Para debatedores, MP do Contrato Verde e Amarelo retira direitos e precariza relações de trabalho

Da Redação | 02/12/2019, 16h23

A desoneração da folha de pagamento determinada pela Medida Provisória (MPV) 905/2019 reduzirá ainda mais os direitos dos trabalhadores, precarizando as relações de trabalho no Brasil, disseram nesta segunda-feira (2) os participantes de audiência pública da Comissão de Direitos Humanos e Legislação Participativa (CDH), sobre os efeitos da “MP do Contrato Verde e Amarelo”.

De acordo com o governo, o objetivo da MP é o de criar novas vagas de emprego, com incentivos à contratação de trabalhadores entre 18 e 29 anos de idade, no período de 1º de janeiro de 2020 a 31 de dezembro de 2022. Entre outras medidas, estabelece isenções fiscais aos empregadores e modifica a legislação trabalhista para estimular o primeiro emprego (com salário limitado a 1,5 salário mínimo por mês). Entre as mudanças legais determinadas pela MP, está a que institui a contribuição previdenciária de 7,5% do seguro-desemprego.

Na avaliação do Técnico do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Sócio Econômicos (Dieese), Clóvis Scherer, a afirmação do governo de que a desoneração da folha de pagamento vai assegurar a geração de milhões de empregos é contraditória. De acordo com dados que apresentou, esse tipo de medida proporcionou resultado muito limitado, nos últimos anos, diante da grande renúncia fiscal. Conforme números do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), para o ano que vem, o projeto de Lei Orçamentária projeta uma desoneração de R$ 331 bilhões. Desse total, R$ 70 bilhões são referentes a contribuição previdenciária, perda que, segundo Clóvis Scherer, não contradiz os argumentos usados pelo governo para a aprovação da reforma da Previdência e da edição da Medida Provisória 905/2019.

— É de se questionar, se ao invés de ter havido essa desoneração, tivesse se mantido a tributação e utilizado os recursos arrecadados para promover o investimento. Talvez o resultado em termos de geração de emprego e melhoria da condição econômica do país tivesse sido diferente. (...) os investimentos têm um efeito econômico em termos de multiplicador muito maior do que qualquer medida de redução da tributação no Brasil. É muito melhor você investir do que reduzir tributos — afirmou Scherer.

Assessor de Estudos Socioeconômicos da Associação Nacional dos Auditores Fiscais da Receita Federal do Brasil (Anfip), Vanderley José Maçaneiro observou que as desonerações autorizadas por meio da Lei 12.546, de 2011 foram inócuas e representam, até hoje, um exemplo de um manual de “como não fazer”. Ao lembrar que, somente em 2018, quase 4% do Produto Interno Bruto (PIB) foram gerados por meio da arrecadação de contribuições da folha de pagamento, ele questiona qual o impacto econômico dessa medida para diversos setores.

— O governo até agora não mostrou estudo para identificar o impacto na Seguridade Social, na Previdência de forma específica, no mercado de trabalho, na competitividade, na saúde — acrescentou.

A precarização do trabalho, a falta de garantia ao trabalhador e a inexistência de uma política de investimento voltada para a capacitação e modernização das relações trabalhistas foram as principais críticas apresentados pelo diretor de Assuntos Parlamentares da Nova Central Sindical dos Trabalhadores (NCST), Luiz Gonzaga de Negreiros. Para ele, a MP da Carteira Verde e Amarela é injusta por assegurar vantagens para o empregador sem que, para isso, o trabalhador seja beneficiado.

— A visão que o país chegou é a seguinte: precarizar, destruir, retirar para sobrar para o outro lado. É um jogo totalmente desigual. É uma visão de aniquilar com o trabalho. Nós estamos voltando verdadeiramente ao século 17, onde os trabalhadores não tinham direito algum — criticou.

Seguro-desemprego

O secretário-executivo da Intersindical — Central da Classe Trabalhadora, Edson Índio, disse que a nova relação de contrato de trabalho estabelecida pela MP é mais uma iniciativa inconstitucional apresentada pelo governo, que busca beneficiar os grandes empresários com a isenção de impostos e penalizar o desempregado, taxando-o. Ele considerou absurdo onerar os desempregados com o pagamento da contribuição previdenciária quando acessarem o seguro-desemprego.

— Ela não apenas só desonera as empresas de obrigações, de contribuições para a Previdência Social, da contribuição do FGTS, mas ela se constitui em uma nova reforma trabalhista que vai, a rigor, precarizar ainda mais o mercado de trabalho, vai barbarizar ainda mais as relações de trabalho no Brasil, vai fragilizar o trabalho no Brasil, fragilizar sobretudo o emprego formal, quando a gente sabe que o trabalho formal é a porta de entrada da proteção social no Brasil e nos países mais desenvolvidos no mundo — alertou.

Também contrário à MP, o Representante da Central Única dos Trabalhadores (CUT-Nacional), Alexandre Ferraz, criticou o fim da contribuição do Salário Educação e da contribuição do Sistema S das empresas que contratarem nesse novo modelo de trabalho. Para ele, sem o recurso, o jovem aprendiz não terá preferência nas ações de qualificação.

— Ele extingue o recurso para qualificação e fala que o trabalhador vai ter prioridade na qualificação? Com que recurso? Se hoje o governo já não oferece qualificação alguma. Os programas de qualificação do FAT receberam zero de recurso orçamentário, ou praticamente zero. Ou seja, qual a efetividade disso? É só uma letra morta? Não. A gente precisa realmente dá uma condição para que todo o trabalhador contratado nessa modalidade, para todo jovem trabalhador tenha a oportunidade de aprendizado na escola, para que ele não saía da escola, e também tenha o aprendizado na empresa — argumentou.

Inconstitucionalidade

Para o senador Paulo Paim (PT-RS) — que presidiu a audiência pública e foi um dos autores do requerimento para sua realização — ao alterar 135 artigos da CLT, a MP 905/2019 é considerada inconstitucional por grande parte dos parlamentares e, por este motivo, muitos defendem a rejeição do texto pelo presidente do Senado, Davi Alcolumbre, na qualidade de presidente do Congresso.

— Porque há uma série de incompreensões, de inconstitucionalidades, de ilegalidades. É imoral, irracional e inconstitucional (...) Esperamos agora que ela [comissão mista da MP] não seja nem instalada. Se for instalada, só eu já apresentei 60 emendas — afirmou.

Até o momento, são cerca de 2 mil emendas apresentadas para mudar o texto. Entre outras mudanças, a MP aumenta a jornada de trabalho dos bancários e a possibilidade de abertura dos bancos aos sábados, promove a negociação individual e a fragmentação das normas por meio de Acordos Coletivos de Trabalho (ACTs), retira o sindicato das negociações de PLR (Participação nos Lucros e Resultados) e amplia o número máximo de parcelas, de duas para quatro, ao longo do ano, entre outros pontos.

Agência Senado (Reprodução autorizada mediante citação da Agência Senado)