Senado vai analisar novo marco regulatório do saneamento em 2020

Da Redação | 23/12/2019, 10h38

O Senado deve receber nos próximos dias projeto de lei da Câmara que estabelece o novo marco regulatório do saneamento básico (PL 4.162/2019). Será a quarta tentativa de renovar as regras do setor nos últimos 15 meses. O senador Tasso Jereissati (PSDB-CE) será o relator do projeto, que será um dos primeiros itens analisados pelos senadores em 2020.

O projeto foi aprovado pela Câmara dos Deputados na madrugada de quarta-feira (18). O seu conteúdo principal é semelhante ao dos seus antecessores a medidas provisórias 844/2018 e 868/2018 (que perderam a validade) e PL 3.261/2019 (que foi arquivado para dar prioridade ao PL 4.162). Os objetivos do texto são centralizar a regulação dos serviços de saneamento na esfera federal, instituir a obrigatoriedade de licitações e regionalizar a prestação a partir da montagem de blocos de municípios.

A nova regulamentação do saneamento está em discussão desde 2018. O modelo proposto abre mais caminho para o envolvimento de empresas privadas no setor, e é justamente esse ponto que tem travado as negociações. Parlamentares da oposição alegam que a exigência de licitações e as metas de desempenho para contratos tenderão a prejudicar e alienar as empresas públicas. Além disso, o projeto de lei estabelece prioridade no recebimento de auxílio federal para os municípios que efetuarem concessão ou privatização dos seus serviços.

Os impasses políticos fizeram com que as duas medidas provisórias (MPs) que tratavam do assunto não chegassem a ser pautadas na Câmara dos Deputados. O Congresso decidiu que o novo marco deveria vir de um projeto de lei. O senador Tasso Jereissati, que foi o relator da MP 868, apresentou o PL 3.261. Esse texto foi aprovado pelo Senado em junho, mas foi arquivado pela Câmara, que privilegiou o PL 4.162, de autoria do Executivo.

Essa decisão foi tomada para que os deputados possam ter a palavra final sobre o marco regulatório. Na análise de um projeto de lei, a Casa do Congresso onde o caminho se inicia tem a prerrogativa de recebê-lo de volta se a outra fizer alguma mudança, e de decidir se aceita ou rejeita essa mudança.

Para o líder do governo, senador Fernando Bezerra Coelho (MDB-PE), o projeto deve ser aprovado até o final de fevereiro, mas ainda é cedo para avaliar se os senadores farão alguma alteração. Ele avalia que, depois de todas as tentativas anteriores, o acordo político amadureceu.

— O texto da Câmara chega com força aqui porque houve um entendimento com os governadores. Há grandes chances de termos uma votação rápida no Senado.

Contratos

A principal novidade introduzida pelo projeto é o fim dos contratos de programa, instrumentos pelos quais os municípios transferem a execução dos seus serviços de saneamento para empresas públicas dos governos estaduais. Os contratos contêm regras de prestação e tarifação, mas permitem que as estatais assumam os serviços sem concorrência. Em lugar deles, entrarão as licitações, envolvendo empresas públicas e privadas.

Os contratos de programa que já estão em vigor serão mantidos, e, até março de 2022, poderão ser prorrogados por 30 anos. No entanto, esses contratos deverão comprovar viabilidade econômico-financeira, ou seja, as empresas devem demonstrar que conseguem se manter por conta própria — via cobrança de tarifas e contratação de dívida.

Os contratos também deverão se comprometer com metas de universalização a serem cumpridas até o fim de 2033: cobertura de 99% para o fornecimento de água potável e de 90% para coleta e tratamento de esgoto. Essas porcentagens são calculadas sobre a população da área atendida.

Outros critérios também deverão ser atendidos, como não interrupção dos serviços, redução de perdas e melhoria nos processos de tratamento. O cumprimento das metas será verificado periodicamente, e as empresas que estiverem fora do padrão poderão sofrer sanções do órgão regulador. Além disso, elas não poderão distribuir lucros e dividendos, caso tenham essa prática.

Blocos

Para viabilizar economicamente a prestação para cidades menores, mais isoladas ou mais pobres, o projeto determina que os estados componham grupos de municípios, ou “blocos”, que contratarão os serviços de forma coletiva. Municípios de um mesmo bloco não precisam ser vizinhos. A adesão é voluntária — uma cidade pode optar por não ingressar no bloco estabelecido para ela e licitar sozinha.

A opção por deixar o bloco não constava no projeto do Senado. Para Fernando Bezerra Coelho, essa distinção foi um fator importante para que os deputados decidissem avançar o próprio projeto.

— Do ponto de vista constitucional, o titular do serviço é o município. Alguns na Câmara entendiam que [a adesão obrigatória] poderia estar diminuindo os direitos dos municípios de decidirem sobre a sua concessão. O texto que saiu da Câmara empodera mais os municípios.

O líder do governo observou que o Senado tem relações mais próximas com os governos estaduais, e por isso o seu texto dava mais força aos blocos formados pelos estados. Ao ficar com a palavra final, a Câmara mantém o controle sobre essa questão. Bezerra entende que essa manobra, porém, não deve atrapalhar a tramitação do projeto.

Papel federal

A regulação do saneamento básico do Brasil vai ficar a cargo da Agência Nacional de Águas (ANA), uma agência federal. O projeto exige dos municípios e dos blocos de municípios que implementem planos de saneamento básico, e poderá oferecer apoio técnico e ajuda financeira para essa tarefa.

Esse apoio, no entanto, estará condicionado a uma série de regras, entre as quais estão a adesão ao sistema de prestação regionalizada e à concessão ou licitação da prestação dos serviços, com a substituição dos contratos vigentes.

As cidades que forem atendidas por estatais que serão privatizadas podem não concordar com a transferência dos serviços para a iniciativa privada. Nesse caso, elas deverão assumir a prestação e pagar indenização por investimentos já feitos que ainda não tenham sido quitados.

O projeto ainda torna ilimitada a participação da União em fundos de apoio à estruturação de parcerias público-privadas, de modo a facilitar essa modalidade para os estados e municípios. Atualmente, o limite de participação do dinheiro federal nesses fundos é de R$ 180 milhões.

Outros dispositivos

  • Subsídio: Famílias de baixa renda poderão receber subsídios tarifários ou não tarifários para cobrir os custos do fornecimento dos serviços de saneamento para suas residências. Elas também poderão ter gratuidade na conexão à rede de esgoto
  • Lixões: o projeto estende os prazos da Política Nacional de Resíduos Sólidos (Lei 12.305, de 2010) para que as cidades encerrem os lixões a céu aberto. Os novos prazos vão de 2021, para capitais e suas regiões metropolitanas, até 2024, para municípios com até 50 mil habitantes.
  • Tarifas: os municípios e o Distrito Federal deverão passar a cobrar tarifas sobre outros serviços de asseio urbano, como poda de árvores, varrição de ruas e limpeza de estruturas de drenagem de água da chuva. Se não houver essa cobrança depois de um ano da aprovação da lei, isso será considerado renúncia de receita e o impacto orçamentário deverá ser demonstrado. Esses serviços também poderão integrar as concessões.

Agência Senado (Reprodução autorizada mediante citação da Agência Senado)