Senadores defendem maior transparência na gestão da dívida pública

Da Redação | 25/06/2019, 17h29

A administração da dívida pública brasileira tem preocupado integrantes da Comissão de Assunto Econômicos (CAE). Eles receberam especialistas e representantes do governo, nesta terça-feira (25), para tratar do assunto. Além da falta de transparência, outros problemas foram apontados, como as elevadas taxas de juros e o alto percentual do débito em relação ao Produto Interno Bruto (PIB), que em abril bateu 78,8% (os dados de maio serão divulgados no dia 28 pelo Banco Central).

O senador Alvaro Dias (Podemos-PR) lembrou que mais grave do que o tamanho do endividamento foi a situação em que ocorreu, visto que não houve investimentos, como costuma ocorrer em outros países.

— Estamos devendo e muito em relação a uma administração competente. Outras nações se endividaram, mas investiram. E hoje colhem os resultados e podem pagar com segurança e tranquilidade. É o grande desafio do momento desse país, pois de nada adiantarão as outras reformas, se não chegarmos a uma equação para uma administração eficiente da nossa gigantesca dívida pública em relação ao PIB — afirmou.

O representante do Tribunal de Contas da União (TCU), Alessandro Aurélio Caldeira, informou que a Dívida Bruta do Governo Geral (DBGG) saltou de R$ 1,9 trilhão em 16 anos anos, passando de R$ 2,9 trilhões em 2000, para R$ 4,8 trilhões em 2016, um aumento de 65%. Entre os fatores determinantes para a piora do cenário, estão os juros e o comportamento das receitas e despesas no período, que resultam em piora crescente do resultado nominal.

— De 2002 a 2014, na média, para cada R$ 1 de incremento da despesa, a receita aumentou R$ 0,85. Considerando apenas de 2011 a 2014, para cada R$ 1 de incremento da despesa, a receita aumentou somente R$ 0,62 — afirmou.

Ponto de equilíbrio

O diretor-executivo da Instituição Fiscal Independente do Senado (IFI), Felipe Salto, lembrou que todos os países têm dívida. A diferença é que os mais desenvolvidos podem captar recursos oferecendo juros mais baixos e garantindo, assim, que se possa emitir dívida nova e rolar os papéis vincendos com custos e prazos bastante vantajosos em relação aos de países onde não estão presentes estas condições. Há de se considerar também, segundo ele, que juros mais baixos dependem da percepção de risco dos agentes econômicos e das condições de oferta e demanda da economia.

— O que tem acontecido com essa estratégia nossa de não conseguir fazer o ajuste fiscal? O investimento vem despencando porque governo atrás de governo, seja de esquerda, seja de direita, tem que espremer o investimento para conseguir sustentar o aumento do gasto obrigatório. O investimento na década de 1970 era de 10,5% do PIB; hoje, ele está em 1,7% do PIB — explicou.

Para Felipe Salto, o Brasil é pródigo em criar regras fiscais, mas não tão pródigo em cumpri-las. Para ele, o teto de gastos foi o último avanço em 2016, mas, sozinho, não resolve.

— Por que que os países desenvolvidos podem ter níveis elevados de dívida, e nós não podemos? Porque eles têm um custo de endividamento muito mais baixo. Juros muito mais baixos. E por que não abaixamos nossos juros? Porque para fazer isso sem gerar inflação, temos que tirar os fatores de pressão que basicamente vêm do setor público. Nós gastamos demais. Isso gera pressão inflacionária. E não sobre só os preços administrados, sobre os preços livres também — esclareceu.

Divergência

A coordenadora nacional da Auditoria Cidadã da Dívida, Maria Lúcia Fatorelli, fez duras críticas à política monetária do Banco Central e disse que os gastos financeiros — como o pagamento de juros, por exemplo — são os que mais pesam, e não os gastos sociais, com pagamento de pessoal ou Previdência.

Para ela, a dívida pública se tornou um grande negócio financeiro. Além disso, a necessidade de pagar os encargos da dívida ainda tem sido usada como justificativa para ações políticas, como privatizações, decisões a favor dos bancos, contingenciamentos drásticos e rigoroso ajuste fiscal, que impedem o funcionamento do Estado.

— Vários dados oficiais provam que o juro é o maior responsável pelo aumento da dívida: tabela do Banco Central, relatório da CPI, relatório do TCU. Olhem lá, R$ 3 trilhões foi a apropriação de juros. Essa elevação de juro para controlar a inflação não tem respaldo. Diversas economias do mundo provam isso. Os juros sobem para transferir dinheiro para o setor financeiro. Enquanto o PIB cai, as empresas quebram, o desemprego bate recordes, e o lucro dos bancos não para de subir — afirmou a especialista, que também reclamou da falta de transparência da administração da dívida.

A senadora Zenaide Maia (Pros-RN) seguiu a mesma linha e queixou-se dos privilégios dos bancos em detrimento dos investimentos. Também criticou dificuldade de se auditar a dívida e o fato da redução da taxa Selic não chegar ao povo. Ainda segundo ela, a inflação está controlada muito mais por conta da recessão. A parlamentar defendeu ainda investimentos em setores como infraestrutura e construção civil, capazes de gerar grande número de empregos.

Transparência

O subsecretário da Dívida Pública da Secretaria do Tesouro Nacional, José Franco Medeiros de Moraes, negou haver falta de transparência em relação ao assunto, visto que, segundo ele, informações são divulgadas mensalmente pela internet. Além disso, acrescentou, são feitas auditorias constantes. Desde 2010, foram 31 auditorias do Tribunal de Contas da União e sete da Controladoria-Geral da União (CGU).

— A informação está disponível, só que o Tesouro divulga as suas; o BC as dele e os estados e municípios também. O que o Tesouro está fazendo? Construindo um único sistema para acoplar essa informação que está de certa maneira fragmentada — explicou.

Depois de dar detalhes técnicos sobre o endividamento público do governo, o técnico do Tesouro disse que o objetivo da gestão da dívida pública é "suprir de forma eficiente as necessidades de financiamento do governo federal, ao menor custo no longo prazo, respeitando-se a manutenção de níveis prudentes de risco". Segundo ele, o tema é muito complexo e vira "campo fértil para equívocos".

— É um assunto muito complexo. Não se deixem enganar por soluções simples e que, na maioria das vezes, são equivocadas. O tema é demasiadamente sério para ser tratado dessa maneira — afirmou.

Para o senador Vanderlan Cardoso (PP-GO), que foi autor do requerimento para a audiência pública e presidiu o debate na CAE, a dívida pública e os juros que o Brasil paga ano a ano devem estar no topo das discussões sobre economia no país, à frente da reforma tributária e da reforma da Previdência.

— A reforma previdenciária é essencial, mas sozinha não resolverá o déficit orçamentário brasileiro — disse o senador, enfatizando que "o Brasil não pode continuar sendo escravo dos juros”.

Indicação

Antes da audiência, o senador Irajá (PSD-TO) leu seu relatório sobre a indicação de Fernanda Feitosa Nechio à diretoria do Banco Central do Brasil. O presidente da CAE, Omar Aziz (PSD-AM), concedeu vista coletiva e marcou a sabatina para o dia 2 de julho.

Agência Senado (Reprodução autorizada mediante citação da Agência Senado)