Debatedores divergem sobre ajustes no novo ensino médio

Da Agência Senado | 31/05/2023, 16h37

A Subcomissão do Ensino Médio (Ceensino) promoveu, na tarde desta quarta-feira (31), uma audiência pública sobre o novo ensino médio. É a terceira audiência que a subcomissão realiza sobre o tema. Durante o debate, que ocorreu de forma remota, os debatedores manifestaram visões distintas sobre o assunto. Enquanto alguns afirmaram que o novo modelo pode aumentar as diferenças sociais, outros alertaram para os riscos de uma possível revogação.

A senadora Professora Dorinha Seabra (União-TO), relatora da subcomissão, foi quem dirigiu o debate. Ela disse que as sugestões apresentadas pelos debatedores serão consideradas em seu relatório. Dorinha defendeu maior investimento na formação dos professores e mais estrutura para as escolas, como forma de incentivo permanente para o ensino. Para a senadora, demonizar a reforma não é o ideal. Ela reconheceu, porém, que há ajustes que poderão ser considerados.

— Temos um enorme desafio para lidar e fazer as mudanças necessárias. Se não encararmos a educação com seriedade, o prejuízo será muito grande — alertou a senadora.

O diretor de Políticas Públicas do Movimento Todos pela Educação, Gabriel Barreto Corrêa, reconheceu que há pontos importantes no novo ensino médio. Ele disse, no entanto, que há necessidade de mudanças urgentes. Corrêa sugeriu a substituição do teto de 1.800 horas (para a formação geral básica) por dois pisos, que poderiam incluir ensino técnico e profissionalizante. Outra sugestão seria ter uma orientação nacional para os itinerários (módulos de disciplinas que podem ser escolhidas pelos alunos), que na visão de Corrêa têm demonstrado muita diferença entre um estado e outro.

 Diferenças sociais

A vice-presidente da Sociedade Brasileira pelo Progresso da Ciência (SBPC), Fernanda Antônia da Fonseca Sobral, disse que a entidade já se posicionava com críticas à reforma do ensino médio ainda em 2018. Para a SBPC, as mudanças da reforma podem aprofundar as diferenças sociais e enfraquecer a educação pública, já que as escolas privadas têm mais recursos financeiros. Fernanda Sobral criticou a redução de oferta de determinadas disciplinas e um suposto foco do novo ensino médio na técnica e não na educação. Ela ainda apontou que, para a reforma dar certo, as escolas precisam melhorar sua infraestrutura e contratar mais professores

A representante da SBPC também disse que já é possível perceber nas escolas situações como desigualdade na oportunidade de escolha, estudo a distância ou por vídeo. Segundo Fernanda Sobral, nem todas as escolas públicas têm condições de oferecer todos os módulos de ensino. Essa situação, ressaltou, maximiza as diferenças sociais, já que os alunos de escola particular não enfrentam essas dificuldades.  

— Reduzir as aulas não forma melhor o jovem. Educação é formação, não é treinamento – alertou Fernanda Sobral.

Para a coordenadora do Observatório do Ensino Médio, Monica Ribeiro da Silva, a preocupação com o aumento de diferenças sociais é legítima. Segundo a professora, a maioria das escolas públicas não tem condições de ofertar todos os itinerários. Ela pediu a atenção do poder público com o financiamento das escolas públicas e com a evasão escolar. Ponderou que não é possível pensar em reforma do ensino médio apenas com mudanças curriculares. Na visão de Monica da Silva, é preciso pensar em acesso e permanência, investimento no docente e repensar certos pontos da reforma. Ela disse que algumas disciplinas têm redução de 35% a 40% no volume de aulas.

 — Reduzir a carga horária é um absurdo, pois para muitos dos nossos alunos o ensino médio é a etapa final dos estudos — registrou.

 Revogação

Por outro lado, o 3º vice-presidente da Confederação Nacional dos Estabelecimentos de Ensino (Confenen), José Ricardo Diniz, afirmou que a flexibilização curricular está no centro da reforma do ensino médio. Ele disse que a concepção do modelo está sintonizada com os principais países do mundo. Segundo o professor Diniz, o modelo anterior, com foco na centralidade do professor, terminava por desestimular o aluno. Ele reconheceu a complexidade do novo modelo, mas disse que é preciso enfrentar os desafios. Na opinião do professor, uma possível revogação do novo ensino médio seria um desastre.

— Esse modelo está sintonizado com o que está acontecendo no mundo. Não se trata de Brasil, mas é uma questão planetária de mudança no modelo de ensino – declarou Diniz.

O professor Ivan Claudio Pereira Siqueira, da Universidade Federal da Bahia (UFBA) e do Movimento pela Base, disse que um modelo único não vai atender à totalidade dos alunos do país. Ele disse que é preciso beneficiar a maioria possível, pediu que os professores sejam mais ouvidos e cobrou mais atenção com as questões da inteligência artificial. Na opinião do professor, uma possível revogação do ensino médio poderia gerar uma “crise institucional sem tamanho”.

— A gente pode criar uma crise maior do que uma proposta de solução. Precisamos pensar nos desdobramentos das ações e avançar — advertiu.

 Interativa

A audiência teve caráter interativo, com a possibilidade de participação popular. A senadora Dorinha destacou algumas mensagens que chegaram pelo portal e-Cidadania. O internauta Davi Martins, do Rio de Janeiro, questionou o horário integral para os jovens que trabalham – que assim correriam o risco de perder seus empregos. Clarissa Saraiva, do Ceará, sugeriu um caráter mais profissionalizante no ensino médio, como ocorre em alguns países da Europa. Já Átila Conceição, da Bahia, disse que o ensino médio deveria ter uma disciplina de estágio, para preparar o estudante para o mercado de trabalho.

A senadora ainda anunciou a aprovação de um requerimento (REQ 2/2023) que prevê a implantação de um formulário eletrônico, que será disponibilizado no site do Senado, para colher opinião de debatedores sobre o novo ensino médio. 

Subcomissão

Criada no final do mês de março no âmbito da Comissão de Educação (CE), a Subcomissão do Ensino Médio tem cinco membros titulares e igual número de suplentes. O objetivo do colegiado é debater e avaliar os desafios e as perspectivas do ensino médio no Brasil. Questões como a universalização do atendimento escolar para toda a população de 15 a 17 anos e a reforma do ensino médio estão entre os focos da subcomissão. A presidente da subcomissão é a senadora Teresa Leitão (PT-PE).

Agência Senado (Reprodução autorizada mediante citação da Agência Senado)