Debatedores defendem aprovar fundo de amparo para órfãos da covid-19

Da Agência Senado | 18/06/2021, 15h53

Senadores e convidados de audiência pública realizada nesta sexta-feira (18) pela comissão temporária que estuda as ações de enfrentamento à pandemia, discutiram a situação de invisibilidade de crianças e adolescentes órfãs da covid-19 e a aprovação de projeto que institui um fundo de amparo para viabilizar o acolhimento dessas pessoas que ficaram vulneráveis. Eles também elencaram a estruturação e integração das políticas públicas envolvendo órgãos como a Justiça, o Sistema Único de Saúde (SUS) e o Sistema Único de Assistência Social (Suas) para garantir a aplicação do arcabouço que já garante os direitos das crianças e adolescentes.

Autora do requerimento para a realização do debate e também de um dos projetos (PL 2.180/2021) que prevê a criação do Fundo de Amparo às Crianças Órfãs pela Covid-19 (Facovid), a senadora Eliziane Gama (Cidadania-MA) citou estudo da economista Ana Amélia Camarano, técnica do Instituto de Pesquisas Aplicadas (Ipea), identificando — caso as mortes por covid-19 continuassem na média de mil pessoas por dia — que cerca de 4 milhões de adultos e um milhão de crianças poderiam ficar na pobreza com a perda de idosos que sustentavam suas famílias. De acordo com a senadora, o cenário é muito pior do que o previsto pela pesquisadora já que famílias inteiras estão indo a óbito em razão da pandemia, necessitando que o Estado atue na defesa dessas pessoas mais vulneráveis.

— Nós apresentamos um projeto para atender essas crianças e adolescentes, criando um fundo especial que poderá ser direcionado aos municípios brasileiros para o fortalecimento do Fundo Nacional da Infância. Portanto, uma ajuda a mais, um “plus” para essas crianças e adolescentes em todo o Brasil — disse Eliziane.

O projeto da senadora foi inspirado na ideia legislativa apresentada pelo jornalista Walberto Maciel, no Portal e-Cidadania. Durante a participação na audiência, Maciel informou que vários parlamentares estão apoiando e apresentando propostas no sentido de criar um financiamento para o acolhimento das crianças e adolescentes e que, neste momento, é necessário reunir os esforços para concretizar a medida.

— O que eu gostaria que acontecesse no Senado é que todos os senadores, independentemente de partido, independentemente de linha política, se unissem a um projeto, fizessem um projeto em conjunto e aprovassem esse projeto para socorrer essas crianças. Isto é mais do que urgente urgentíssimo, isto é para ontem, porque já morreram, de ontem para hoje, mais de 2,7 mil pessoas, e, pelas estatísticas, pelo menos 30% dessas pessoas deixam filhos e filhas desamparados — argumentou.

Políticas públicas

Além de garantir o financiamento que possa auxiliar as famílias no acolhimento dos novos órfãos, o Promotor de Justiça da Infância e da Juventude de São Luiz, Márcio Thadeu Silva Marques, defendeu a atuação do Poder Público em três eixos: a desinvisibilidade dessas crianças e adolescentes com estudos que identifiquem onde estão, suas demandas e quais características; a garantia de uma rede (seja familiar ou não) que ira acolhê-la e a adequação dos direitos e garantias já estabelecidos pelo Estatuto da Criança e Adolescência a essa nova necessidade. Para ele, é preciso estar atento, principalmente, para os órfãos na primeira infância.

— Por que é na primeira infância que nós temos as janelas de desenvolvimento integral, em especial, o cognitivo e o desenvolvimento afetivo, e a ausência completa dos pais desses órfãos vai comprometer a potencialização desse desenvolvimento. Quer dizer, é preciso que a gente estabeleça, seja num redimensionamento de programas como o da Criança Feliz ou de outros, que não haja essa perda da oportunidade desse desenvolvimento integral — afirmou.

Adoção

A representante do Instituto Brasileiro de Direito de Família (IBDFAM), Silvana do Monte Moreira, informou que atualmente 29.979 crianças e adolescentes estão acolhidas em entidades de acolhimento em todo o Brasil. Destas, 14.503 estão nessa situação há mais de três anos, quando o Estatuto da Criança e do Adolescente determina o acolhimento máximo de 18 meses. Na sua avaliação, a legislação para agilizar os processos de adoção não precisa ser alterada e sim, fazer com que as varas da infância e adolescência não sofram com acumulação de competências para que, desta forma, consigam cumprir os prazos e obrigações estabelecidos pelo estatuto da Criança e do Adolescente.

— Hoje, por exemplo, aqui no Rio de Janeiro, é infância, juventude e idoso. Em Minas Gerais: infância, juventude e criminal. No Maranhão, eu não sei se as varas têm competência exclusiva em criança e adolescente. Não sei também se cada vara tem, para cada 200 mil habitantes, um psicólogo, um assistente social e um pedagogo. Então, como dar prioridade para crianças e adolescentes se sequer o Judiciário cumpre o que é emanado do Conselho Nacional de Justiça? — cobrou.

Ainda segundo Silvana, o número de adoções vem caindo no país. Em 2020, no período de janeiro a março, foram 683; em 2021, foram 289.

A necessidade de agilizar e correr com esses processos também foi defendido pelo Defensor Público e presidente da Comissão de Promoção e Defesa da Criança e do Adolescente (Condege), Rodrigo Azambuja Martins.

— Não há necessidade disso. Há necessidade desse atendimento integral, como muito bem demonstrou o doutor Marcos, para prover cuidados a esses meninos e meninas, seja ele através de um apoio financeiro, como já previsto no projeto de lei mencionado, seja através de outras ações intersetoriais com os Cras (Centro de Referência de Assistência Social) e com os Creas (Centro de Referência Especializado de Assistência Social), para, então, promover o desenvolvimento saudável desses meninos e meninas que perderam seus pais e suas mães — observou.

Orçamento

Na visão das senadoras Zenaide Maia (Pros-RN) e Eliziane Gama, os avanços para atender aos órfãos da covid-19 com a adequação das políticas públicas de assistência social só poderá se tornar prioridade no país quando o governo assim os priorizar dentro do Orçamento Geral da União.

— Se a gente quer de fato trabalhar a proteção de nossas crianças e adolescentes, nós precisamos colocar essa prioridade no Orçamento da União. Quando eu apresentei agora o projeto de lei criando esse fundo especial, nós já temos o fundo da infância, mas o fundo da infância não é o suficiente para esse atendimento. Por exemplo, todo o trabalho da assistência social, que é muito lá no município, nós temos as redes municipais. E nessas redes, para elas terem efetividade, a gente precisa ter — e aí doutora Silvana lembrou muito bem — o psicólogo, precisa ter o atendimento psicossocial — acrescentou.

O presidente da comissão, Confúcio Moura (MDB-RO), informou que vai elencar os projetos voltados à atenção aos órfãos da covid-19 e tentar inseri-los na pauta da Casa.

— Precisamos elencar — e eu vou fazer isso, porque é da nossa comissão — e eleger esses projetos prioritários para apreciação prioritária também, justamente no amparo a esse tema a que hoje eu, particularmente, fiquei, assim, bem atento, porque vocês têm muito conhecimento sobre o assunto e escancaram números extraordinários de baixa adoção. Reduziu em mais de 300% — acrescentou.

Agência Senado (Reprodução autorizada mediante citação da Agência Senado)