Senado brigou por PEC paralela na última grande reforma da Previdência

Da Redação | 05/09/2019, 19h15

Nesta quarta-feira (4) a Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) aprovou a reforma da Previdência (PEC 6/2019) com a criação de um segundo texto, que abrigará as intervenções do Senado. A chamada PEC paralela (PEC 133/2019) é um recurso para fazer mudanças na reforma sem interromper a sua tramitação. O expediente foi adotado também na última grande reforma previdenciária, em 2003.

Parlamentares que se opõem a aspectos da reforma de 2019 já manifestaram receio de que a PEC paralela acabe esquecida depois que o texto principal for promulgado. A história mostra que essa preocupação não é infundada. A primeira PEC paralela levou mais de um ano para ser aprovada, e os senadores tiveram que brigar pelo seu andamento.

A reforma da Previdência de 2003 (Emenda Constitucional 41), articulada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva, teve como principais resultados a extinção da aposentadoria integral no serviço público e da paridade de reajustes para servidores aposentados, além da instituição de cobrança para servidores aposentados e pensionistas. Também criou o abono de permanência.

Durante a análise, o relator da reforma, ex-senador Tião Viana (AC), reuniu emendas de parlamentares críticos à proposta em um segundo texto. O acordo foi aprovar o conteúdo principal, que já tinha o aval da Câmara dos Deputados, e enviá-lo para promulgação, enquanto as intervenções dos senadores tramitariam separadamente.

A PEC paralela foi apresentada em outubro de 2003, no dia seguinte à rejeição formal das emendas. Seus apoiadores eram tanto oposicionistas interessados em desidratar a reforma quanto integrantes da própria base que divergiram do governo no processo, como Paulo Paim (RS) e Serys Slhessarenko (MT). A primeira signatária foi Ideli Salvatti (SC), que nos meses seguintes se tornaria a líder do PT na Casa.

Nem todos os governistas que se opunham à reforma aceitaram o acordo que resultou na PEC paralela. A ex-senadora Heloísa Helena (AL) classificou a negociação como uma “farsa política” e uma “mentira”. Ela também afirmou acreditar que o novo texto sequer seria votado porque em breve teria início um ano eleitoral. Em 2004, Helena deixaria o PT e seria uma das fundadoras do PSOL, partido que nasceu, em parte, por causa das dissidências provocadas por aquela reforma previdenciária.

A nova PEC, de início, continha critérios diferenciados de contribuição e benefícios para servidores com doenças graves ou necessidades especiais, e delegava aos estados a responsabilidade de legislar sobre as aposentadorias dos seus policiais. Também trazia mecanismos de controle social sobre os regimes previdenciários.

Coube a Tião Viana relatar também a PEC paralela, que foi aprovada no Senado apenas seis dias depois da conclusão do texto principal da reforma. Como já era o fim do mês de dezembro, os senadores se mobilizaram em favor de uma convocação extraordinária do Congresso durante o recesso parlamentar, para garantir que a PEC não perderia o impulso.

A convocação de fato aconteceu, mas a proposta acabou não sendo votada. Foi o primeiro revés na tramitação da PEC paralela. Ela passou todo o ano de 2004 parada na Câmara dos Deputados. A comissão especial montada para a PEC esgotou o seu prazo sem analisá-la. Encaminhada direto para o Plenário, a proposta ficou em impasse depois que o relator, deputado José Pimentel (CE) — então vice-líder do PT na Câmara — apresentou um parecer que alterava diversos pontos do texto.

Senadores reagiram às sinalizações dos deputados. Paulo Paim disse que estava em curso um “golpe” no Senado e lembrou que havia demonstrado confiança no líder do governo, Aloizio Mercadante (SP), ao rejeitar oferta para registrar por escrito os termos do acordo que produzira a PEC. Já Serys Slhessarenko chegou a acusar Pimentel, seu colega de partido, de “traição”, e falou em cobrar a sua saída da função de relator se ele não cumprisse o combinado.

A proposta acabou aprovada apenas em março de 2005. Com a pressão dos senadores, ela manteve os seus dispositivos originais e trouxe, ainda, a garantia de integralidade e paridade para servidores ainda na ativa, além de algumas regras de transição. O Senado confirmou as mudanças e, em julho de 2005, o material foi promulgado (Emenda Constitucional 47).

Inspiração

A PEC paralela de 2019 segue o mecanismo usado em 2003, mas alguns detalhes importantes serão diferentes neste caso. Para começar, a proposta já foi dada como aprovada pela CCJ, de modo que ela pode seguir diretamente para o primeiro turno de discussão e votação em Plenário.

A proposta de 2003 foi apresentada do zero a partir das emendas dos senadores, passou pelo crivo da CCJ e só depois seguiu para o Plenário. No caso de agora, como a PEC paralela foi desmembrada de elementos do relatório da PEC principal, a comissão decidiu aproveitar as etapas de tramitação já cumpridas.

A atual presidente da CCJ, senadora Simone Tebet (MDB-MS), defendeu essa decisão afirmando que as deliberações já estavam maduras e o colegiado é unânime em relação ao avanço da PEC paralela.

— Ela só não existia formalmente, mas existia em relação ao conteúdo, que foi discutido. Não tinha sentido, depois de todo o debate, ela voltar para o relator falar a mesma coisa.

Tanto a PEC 6/2019 quanto a PEC 133/2019 entram agora em fase de recebimento de emendas perante o Plenário. O relator da reforma, senador Tasso Jereissati (PSDB-CE), recolherá os dois textos com as suas respectivas sugestões e oferecerá, primeiro, o parecer sobre a PEC principal. Depois disso ele se debruçará sobre a PEC paralela, e poderá, inclusive, convocar audiências públicas na própria CCJ para aprimorar o conteúdo.

O presidente do Senado, Davi Alcolumbre, espera aprovar o texto primário da reforma da Previdência já na próxima semana. A PEC paralela, no entando, pode ser concluída até o final do mês. Depois, ela será enviada para a Câmara dos Deputados.

Agência Senado (Reprodução autorizada mediante citação da Agência Senado)