número de unidades produzidas. Ao invés de focar em projetos adaptados a cada necessidade regional ou local, o programa se baseia no financiamento a empreiteiras em projetos de grande porte, mas que se utilizam de terrenos distantes dos centros urbanos, dotados de pouca infraestrutura e conexões, onde são construídas casas ou blocos de apartamentos que mal cumprem a função e não oferecem quase nada em matéria de forma. Além de não provocarem qualquer entusiasmo, dada a monotonia medíocre das opções arquitetônicas, é frequente a deterioração dos imóveis.

Foto: Divulgação/Governo da Bahia

 Condomínios

As promessas ilusórias de segurança empurraram a classe média em direção a diversos tipos de condomínios, verticais e horizontais, o que criou um isolamento social bastante valorizado como parte do status.

Não se trata do apartheid urbano da classe pobre, que passa boa parte do dia no transporte entre a casa na periferia e um destino qualquer de trabalho nas áreas centrais ou abastadas — e não tem direito pleno de fruir a cidade em suas diversas funções, incluindo o lazer e a cultura.

Dos projetos modernistas que buscavam uma nova relação do cidadão com espaço urbano, no micro e no macrocosmo, e com a natureza, restaram na maior parte das vezes arremedos eivados de anacronismo ou presunçosas soluções futuristas, em detrimento da vida pulsante e da cidadania integral e participativa. 

Foto: Ana Araújo/Portal da Copa


Pauta, coordenação e edição: Nelson Oliveira
Coordenação e edição de multimídia: Bernardo Ururahy
Pesquisa fotográfica: Pillar Pedreira
Foto de capa: Crystian Cruz