Ministra culpa imprensa por ligações antivacina para o Disque 100

Augusto Castro | 28/03/2022, 15h50 - ATUALIZADO EM 28/03/2022, 17h15

Em audiência pública na Comissão de Direitos Humanos (CDH), nesta segunda-feira (28), a ministra Damares Regina Alves disse que nunca mandou o Disque 100 atender ligações antivacina. Titular do Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos (MDH), a ministra culpou a imprensa pelo episódio, afirmando que uma nota técnica do ministério foi deturpada.

Disque Direitos Humanos - Disque 100, comandado pelo Ministério da Mulher, é o número gratuito pelo qual o governo federal recebe denúncias de violação de direitos humanos.

A ministra afirmou que a nota técnica não é um ato normativo, mas “expressão de uma posição”. Ela afirmou que o ministério é a favor das vacinas, mas contra a obrigatoriedade da vacinação anticovid para crianças e contra o chamado passaporte sanitário.

— E aqui a gente lamenta o uso que a imprensa fez dessa nota e o desgaste desnecessário para o Disque 100, um instrumento poderoso na proteção da infância, conduzido por técnicos extraordinários — pontuou a ministra.

Segundo ela, a nota foi enviada apenas para autoridades públicas, como ministérios, governadores, conselhos nacionais, Presidência da República e outros. Damares disse que a nota não diz que o ministério receberá ligações antivacina.

— Vejam só: a nossa nota foi encaminhada para essas autoridades, falando de direitos e de liberdades fundamentais. No final da nota, a gente coloca: "E o serviço Disque 100 está à disposição". Estávamos esperando as autoridades retornarem: vai ser necessário usar o Disque 100 para reforçar a campanha de vacina, ou não vai ser necessário? Vai ser necessário ouvir reclamação de pais? Enquanto a gente esperava a resposta das autoridades, essa nota vaza, e a imprensa fala que a gente coloca o canal à disposição. E aí, sim, foi um problema, porque a sociedade começa a ligar no Disque 100, que não estava pronto para receber, que não tinha fluxo — disse Damares.

Depois da nota vir a público, provocado pelo partido Rede Sustentabilidade, o ministro Ricardo Lewandowski, do Supremo Tribunal Federal (STF), determinou que o governo federal deixasse de usar o Disque 100 “fora de suas finalidades institucionais, deixando de estimular, por meio de atos oficiais, o envio de queixas relacionadas às restrições de direitos consideradas legítimas por esta Suprema Corte”. Damares disse que obedeceu criteriosamente ao STF, inclusive alterando a nota técnica de acordo com a liminar.

A audiência pública foi pedida pelo presidente da CDH, senador Humberto Costa (PT-PE), para explicar a Nota Técnica nº 2, de 2022, do Ministério da Mulher, “ante sua patente inobservância de normas e critérios científicos e técnicos e dos princípios constitucionais da precaução e da prevenção, especialmente no combate à pandemia da covid-19”.

Humberto Costa acusou a ministra de contribuir para gerar dúvidas quanto aos benefícios da vacinação em crianças. Segundo ele, é natural o documento chegar à imprensa.

— Com todo respeito, eu acho que Vossa Excelência contribuiu para que pais se tornassem reticentes quanto à vacinação. (...) houve quem utilizasse a resolução, de um lado, para criticar a posição assumida pelo ministério, mas, de outro, milhares de pessoas aproveitaram essa resolução para reforçar argumentos negacionistas, para contestar e sabotar medidas de saúde pública já que, a partir daí, as pessoas queriam que não houvesse cobrança da utilização do passaporte vacinal, que não fosse cobrada a vacinação de crianças dentro das escolas — disse Humberto.

Damares também afirmou que o MDH não é contra vacinas, mas concorda com a opinião do Ministro da Saúde de que pais e mães não seriam obrigados a vacinar os filhos contra a covid.

— Nosso ministério trabalhou muito no incentivo à vacina. (...) em momento algum, o ministério trabalhou um fluxo para atender os não vacinados. O Disque 100 estava e está a serviço da população para que a população saiba que não está sozinha e que nós estamos atentos à violação de direitos — afirmou a ministra.

Os senadores Eduardo Girão (Podemos-CE) e Marcos Rogério (PL-RO) apoiaram a ministra e elogiaram a gestão dela à frente da pasta e apresentaram argumentos contrários ao passaporte sanitário. Girão disse que há divergências sobre a efetividade de medidas sanitárias em escolas.

— Existe uma divisão científica. Existe uma divisão entre cientistas em abordagens sobre esse tema. Não é verdade absoluta — disse Girão sobre passaporte sanitário para estudantes.

Marcos Rogério destacou o conjunto das ações de Damares no MDH e elogiou trabalhos do ministério contra a violência sexual e de prevenção ao suicídio em jovens, entre outros.

— Não vi aqui [na nota técnica] o Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos dizer que é contra a vacina. (...) não há campanha contra a vacina — disse Marcos Rogério.

A ministra aproveitou para pedir aos senadores que aloquem mais recursos para o Ministério da Mulher no Orçamento. Ela também garantiu que o ministério, desde o início da pandemia de covid-19, “atuou de uma forma muito técnica, de uma forma muito ética”.

— Nós conduzimos as nossas ações, no ministério, de enfrentamento à pandemia sempre com respaldo legal, com base científica, observando as decisões das demais autoridades, mas não nos afastando, em momento algum, da garantia dos direitos, não nos afastando, em momento algum, das nossas atribuições e de nossas responsabilidades — ressaltou Damares.

O senador Fabiano Contarato (PT-ES), vice-presidente da CDH, afirmou que o governo federal teve responsabilidade direta pelo agravamento da pandemia e criticou o presidente da República por nunca ter incentivado a vacinação.

Para Contarato, isso e outros comportamentos do presidente e do governo mostram que o direito à vida foi violado. Ele cobrou de Damares que o ministério passe a ter “comportamento mais proativo para a efetivação dos direitos constitucionais”.

— A senhora é ministra dos Direitos Humanos, a senhora tinha que estar defendendo os pobres, pretos, índios, quilombolas, mulheres, população LGBTQIA+. (...) Queria muito que a senhora tivesse como Bíblia, na cabeceira da cama, a Constituição da República Federativa do Brasil — disse Contarato.

Agência Senado (Reprodução autorizada mediante citação da Agência Senado)

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