Marcos Oliveira/Agência Senado

🕐 ESTA REPORTAGEM FOI PUBLICADA EM Outubro de 2019. INFORMAÇÕES CONTIDAS NESTE TEXTO PODEM ESTAR DESATUALIZADAS OU TEREM MUDADO.

O que o Senado mudou na Previdência e quais os impactos para a reforma

Por Bruno Fávero

2 de outubro de 2019, 19h04

O Senado aprovou em primeiro turno nesta quarta-feira (2) o texto da reforma da Previdência (PEC 6/2019), que muda as regras de aposentadoria no país.

Para evitar que o texto retornasse à Câmara, as alterações foram pequenas: ficaram restritas a supressões de trechos aprovados pelos deputados e mudanças de redação. Ainda assim, tiveram um impacto significativo: o governo estimava uma economia de cerca R$ 900 bilhões com o texto que saiu da Câmara, e o número caiu para R$ 800 bilhões com as alterações dos senadores.

Para entrar em vigor, o texto precisa passar por votação em segundo turno na Casa, que ainda não tem data marcada. Outras mudanças, como a adesão de estados e municípios à reforma e emendas rejeitadas de senadores para a PEC original, ainda podem ocorrer por meio de uma PEC paralela que tramita no Senado.

Abaixo, veja o que mudou e o que continuou igual na reforma da Previdência:

1. Benefício de Prestação Continuada

Resumo. A reforma da Previdência aprovada na Câmara restringia quem podia receber o BPC (Benefício de Prestação Continuada), benefício mensal de um salário mínimo pago a idosos e deficientes pobres. O Senado reverteu a mudança.

Como é hoje. A Lei Orgânica da Assistência Social, de 1993, estabelece que têm direito ao BPC idosos e deficientes com renda familiar per capita de até um quarto do salário mínimo (que seria R$ 249,50). A regra, porém, foi considerada inconstitucional pelo STF (Supremo Tribunal Federal) em 2013. Na decisão, os ministros estipularam o patamar de meio salário mínimo para concessão do benefício.

Como saiu da Câmara. O texto incluiria na Constituição a regra segundo a qual o benefício seria concedido apenas àqueles com renda familiar per capita menor do que um quarto do salário mínimo.

Como ficou. O texto do Senado suprime a regra do BPC da Constituição e mantém apenas a regulação definida pela lei nº 8.742. Volta a valer, portanto, o entendimento do STF do patamar de meio salário mínimo per capita para o idoso ou deficiente receber o benefício.

O impacto. A alteração no texto pelo Senado diminui o impacto fiscal da reforma da Previdência em R$ 25 bilhões, segundo estimativa da IFI (Instituição Fiscal Independente), citada no relatório do senador Tasso Jereissati.

2. Aposentadoria especial

Resumo. A reforma da Previdência aprovada na Câmara dos Deputados dificultava a aposentadoria especial de trabalhadores expostos a substâncias nocivas. O texto aprovado pelo Senado ameniza essa mudança.

Como é hoje. Trabalhadores nessas condições podem se aposentar por tempo de contribuição (com 15, 20 ou 25 anos, dependendo do tipo de agente a que foram expostos).

Como saiu da Câmara. O texto propunha manter os tempos mínimos de contribuição, mas implementar também um sistema de pontos que somaria idade com o tempo de trabalho e que ficaria mais exigente a cada ano.

De imediato, começaria a valer uma regra segundo a qual aqueles que hoje se aposentariam com 15 anos de contribuição precisariam também somar 66 pontos para se aposentar (por exemplo, 51 anos de idade e 15 de contribuição ou 46 anos de idade e 20 de contribuição); já a aposentadoria aos 20 anos de contribuição exigiria 76 pontos e, por fim, 25 anos exigiriam 86 pontos.

Além disso, o texto da Câmara previa que, a partir de 2020, a exigência aumentaria em um ponto por ano para todas as categorias, até atingir 81, 91 e 96 pontos, respectivamente.

Como ficou. O texto do Senado mantém a regra de 66, 76 e 86 pontos, mas retira o dispositivo segundo o qual a exigência aumentaria ano a ano.

O impacto. Segundo estimativa da IFI (Instituição Fiscal Independente), R$ 6 bilhões deixarão de ser economizados em 10 anos.

3. Abono salarial

Resumo. O governo Bolsonaro tentou restringir as regras para concessão de abono salarial, uma espécie de 14º salário para trabalhadores que ganham até dois salários mínimos.

Como é hoje. Trabalhadores que recebem até dois salários mínimos (hoje, R$ 1.996), estão inscritos no PIS/Pasep há pelo menos cinco anos e trabalharam ao menos um mês no ano ganham do governo um abono de até um salário mínimo (R$ 998). O benefício é pago em proporção ao tempo trabalhado no ano anterior – 12 meses dão direito ao valor integral.

Como saiu da Câmara. Na proposta enviada ao Congresso pelo governo Bolsonaro, o abono ficaria restrito a quem ganha até um salário mínimo. Na Câmara, o valor foi aumentado de R$ 998 para R$ 1.364,43.

Como ficou. No Senado, a restrição do benefício foi mantida no relatório do senador Tasso Jereissati (PSDB-CE), mas foi retirada na votação dos destaques (alterações propostas por senadores). Ou seja, permanecem as regras atuais, que beneficiam quem ganha até dois salários.

O impacto. Com a restrição no abono prevista no texto dos deputados, a IFI calculava uma economia de R$ 70,2 bilhões em dez anos, que não se concretizará. Cerca de 12,7 milhões de pessoas deixariam de receber o benefício, segundo cálculos do economista Daniel Ferrer, do Dieese (Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos), feitos a pedido da Federação dos Trabalhadores da Indústria Química e Farmacêutica.

Na semana passada, pesquisadores do Ipea defenderam mudanças do abono, argumentando que, no modelo atual, 59% dos benefícios pagos são concedidos a famílias na metade mais rica da população.

Mesmo na esquerda, há quem defenda a restrição do abono salarial. Ministro da Fazenda no governo Dilma Rousseff (PT), Nelson Barbosa escreveu texto para o blog do Ibre-FGV (Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getúlio Vargas) em que apoia a redução da linha de corte para um salário mínimo.

4. Pensão por Morte

Resumo. A PEC aprovada pela Câmara abria brecha para que alguns beneficiários da pensão por morte recebessem menos do que o salário mínimo sob as novas regras. O Senado alterou o texto para proibir essa possibilidade.

Como é hoje. Dependentes recebem 100% da aposentadoria de quem morreu. A duração do benefício varia de acordo com a idade do dependente que o recebe (veja aqui) – e é vitalícia se ele ou ela tem a partir de 44 anos.

Como saiu da Câmara. A pensão passaria a variar dependendo do número de dependentes. Se for apenas um, o pagamento é de 60% do benefício recebido por quem morreu. Cada dependente extra adiciona dez pontos percentuais ao valor pago (até o limite de 100%, com cinco dependentes). O benefício é integral quando o dependente é deficiente.

Como ficou. O Senado manteve a regra de cálculo, mas estipulou que nenhum pensionista pode receber menos do que um salário mínimo.

O impacto. O governo deixa de economizar R$ 10 bilhões em 10 anos, segundo estimativa do senador Tasso Jereissati (PSDB-CE).

5. PEC paralela

Para não atrasar a aprovação da atual reforma da Previdência, o relator Tasso Jereissati optou por incluir alterações maiores em na chamada PEC Paralela, que tramita no Senado.

A principal medida prevista é incluir estados e municípios na reforma, mas Jereissatti também já afirmou que pretende reduzir o tempo mínimo de contribuição para homens, aumentar a aposentadoria por incapacidade em caso de acidente, propor a criação de um benefício para crianças carentes, entre outros pontos.

A iniciativa de propor uma PEC paralela foi tomada porque qualquer mudança no mérito da PEC original da reforma exigiria que ela fosse enviada de volta à Câmara para uma nova votação. Já supressões e mudanças de texto, como as que foram feitas, podem ser realizadas sem o aval dos deputados.

O texto da PEC paralela está na CCJ (Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania) do Senado. Depois disso, terá que ser votado em dois turnos pelo Plenário da Casa e, então, será encaminhado para a Câmara para ser analisada pelos deputados.


As principais mudanças promovidas pela reforma da Previdência aprovada na Câmara, como idade mínima e regra de cálculo dos benefícios, não sofreram alterações pelo Senado. Veja quais são as principais e como elas mudam as regras atuais de aposentadoria:

6. Idade mínima

Como ficou. Os requisitos mínimos para aposentadoria de trabalhadores urbanos seguem os mesmos do texto aprovado na Câmara: 62 anos de idade e 15 anos de contribuição no caso das mulheres e 65 anos de idade e 20 anos de contribuição no caso dos homens.

Como é hoje. É possível se aposentar tanto por idade (65 anos para homens e 60 para mulheres) quanto por tempo de contribuição (35 anos para homens e 30 para mulheres).

7. Alíquotas de contribuição

De acordo com o texto-base aprovado pela Câmara, as alíquotas de contribuição ao INSS serão progressivas de acordo com faixas de salário, de maneira similar ao que acontece com o Imposto de Renda:

Regime Geral (INSS)

• Até um salário mínimo: 7,5%

• De um salário mínimo a R$ 2.000: 9%

• De R$ 2.000 a R$ 3.000: 12%

• De R$ 3.000 até o limite do do INSS (atualmente R$ 5.839,45): 14%

• Não haverá cobrança adicional nas faixas salariais acima do teto do INSS.

Regime Próprio (Servidores públicos federais)

• Até um salário mínimo: 7,5%

• De um salário mínimo a R$ 2.000: 9%

• De R$ 2.000 a R$ 3.000: 12%

• De R$ 3.000 ao teto do INSS (R$ 5.839,45): 14%

• Do teto a R$ 10.000: 14,5%

• De R$ 10.000 a R$ 20.000: 16,5%

• De R$ 20.000 a R$ 39.000: 19%

• Acima de R$ 39.000: 22%

As alíquotas vão de 7,5% a 14% para quem trabalha no setor privado. Mas, como o cálculo divide os salários em faixas que recebem descontos proporcionais, a alíquota máxima efetiva deve ser de 11,68% para quem recolhe sobre o teto do valor de contribuição.

No caso de quem trabalha no setor público, as alíquotas vão de 7,5% para servidores que ganham até um salário mínimo, e chegam a 22% para quem ganha acima do teto estipulado (R$ 39 mil). Como, a taxação também é feita sobre as faixas de valores do salário, a alíquota máxima efetiva é de 16%.

Como é hoje. No setor privado, as alíquotas atuais são nominais e preveem três faixas de cobrança — 8% de contribuição para salários de até R$ 1.751,81; 9% para salários de R$ 1.751,82 a R$ 2.919,72; e 11% para salários de R$ 2.919,73 até R$ 5.839,45 (teto do INSS). No setor público, a alíquota é de 11%.

8. Regra de cálculo

De acordo com a reforma, a nova regra de cálculo dos benefícios funciona da seguinte maneira:

Homens e mulheres

• Ao atingir o tempo mínimo de contribuição de 15 anos, recebe-se 60% da média salarial.

• Valor recebido aumenta 2% a cada ano contribuído, até atingir o teto aos 35 anos, no caso das mulheres, e 40 anos, no caso dos homens.

• Média de valores de todas as contribuições pagas

Para atingir 100% do benefício, homens terão que contribuir por 40 anos e mulheres, 35.

Como é hoje. O valor do benefício na aposentadoria por idade começa em 70% do salário médio de contribuição e soma 1% para cada ano trabalhado, até o limite de 100%. Já quem se aposenta por tempo de contribuição tem o valor do benefício reduzido pelo fator previdenciário. Há também a opção de aposentadoria com o valor integral a partir da regra 85/95: somando idade e tempo de contribuição, mulheres devem acumular 85 anos e homens, 95.

As regras de definição do valor também mudam: atualmente, o INSS calcula a média salarial do trabalhador considerando os 80% maiores salários desde julho de 1994. Isso significa que os 20% menores são descartados. Isso não deve acontecer com a nova Previdência.

Referências:

1. Senado 1, 2 e 3
2. O Globo
3. G1
4. Planalto
5. STF
6. Câmara dos Deputados
7. Ministério da Economia
8. Ipea
9. FGV
10. INSS


Esta reportagem foi publicada de acordo com a metodologia anterior do Aos Fatos.

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