Especialistas sugerem mudanças no projeto do novo Código Penal

Da Redação | 06/11/2017, 18h17

Especialistas em Direito apresentaram nesta segunda-feira (6) sugestões de mudanças ao projeto de lei do Senado (PLS) 236/2012, que reforma o Código Penal. Representantes de entidades de policiais, promotores, advogados, defensores públicos e juízes participaram de audiência pública da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ). O relator da proposta é o senador Antonio Anastasia (PSDB-MG).

O representante da Associação Nacional dos Defensores Públicos, Emanuel Queiroz Rangel, criticou medidas que, segundo ele, estimulam o encarceramento. Ele citou, por exemplo, o endurecimento de penas, a dificuldade para progressão de regime, a abolição do livramento condicional e a possibilidade de conversão de multa em prisão.

População carcerária

Para Rangel, o Brasil atravessa “uma epidemia de superencarceramento”. O defensor público apresentou dados do estado do Rio de Janeiro, onde a população carcerária aumentou de 24 mil pessoas em 2003 para 51 mil em 2016.

— Será que isso refletiu uma melhora da segurança pública para a população fluminense? Não acreditamos que um projeto que amplia o leque do Direito Penal vá dar o resultado que se espera. O resultado vai ser o agravamento do que já se encontra. A gente precisa tentar romper essa lógica do encarceramento como método — argumentou.

Criminalidade

O presidente da Associação Nacional dos Delegados da Polícia Federal, Carlos Eduardo Sobral, rebateu. Ele disse que o Código Penal “é um instrumento de promoção da segurança pública” e que “há um clamor grande da sociedade para enfrentar a criminalidade”.

Sobral reconheceu que políticas públicas podem reduzir os índices de violência. Mas, segundo ele, os resultados dessas medidas podem demorar até 20 anos para aparecer.

— Onde há o Estado, o índice de criminalidade diminui. Mas o que fazer até o pleno funcionamento de boas políticas públicas de segurança, saúde e educação? Se chegarmos à conclusão de que temos criminosos que devem estar presos para proteger a sociedade, a solução não é o desencarceramento. A solução é construir e manter bons presídios, e não soltar — afirmou.

Homicidas soltos

O presidente da Associação dos Juízes Federais, Roberto Carvalho Veloso, salientou que o Brasil tem mais de 60 mil mortes violentas por ano. São casos de homicídios, latrocínios e lesões corporais seguidas de morte. Mas, segundo ele, apenas 8% desses crimes são levados a julgamento. Veloso defendeu a inclusão de medidas no Código Penal para desafogar as varas criminais em casos de baixo potencial ofensivo.

— Existem 5 mil processos judiciais para apurar pequenos delitos, pequenas falhas. O Estado deve se preocupar com os grandes crimes, os crimes graves. Os crimes leves precisam ser resolvidos de outra maneira — disse.

Uma das medidas sugeridas durante a audiência pública foi o plea bargain, uma espécie de acordo entre a acusação e o réu. De acordo com esse instrumento, o acusado se declara culpado em troca da redução da pena.

O representante do Conselho Nacional do Ministério Público, Victor Hugo de Azevedo Neto, defendeu a inclusão da medida no novo Código Penal. Ele recomendou, no entanto, que o plea bargain não seja adotado em julgamentos dos crimes contra a vida: homicídio, induzimento ao suicídio, infanticídio e aborto.

— É absolutamente impensável que um sistema de justiça criminal possa funcionar se tiver que investigar através de um inquérito do século passado e processar obrigatoriamente todos os fatos delituosos ocorridos no solo brasileiro. É absolutamente impossível. As partes poderão celebrar acordo para aplicação imediata de penas antes da audiência de instrução e julgamento — disse.

'Histeria punitiva'

O representante da Ordem dos Advogados do Brasil, Raimundo Antonio Palmeira de Araújo, disse que o Brasil experimenta uma “histeria punitiva”. Ele criticou a possibilidade de inclusão novo Código Penal da teoria do domínio do fato. De acordo com esse princípio, uma pessoa que tenha autoridade sobre outra que pratica um crime também poderia ser responsabilizada pelo mesmo delito.

— Vou ter muito cuidado com o que vou dizer, mas eu me preocupo muito no Brasil com a interpretação aberta demais das leis para que a ditadura não tenha trocado de roupa: tirado a farda e vestido outras vestes. Quando nós trazemos teorias abertas estamos trazendo também um sistema penal ditatorial muito forte, em que o indivíduo fica muito fragilizado — afirmou.

Agência Senado (Reprodução autorizada mediante citação da Agência Senado)