CPI de Brumadinho: ex-diretor da Vale diz que ‘não é onipresente’

Da Redação | 11/04/2019, 12h49

A CPI de Brumadinho ouviu nesta quinta-feira (11) o depoimento do ex-diretor-executivo de Ferrosos e Carvão da Vale S.A., Gerd Peter Poppinga. Diretamente ligado à presidência da empresa, ele é um dos dirigentes cujo afastamento foi pedido pelo Ministério Público Federal após o rompimento da barragem de Brumadinho (MG), em 25 de janeiro. Ele acabou deixando a mineradora no início de março.

Poppinga já responde a ação penal por ser, segundo o Ministério Público, um dos responsáveis pelas decisões da empresa Samarco que levaram ao rompimento da barragem de Fundão, no desastre de Mariana (MG), em 2015. Ao se pronunciar na abertura da CPI, o executivo afirmou que segurança sempre foi sua prioridade na Vale. Ele disse ter sido autor de iniciativas como a desativação de barragens “a montante” da mineradora e a criação da Gerência de Risco Geotécnico, além de conceder autorização a gerentes executivos da empresa para investimentos em projetos necessários à segurança.

— Estou profundamente abalado e quero, mais uma vez, expressar meus sentimentos a todos os familiares que perderam seus entes queridos. Tenho certeza de que os trabalhos desta CPI ajudarão a esclarecer os fatos — afirmou Poppinga.

Críticas

O senador Otto Alencar (PSD-BA) destacou que a comoção dos diretores da Vale não pode resultar em impunidade. Ele afirmou que a tragédia de Brumadinho foi uma repetição do desabamento da barragem em Mariana e alertou que outros ainda podem acontecer. Ao questionar se Poppinga tem levado uma vida normal, Otto Alencar ironizou a coragem dele em permanecer como interlocutor da Vale, “olhando nos olhos das vítimas da tragédia”, e perguntou se o ex-diretor continuará exercendo esse papel.

— Lamentar o que aconteceu e dizer que está comovido não vai resolver, até porque este é um problema com reincidência. Por muito menos, um pobre passando fome que assalta um mercado para levar comida para sua família está na cadeia — disse.

Otto frisou que, apesar de o rompimento da barragem em Brumadinho ter devastado a economia local, a Vale sequer pagou multas ambientais aplicadas pelo Ibama. Ao lembrar que não houve prisões após a tragédia em Mariana, o senador ponderou que “há uma rede de proteção em favor dos criminosos” no Brasil.

— O senhor Gerd responde por homicídio triplamente qualificado, crimes de inundação, desmoronamento, lesões corporais e isso tudo relacionado a três anos atrás. Mesmo assim, sua defesa tenta que o senhor não seja julgado por homicídio doloso, o que não tem como ser, na nossa opinião — disse o senador.

Poppinga respondeu que, por ainda não ter sido julgado, não pode ser considerado culpado do episódio em Mariana. Ele disse que é réu no processo somente por ter participado de duas reuniões do Conselho de Administração da Vale naquela ocasião, logo após ter retornado do exterior, onde morou por 16 anos. O executivo também disse que a Samarco era uma empresa de gestão independente e que nunca foi mencionado nenhum risco relacionado à barragem em Fundão. Em relação a Brumadinho, Poppinga informou que todos os laudos de estabilidade eram positivos.

— Sou absolutamente inocente e confio na capacidade da Justiça — declarou.

Já o senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP) disse ter a impressão de que a Vale é “uma empresa caótica, desorganizada e cuja hierarquia não funciona”. Ele criticou o fato de informações sobre os riscos de rompimento da barragem, com repercussões graves para a população e o meio ambiente, não terem chegado ao conhecimento da diretoria-executiva, como Gerd Poppinga deu a entender no depoimento.

Relator

O relator da CPI, senador Carlos Viana (PSD-MG), também criticou Gerd Poppinga por agir, segundo o parlamentar, “como se não soubesse de nada”. Ele questionou o executivo sobre quem eram os responsáveis pelas decisões que deveriam ter sido tomadas para salvar a vida de cerca de 300 pessoas atingidas pelo desastre em Brumadinho e também quem firmou os contratos entre a Vale e a empresa alemã de laudos de estabilidade TuvSud. Carlos Viana alertou para a possibilidade de responsabilização criminal de Poppinga ao omitir as informações.

Sem citar nomes, Poppinga respondeu que o monitoramento, manutenção e operação de cada reservatório é responsabilidade do setor geotécnico local. Ele disse que a contratação da TuvSud era supervisionada pelo setor de subsídios da Vale e, portanto, não poderia ser preciso na resposta. O executivo também disse ter “plena confiança” na equipe que escolheu e que, segundo afirmou, dispunha de recursos humanos e financeiros suficientes para as inspeções.

— Só não posso ser onipresente. Esse caso é semelhante ao de pilotos de aviões que, em situações de emergência, não podem ligar para o presidente da empresa na hora para saberem o que fazer. Nossas equipes estão aptas a agirem de forma autônoma e esse é o princípio que rege a gestão de Ferrosos [da Vale] — declarou.

Mais questionamentos

A reunião foi conduzida pelo senador Jorge Kajuru (PSB-GO), a pedido da presidente da CPI, a senadora Rose de Freitas (Pode-ES), que alegou não estar presente por motivos pessoais. Kajuru questionou Peter Poppinga sobre quem estaria financiando o escritório de advocacia contratado para defender os investigados pela CPI, mas não obteve resposta. Segundo o parlamentar, os honorários da defesa de cada representante da Vale têm custado cerca de R$ 5 milhões. Kajuru também perguntou se o setor dirigido por Gerd Poppinga tinha metas a serem alcançadas ou se visava apenas aos lucros.

O executivo explicou que a empresa tinha metas coletivas associadas aos resultados, metas estratégicas relacionadas à melhoria das vendas e metas específicas, relacionadas a questões de segurança. Poppinga confessou, no entanto, que já foi penalizado pela Vale, chegando a receber indicativo zero no quesito segurança e que outros diretores também já receberam nota negativa da mineradora.

Agência Senado (Reprodução autorizada mediante citação da Agência Senado)