Com decisão de julgar Dilma, Comissão do Impeachment encerra atividades após 101 dias

Da Redação | 04/08/2016, 15h50

A Comissão Especial do Impeachment 2016 do Senado Federal encerrou as atividades nesta quinta-feira (4), ao decidir levar a presidente afastada Dilma Rousseff a julgamento por crime de responsabilidade. Desde a instalação, em abril, foram 101 dias de trabalho, durante os quais os senadores integrantes ouviram testemunhas, analisaram documentos e votaram dois relatórios.

A comissão foi presidida pelo senador Raimundo Lira (PMDB-PB) e teve como relator o senador Antonio Anastasia (PSDB-MG). O presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Ricardo Lewandowski, atuou como instância superior ao colegiado para recursos dos parlamentares.

No início da reunião desta quinta, Lira fez um balanço das atividades, agradeceu a participação dos senadores e o trabalho dos servidores do Senado, e afirmou que a comissão será vista no futuro como "exemplo de reverência aos princípios democráticos".

— Conduzimos o trabalho pela crença na superioridade da democracia e de seus valores. Podemos dizer com orgulho que cumprimos nosso dever de modo a honrar os valores da justiça, da lei e da democracia. Procuramos sempre as virtudes da calma, da paciência e do equilíbrio — disse.

Admissibilidade

A Comissão do Impeachment foi instalada oficialmente no dia 26 de abril, oito dias depois de o Senado receber da Câmara dos Deputados a autorização para abrir o processo contra a presidente Dilma Rousseff. Foram designados 42 senadores para compor o colegiado – 21 titulares e 21 suplentes. Logo na primeira sessão, Raimundo Lira e Antonio Anastasia foram confirmados nos postos principais.

A primeira tarefa da comissão foi avaliar a admissibilidade do impeachment. Em debates preliminares, especialistas a favor e contra os argumentos da denúncia foram ouvidos pelo colegiado. O relatório de Anastasia, favorável à recepção do processo, foi aprovado por 15 votos a 5 no dia 6 de maio. O Plenário confirmou a decisão no dia 12 de maio, em sessão que durou mais de 20 horas. Foram 55 votos favoráveis e 22 contrários.

A partir daquele dia, a presidente Dilma Rousseff foi afastada do cargo por um prazo de seis meses. O vice-presidente Michel Temer assumiu interinamente o cargo.

Pronúncia

A segunda etapa do impeachment, chamada de fase de pronúncia, teve início no dia 25 de maio, com a apresentação do plano de trabalho. A fase de pronúncia dedicou-se a reunir depoimentos, documentos e evidências factuais para embasar a análise dos senadores a respeito da pertinência das acusações. Ao final, a comissão deveria decidir se arquivaria o processo por falta de provas, ou se levaria a presidente afastada a julgamento.

Ao longo dos dois meses seguintes, a comissão ouviu 44 testemunhas, sendo 4 do juízo (convocadas pelo relator), 2 da acusação e 38 da defesa. Ao final dessa sequência, foi agendado um depoimento da própria presidente Dilma Rousseff. No entanto, ela não compareceu pessoalmente. Em vez disso, enviou um depoimento por escrito, que foi lido no dia 6 de julho pelo advogado da defesa, o ex-ministro da Justiça e ex-advogado-geral da União, José Eduardo Cardozo.

Perícias

Durante o período de oitiva das testemunhas, a comissão montou uma junta pericial de técnicos do Senado para a produção de um laudo a respeito dos documentos que embasam a denúncia. A perícia havia sido solicitada pela defesa de Dilma, porém negada pelo conjunto dos membros do colegiado. O presidente do STF, Ricardo Lewandowski, reverteu essa decisão e determinou, a partir de recurso da defesa, que a perícia fosse providenciada.

Os três peritos indicados pela presidência da comissão entregaram o laudo no dia 27 de junho. Nele, concluíram que os decretos de créditos suplementares de 2015, que fazem parte da denúncia, foram atos incompatíveis com a meta fiscal do ano. Quanto ao outro fato, as chamadas “pedaladas fiscais”, os peritos não identificaram participação da presidente afastada.

Dois laudos periciais paralelos foram produzidos por peritos assistentes indicados pela acusação e pela defesa. Todos os peritos foram ouvidos em audiências no dia 5 de julho.

Alegações finais

Também como parte da fase de pronúncia, a acusação e a defesa entregaram suas alegações finais sobre o processo à comissão. Os denunciantes entregaram seu documento no dia 12 de julho, e nele, argumentaram que os crimes de responsabilidade foram “modus operandi” do governo para se “perpetuar no poder”.

As alegações finais da defesa, entregues no dia 28 de julho, reafirmaram o argumento de que o processo contra Dilma Rousseff é um “golpe de Estado”, e que um julgamento justo deveria resultar na absolvição da presidente afastada por insuficiência de provas. No mesmo dia, a senadora Gleisi Hoffmann (PT-PR) anunciou que sua bancada apresentaria voto em separado, paralelo ao do relator, defendendo o arquivamento do processo.

Votação

Antonio Anastasia apresentou seu relatório à comissão na última terça-feira (2). No texto, avalia que as provas coletadas são suficientes para que a presidente afastada seja levada a julgamento. Os fatos descritos pela denúncia, segundo o relator, demonstram “descontrole fiscal” e “usurpação” da função fiscalizatória do Legislativo pelo Executivo. Em sua avaliação, a presidente Dilma Rousseff cometeu “atentados à Constituição”.

Após um dia de debates, a comissão votou o texto nesta quinta-feira, aprovando-o por 14 votos a 5. A decisão já foi lida em Plenário e já pode ser pautada para votação pelo conjunto dos senadores – o que deve acontecer na próxima terça-feira (9).

Denúncia

A presidente afastada Dilma Rousseff é acusada de ter cometido crime de responsabilidade contra a lei orçamentária e contra a guarda e o legal emprego de recursos públicos, na forma de quatro decretos de abertura de créditos suplementares e operações com bancos públicos consideradas ilegais. Todos os atos são do ano de 2015.

Segundo a acusação, os decretos foram editados em desacordo com a meta fiscal vigente e sem a autorização do Congresso Nacional. A defesa argumenta que eles têm respaldo da Lei Orçamentária Anual (LOA) de 2015 e que não houve dolo da presidente, que teria apenas seguido recomendações técnicas e jurídicas de outros órgãos.

As operações com os bancos — as chamadas “pedaladas fiscais” — consistiram no atraso do pagamento de equalizações de juros para os bancos no contexto do Plano Safra, de fomento à agricultura familiar. A acusação afirma que esse atraso configura operações de crédito entre os bancos e a União em benefício do Tesouro, o que é vedado pela Lei de Responsabilidade Fiscal.

A defesa refuta esse entendimento. Segundo ela, desde a criação do Plano Safra, em 1992, há atrasos nesses repasses, por questões operacionais, e eles não podem ser interpretados como operações de crédito. Além disso, a defesa alega que todos os débitos foram quitados, não restando prejuízo para os bancos, e que não houve participação direta da presidente Dilma nesse processo.

A denúncia é assinada pelos juristas Hélio Pereira Bicudo, Miguel Reale Júnior e Janaína Conceição Paschoal. Ela foi protocolada na Câmara dos Deputados no dia 1º de setembro de 2015, e aceita em 2 de dezembro do mesmo ano pelo ex-presidente da casa, deputado Eduardo Cunha.

Agência Senado (Reprodução autorizada mediante citação da Agência Senado)