Em audiência na CCJ, relator defende rigidez e cautela no acesso a armas

Rodrigo Baptista | 04/07/2019, 16h44

Após conduzir audiência pública nesta quinta-feira (4) na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ), o senador Alessandro Vieira (Cidadania-SE) disse ter ficado evidente que a posse — ou seja, a manutenção de arma para proteção da residência — é mais tolerada pela sociedade do que o porte (direito de circular com armas). Ele ressaltou, contudo, que é preciso avaliar a inclusão de critérios mais rígidos para acesso a armamentos e munições. O senador também estuda medidas que tornem mais eficaz o rastreamento de armas e balas.

— Há necessidade de ter muito rigor e cautela na liberação; há exigências técnicas. O que vamos fazer é buscar um parâmetro — apontou Alessandro Vieira.

Após rejeitar o decreto das armas do governo, o Senado trabalha em um projeto de revisão do Estatuto do Desarmamento (Lei 10.826, de 2003). Escolhido por lideranças partidárias para relatar a futura proposta, o senador Alessandro Vieira ouviu na audiência pública representantes de diversos setores da sociedade sobre a situação do registro, posse e porte de armas no Brasil.

Alessandro, que foi o relator do projeto de lei que estende a posse de armas na zona rural para toda a área das propriedades (PL 3.715/2019), aprovado pelo Senado na semana anterior, também assumiu a tarefa de relatar o PL 3.713/2019. A proposta — batizada de PL das Armas — foi apresentada por senadores do PSL e pelo líder do governo, senador Fernando Bezerra (MDB-CE), e praticamente repete o teor dos decretos editados no primeiro semestre deste ano pelo presidente da República, Jair Bolsonaro. Mas o relator já adiantou que pretende construir um texto equilibrado que considere sugestões da sociedade civil e de parlamentares, incluindo medidas previstas em outros projetos sobre armas.

Acesso a armas

Durante a audiência, o delegado Kleber Silva Júnior, do Conselho Nacional dos Chefes da Polícia Civil, defendeu o direito à proteção individual e do lar. Ele admitiu que as forças de segurança pública têm limitações e também pediu mudanças na legislação para não criminalizar o instituto da legítima defesa.

— O crime no âmbito do domicílio é crime em um solo sagrado. Os trabalhadores da segurança pública não têm o dom da onipresença — defendeu.

Para Michelle dos Ramos, da organização não governamental Igarapé, "não podemos cair na armadilha de defender o porte civil como solução para a segurança pública".

— Em nenhum lugar do mundo armar a população foi exitoso no combate ao crime organizado — apontou.

Especialista em segurança e coronel da reserva da Polícia Militar do Ceará, Plauto Ferreira considera que fatores diferentes contribuem para o aumento da violência e que colocar a arma na mão dos cidadãos é um fator de risco:

— Será um salve-se quem puder, um retrocesso social. Nosso país não está preparado, especialmente diante de todo o cenário de políticas públicas deficitárias — alertou.

Mas o senador Major Olímpio (PSL-SP) avalia que o Estatuto do Desarmamento, de 2003, foi em parte responsável pelo aumento da violência nos últimos anos “pois deu ao criminoso a certeza de que não seria molestado”. Para ele é fundamental reforçar o direito à legítima defesa.

— O cidadão vai fazer a sua opção de ter ou não arma. A política de segurança pública não existe — avaliou.

O senador Eduardo Girão (Podemos-CE) tem entendimento diferente. Ele citou dados do Mapa da Violência que apontam que a legislação que restringiu a  posse e o porte de armas ajudou a salvar mais de 120 mil vidas. Na avaliação do senador, é um risco grande para o cidadão andar armado.

— A tendência é [o cidadão] ser a vítima da arma por isso que as polícias do mundo inteiro dizem: nunca reaja ao assalto por que a possibilidade de perder a sua vida é muito grande. Outra tendência é de perder essa arma, que vai migrar para o crime — argumentou.

Novas regras

Apesar de reconhecerem como legítimo direito do cidadão, Girão e outros parlamentares defendem maior rigor para a posse de armas. É o caso do senador Styvenson Valentim (Podemos-RN), autor da proposta que exige toxicológico para servidores da área de segurança pública (PEC 87/2019). Ele considera que as restrições para civis obterem autorização devem ser mais duras.

Ele, o senador Esperidião Amin (PP-SC) e outros parlamentares relataram que foram ameaçados de morte nas redes sociais por terem votado contra os decretos do governo. Para Styvenson a realização de exames médicos periódicos e a investigação do perfil na internet devem ser critérios para a autorização da posse de arma.

— Vamos colocar emendas nesse projeto. Nos Estados Unidos, hoje, para entrar no país deles, tem investigação de redes sociais. Você, que manda mensagem agressiva, que manda mensagem violenta que fica transpirando violência, é para isso que você quer arma? Não é para proteção, para autodefesa? — disse o senador.

Rastreamento

Representantes de caçadores, atiradores esportivos e colecionadores (CACs) pediram que seja mantida previsão que consta nos decretos do governo que facilitam o acesso a munição e transporte de armas de fogo para esse grupo. Jodson Edington Junior, vice-presidente da Confederação Brasileira de Tiro Esportivo, disse que a quantidade de armas e de munição autorizado é insuficiente para treinos.

Felipe Angelli, do Instituto Sou da Paz, afirmou que é preciso melhorar o rastreamento de armas e munições em circulação no país, que muitas vezes caem nas mãos de criminosos. De acordo com o coronel Dimas Silvério da Silva, do Exército, o Brasil é um dos poucos países que marca munições.

— Atualmente, a cada 10 mil munições o lote muda e esse lote tem que ser vendido a um órgão específico — assinalou.

Consulta na internet

Na audiência desta quinta-feira, o senador Alessandro Vieira anunciou que abriu uma consulta online para colher sugestões e opiniões da sociedade brasileira a respeito do tema. Para participar e enviar uma contribuição, basta acessar https://pldasarmas.com.br/

Agência Senado (Reprodução autorizada mediante citação da Agência Senado)