CAE tem debate acalorado sobre reforma trabalhista antes da leitura do relatório

Da Redação | 23/05/2017, 15h46

Em uma reunião bastante acalorada, que durou mais de seis horas, a Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) realizou mais um debate sobre a reforma trabalhista nesta terça-feira (23).  A reforma foi defendida e criticada pelos convidados para a audiência e pelos senadores que participaram do debate. O argumento favorável é o de que a reforma elevará o emprego e a crítica é a de que vai tornar precárias as condições de trabalho.

A audiência foi solicitada por senadores da oposição, como Gleisi Hoffmann (PT-PR) e Lindbergh Farias (PT-RS) sob a justificativa de terem um debate mais equilibrado e com o enfoque nos impactos da reforma trabalhista na economia. O debate foi mais intenso porque a oposição queria obstruir a leitura do relatório do PLC 38/2017, que reforma as leis trabalhistas, marcada para a segunda parte da reunião.

Falaram dois convidados pela oposição e dois pela situação. O professor e economista da Universidade de Campinas (Unicamp) Márcio Pochmann, convidado pela oposição, afirmou que a reforma trabalhista não vai elevar o nível de emprego no país. Ele citou um estudo da Organização Internacional do Trabalho (OIT), realizado entre 2008 e 2014 em 110 países que realizaram mudanças na legislação trabalhista. O estudo concluiu que não houve efeito relevante das reformas sobre a elevação do emprego.

- As mudanças na legislação trabalhista, seja para proteger o trabalhador, seja  para liberalizar o funcionamento do mercado de trabalho, não impactam o mercado de trabalho, não elevam o nível de emprego, porque a determinação do emprego em uma economia capitalista é dada pelo nível de demanda agregada, e não pelo custo da mão de obra - disse o economista.

O professor de economia da Fundação Getúlio Vargas (FGV), André Portela, que defende a reforma, chamou a atenção para o alto grau de rotatividade no mercado de trabalho brasileiro mesmo em tempos em que a economia não estava em crise.  Para ele, a proposta de reforma trabalhista ataca pontos da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), para melhorar a proteção aos trabalhadores e incentivar relações de trabalho duradouras e ganhos de produtividade.

- Ela [a proposta] permite ganhos entre as partes;  propõe a redução dos custos de transação; permite alguma flexibilidade entre horas e benefícios, o que é importante para ajustes em situações de choques negativos; reduz as incertezas jurídicas, dado o ativismo do nosso Judiciário trabalhista; tenta alinhar estruturas de incentivos para relações de trabalho duradouras, além de adequar a proteção ao trabalhador às novas formas de relações do trabalho devido às novas tecnologias - disse André Portela sobre a reforma.

Segundo o professor de economia da Unicamp, Eduardo Fagnani, convidado pela oposição, a reforma trabalhista trará impactos negativos para a economia do país e para a Previdência. Ele explicou que a terceirização e a reforma trabalhista vão incidir sobre os 50% que contribuem. Para Fagnani, a reforma pode representar uma “combinação explosiva”, que pode conduzir a uma inviabilidade financeira no médio prazo.

- Nós vamos ter, com a reforma trabalhista, uma série de trabalhos temporários ou trabalhos intermitentes – que são trabalhos de curta duração. O que acontece com isso? Acontece que a pessoa fica trabalhando durante um período, sai do mercado de trabalho, volta depois; prolonga o seu tempo de contribuição para a Previdência; dificilmente vai conseguir comprovar 25 anos para Previdência e dificilmente vai se sentir estimulado para contribuir para a Previdência - explicou.

O professor da instituição de ensino e pesquisa Insper, Sérgio Pinheiro Firpo, afirmou que as regras trabalhistas atuais não são inclusivas no que diz respeito aos trabalhadores que estão ingressando no mercado, porque elas entram em detalhes minuciosos da relação de trabalho. Além disso, para Sérgio, os acordos feitos por sindicatos acabam sendo revistos na Justiça do Trabalho, o que tira a legitimidade dos sindicatos.

- A principal ideia é que [a reforma] torne a legislação mais flexível e com menos incertezas, ao ampliar e regular o alcance do trabalho parcial, o que permitirá que trabalhadores mais jovens e aqueles com filhos pequenos tenham mais opções em suas buscas; regular o teletrabalho, que vai reduzir custos desnecessários de deslocamento e permitir que trabalhadores em determinadas ocupações ampliem suas buscas por emprego. Há toda uma mudança tecnológica que a gente tem que levar em conta - afirmou.

Debate

Os senadores da oposição criticaram a reforma, dizendo que as condições de trabalho se tornarão precárias e que, num momento de crise, os trabalhadores não conseguirão ter seus direitos garantidos. Além disso, a oposição afirmou que a reforma beneficiará apenas os empresários e que não deveria estar tramitando no momento de crise política que se vive no país.

A senadora Gleisi Hoffmann (PT-PR) afirmou que deve ficar claro que o objetivo da reforma trabalhista não é o de aumentar o emprego, mas o de colocar sobre os mais pobres o ônus da dívida pública.

- Quando há uma crise econômica, quando cai a receita, há menos recursos públicos à disposição, há uma disputa por eles. Então, cortam-se benefícios sociais, cortam-se programas sociais, cortam-se investimentos, para poder pagar a dívida pública. O que sustenta a dívida pública? São os títulos públicos remunerados por uma alta taxa de juros. E grande parte desses títulos públicos não está só no sistema financeiro, nos bancos, mas também faz parte do setor produtivo brasileiro. Por isso, a maioria dos empresários do setor financeiro apoia a reforma da Previdência, apoiou a PEC 55, que virou a Emenda Constitucional 95, e vai apoiar a reforma trabalhista, porque também tem impacto em recursos do Estado - disse a senadora.

O senador Humberto Costa (PT-PE) afirmou que a reforma só interessa aos empresários brasileiros e que os trabalhadores serão prejudicados, especialmente com a terceirização e o trabalho intermitente.

- Não imaginem que aqui no Brasil os empresários vão adotar essas medidas para quem está fora do mercado trabalho. A terceirização vai para quem está trabalhando hoje com outro modelo de contrato de trabalho; trabalho intermitente vai para quem está trabalhando hoje, porque, lamentavelmente, a mentalidade do empresariado brasileiro é a de aumentar a a sua margem - disse.

Ronaldo Caiado (DEM-GO) disse que a reforma é necessária para superar as distorções entre os trabalhadores e melhorar a situação daqueles que estão na informalidade. Caiado citou dados do IBGE que demonstrariam que trabalhadores do setor privado ganham menos do que do setor público. Ainda de acordo com Caiado, 50% da população estão na informalidade e têm rendimentos ainda mais baixos. Para ele, cabe ao Senado encontrar caminhos para a reforma, mas não necessariamente aquela encaminhada por Temer.

Fernando Bezerra Coelho (PSB-PE) observou que o país precisa enfrentar problemas como a alta rotatividade no mercado de trabalho, a informalidade e os conflitos. Ainda segundo o senador, as pequenas e médias empresas vão crescer com uma legislação mais flexível. Ele também prevê o aumento do emprego e dos salários.

- Setenta por cento das empresas no Brasil tem até oito empregados. A legislação trabalhista, portanto, não é para o grande, é para o pequeno.  Temos que estar olhando para eles, para aqueles que estão na informalidade. Estamos fazendo um debate que é oportuno. Queremos uma [legislação] que possa ser flexibilizada, sim, para que possa contribuir para uma maior formalização e diminuir conflitos no trabalho - disse o senador.

Agência Senado (Reprodução autorizada mediante citação da Agência Senado)