Convidados de audiência discordam sobre banimento do amianto no Brasil

Da Redação | 08/05/2017, 14h15

Em audiência pública nesta segunda-feira (8) na Comissão de Direitos Humanos e Legislação Participativa (CDH) trabalhadores, médicos, políticos e representantes do governo discordaram sobre o banimento, no Brasil, da exploração e do uso do amianto. Apontado como cancerígeno, condenado pela Organização Mundial de Saúde (OMS) há 35 anos e proibido em mais de 60 países e em cinco estados brasileiros, o amianto está presente em vários produtos no Brasil como telhas, caixas d’água, materiais plásticos e tintas. O Brasil está entre os cinco maiores consumidores, produtores e exportadores da fibra.

Um projeto de lei do senador Paulo Paim (PT-RS) proíbe a extração, industrialização, importação, transporte e armazenamento do amianto, assim como a importação e comercialização de produtos que o utilizem como matéria-prima. O projeto (PLS 30/2017) está na Comissão de Infraestrutura.

Paim lembra, na justificativa da proposta, que a Organização Internacional do Trabalho (OIT) calcula que ocorram anualmente cerca de 100 mil mortes no mundo relacionadas à exposição ao amianto. Também o Instituto Nacional de Saúde da França teria ainda em 1997 constatado que, somente naquele país, as mortes provocadas pelo amianto giravam em torno de duas mil por ano, o que levou a França e todas as outras nações da União Europeia a proibi-lo.

De acordo com a OMS, não existem níveis seguros de exposição ao produto. Várias empresas tem abandonado o uso do amianto após condenações na Justiça.

Hoje, a única mina de amianto em exploração no país fica na cidade de Minaçu, no nordeste de Goiás. O amianto utilizado comercialmente é o crisotila, também conhecido como asbesto ou amianto branco.

A Associação Brasileira dos Expostos ao Amianto (Abrea) afirma que o contato com a crisotila representa um grave problema de saúde como a asbestose, doença pulmonar causada pela aspiração de pó de amianto. Quando chega aos pulmões, a fibra de crisotila causa inflamação dos tecidos, que leva à fibrose, comprometendo seriamente as funções do órgão. Outra doença praticamente exclusiva daqueles expostos ao amianto é o mesotelioma, tipo de câncer da pleura que pode levar à morte em apenas nove meses, conforme a Abrea.

— Não há limite considerado seguro para o uso do amianto. Se não é possível afastar o risco, nada melhor do que precaver e prevenir – afirmou Mauro Menezes, assessor jurídico da Abrea.

O procurador do trabalho Luciano Lima Leivas, que é membro do Programa Nacional de Erradicação do Amianto do Ministério Público do Trabalho, disse que o poder público vem descumprindo a Convenção 162 da Organização Mundial do Trabalho (OIT). A norma prevê a proibição do amianto se a medida for necessária para proteger a saúde do trabalhador.

A Federação Internacional dos Trabalhadores do Amianto (Fitac) reconhece que, no passado, eram poucos os cuidados das empresas em relação ao trabalho com a crisotila, mas afirma que hoje a realidade é outra, graças aos avanços no controle da exploração do asbesto e às mudanças ocorridas por força de acordos trabalhistas.

— Há um desconhecimento da realidade do uso do amianto hoje. Há 25, 30 anos não  havia controle. Hoje o ambiente é seguro. Há uma disputa econômica para tirar o amianto e colocar a fibra sintética – disse Adilson Conceição Santana, presidente da Fitac.

Pesquisas

O médico e pesquisador Ericson Bagatin, professor da área de saúde do trabalhador da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) e membro da Sociedade Brasileira de Pneumologia e Tisiologia, afirmou que o amianto produzido no Brasil não deveria ser alvo de banimento, mas de uso controlado.

Bagatin foi o coordenador do Projeto Asbesto, considerado o mais abrangente estudo epidemiológico já realizado no Brasil para avaliar os efeitos na saúde decorrentes da exposição ao asbesto na atividade de mineração. Segundo ele, o estudo demonstrou uma redução no número de doenças a partir do momento em que a mineração se restringiu à exploração do amianto variedade crisotila, em níveis reduzidos de concentração de fibras suspensas no ar e também a partir da implementação das medidas de proteção coletiva a partir de 1977.

— Só usando crisotila, em baixas concentrações, não foram observadas alterações pulmonares. Com a exposição a crisolita nós não evidenciamos a presença de doenças  – sustentou.

Milton do Nascimento, médico especialista no tema, observou que o Brasil vem trabalhando sob baixas doses de exposição desde a década de 80.

— É possível sim trabalhar com amianto com qualidade sem por em risco o trabalhador – sustentou.

Risco de desemprego

Os moradores de Minaçu temem que o banimento do amianto coloque em perigo o único empregador da cidade. O município onde vivem cerca de 30 mil pessoas tem sua economia baseada na mina, controlada pela empresa Sama, que pertence ao grupo Eternit, maior fabricante de telhas e caixas d’água de fibrocimento do mercado brasileiro.

O prefeito do município, Nick Barbosa, que trabalhou na Sama décadas atrás, afirmou que o banimento do amianto vai destruir a cidade:

— Não tenho problema de câncer; tenho problema é de gastrite porque todo ano se fala que a Sama vai acabar. Minha preocupação é onde vai trabalhar esse povo todo que trabalha na Sama – disse.

O presidente do Sindicato dos Trabalhadores nas Indústrias Extrativas e Beneficiamento de Minaçu Goiás e Região, Adelman Araújo Filho, também defendeu a continuidade do uso do amianto. Estima-se que cerca de 5.000 mil postos trabalhos diretos e indiretos da cidade estão relacionados a cadeia de extração do amianto.

— O amianto gera emprego, gera renda. Não podemos acabar com uma atividade porque adoeceu alguém - disse.

Trabalhador da mina, Junior Aparecido Moreira Silva, afirmou que a Sama se preocupa com o trabalhador:

— Eu respiro a Sama desde pequeno. Meu pai trabalha na Sama e chegava em casa feliz. Eu luto e vou lutar com todas as forças que eu tenho para que a Sama continue aberta.  Minaçu precisa da empresa – defendeu.

Mas a Assessora Técnica e Fundadora da Associação Brasileira de Exposição ao Amianto Fernanda Giannasi afirma que uso controlado do amianto é uma falácia.  Segundo ela, milhares de pessoas sofrem pela exposição ao minério.

— Não há dúvida que o amianto é cancerígeno. Existe um pacto de silêncio em Minaçu para esconder os doentes – afirmou.

O presidente da Abrea Eliezer João de Souza criticou a ausência dos empresários no debate disse que os trabalhadores deveriam se organizar para buscar alternativas que garantam o emprego na região.

Para a presidente da CDH, senadora Regina Sousa (PT-PI), é explicável o temor dos moradores com a possibilidade de fechamento de postos de trabalho. Ela ressaltou, contudo, que é fundamental pensar na proteção do meio ambiente, da vida e das futuras gerações.

Paulo Paim (PT-RS) disse que a questão vai continuar em debate no Senado.

— Queremos achar um caminho. Vamos aprofundar esse debate - assegurou.

Agência Senado (Reprodução autorizada mediante citação da Agência Senado)