Alto preço das passagens aéreas causa polêmica em audiência pública

Da Redação | 06/08/2019, 16h25

O preço das passagens aéreas disponibilizadas ao consumidor brasileiro, especialmente o da maioria dos trechos que atendem os deslocamentos internos, tem assustado e provocado indignação em quem precisa viajar a trabalho, para visitar um parente ou mesmo de férias. O fato de as tarifas em geral não pararem de subir fez com que a Comissão de Infraestrutura do Senado (CI) chamasse agentes reguladores e o governo para debaterem o problema nesta terça-feira (6).

Falência da Avianca

O presidente da Agência Nacional de Aviação Civil (Anac), Ricardo Botelho, e os dois representantes ligados diretamente ao governo federal, Andrey Vilas Boas (Secretaria Nacional do Consumidor-Senacon) e Cesar Matos (Ministério da Economia), ressaltaram que o mercado ainda é fortemente afetado pela falência da Avianca, que se reflete, entre outras consequências, no aumento dos preços das passagens devido à menor concorrência.

O fato do Brasil ter um mercado altamente concentrado, hoje atendido internamente basicamente por apenas 3 grandes companhias, é percebido como um fator estrutural desta baixa concorrência. Por isso os representantes do governo e da Anac defendem medidas como a abertura de 100% do mercado para empresas estrangeiras, entre outras diretrizes liberalizantes, que devem resultar no futuro num melhor atendimento ao consumidor brasileiro. A abertura total deste mercado aos estrangeiros foi aprovada recentemente pelo Congresso Nacional.

Botelho e Vilas Boas também reclamaram do monopólio da Petrobras na comercialização do querosene de aviação (QAV), o principal item de custo das companhias aéreas.

— Enquanto não tratarmos de forma consistente a maneira como o combustível de aviação é fornecido, não vai mudar a estrutura de preços das passagens no Brasil. A produção e distribuição é totalmente monopolizada, outras empresas chegam a obter ações na Justiça para distribuir QAV nos aeroportos, mas não operam porque a estrutura não fica disponível. Mesmo que o Brasil consiga atrair empresas low cost (de baixo custo), elas também vão esbarrar neste gargalo estrutural — criticou Vilas Boas.

As empresas de aviação low cost são muito comuns na Europa, operam no menor custo operacional possível e, por isso, conseguem praticar preços muito acessíveis de passagens aéreas. Vilas Boas ressaltou que diversos estados reduziram ou até zeraram a cobrança do ICMS no combustível de aviação, mas para ele, mesmo medidas como esta acabam não causando ganhos mais relevantes ao consumidor final, devido ao alto custo do QAV.

Preços internacionais

A observação de Vilas Boas provocou reações nos senadores Katia Abreu (PDT-TO) e Jean Paul Prates (PT-RN). Eles criticaram a política de preços da Petrobras, que se baseia na cotação internacional para definir o preço do QAV no mercado interno.

— O preço do querosene está muito alto porque foi atrelado às cotações praticadas na bolsa do golfo do México. Se sobe lá, sobe aqui também. Essa política precisa mudar. Governadores de estados pobres abriram mão do ICMS, porque a Petrobras não pode lucrar um pouco menos e beneficiar a população brasileira? Somos auto-suficientes, porque temos que seguir a bolsa do México? É produzido aqui, esta política da Petrobras é injustificável — reclamou Kátia.

Para Jean Paul Prates, há uma orquestração no governo visando responsabilizar supostas atuações monopolísticas da Petrobras por diversos problemas do país. O senador lembrou que desde 1997 qualquer empresa privada pode importar QAV, sendo que a Shell e a British Petroleum (BP) já atuam neste mercado.

— Aí vem o governo reclamar que estas empresas não tem o market share local da Petrobras. É claro, assim como a Petrobras também não tem a dominância que a BP tem na Inglaterra, ou que a Petronas tem na Malásia. O mercado é livre, a BP importa QAV quando ela quiser. Aí reclamam que ela não pode usar a estrutura da Petrobras. Então que construam a deles, caramba! Obrigar a Petrobras a entregar sua estrutura, como estão fazendo nas refinarias, pra abrir mercado pros estrangeiros, é demais! Toda a malha de gasodutos do Norte e Nordeste foi vendida pra uma empresa francesa (a Engie), sem qualquer contrapartida de investimento. Vendemos a casa pra pagar o aluguel. O QAV é caro porque apesar de sermos auto-suficientes, resolvemos pagar em dólar seguindo cotações internacionais. Como se fôssemos o Japão, que precisa importar tudo — protestou Prates.

Kátia acrescentou que hoje o QAV responde por quase 32% do custo das empresas aéreas. Na resposta aos senadores, Vilas Boas admitiu que a importação de QAV é um mercado aberto, mas para ele a Petrobras estruturou um monopólio na prática, levando a margens abusivas de lucros por diversos atravessadores na cadeia interna. Além disso, ela também atua na importação, finalizou o representante da Senacon.

Tickets caros

Kátia e Prates sugeriram que a ANAC realize um acompanhamento e monitoramento da formação do preço das passagens aéreas praticado pelas companhias. Kátia considera "incompreensível" a ANAC já não atuar neste sentido, pois monitoramentos semelhantes são feitos pelas outras agências reguladoras em suas áreas de atuação.

Ficou decidido que a CI realizará uma nova audiência ainda este mês, desta vez chamando representantes da Petrobras, das empresas de aviação e outros representantes do governo. O fato do governo já ter R$ 21 bilhões num fundo destinado ao desenvolvimento da aviação regional, mas que não é usado visando fazer superavit primário, é outro ponto de questionamento.

Os senadores não descartam pedir a abertura de uma CPI, no futuro próximo, para investigar a formação do preço das passagens aéreas, algo marcado por absoluta falta de transparência, segundo eles. O representante do Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) na audiência, Ricardo Castro, informou que o órgão já vem investigando preços praticados em Natal e Palmas, a partir de requerimentos enviados recentemente por senadores.

Agência Senado (Reprodução autorizada mediante citação da Agência Senado)