Falta de recursos para serviços de inspeção sanitária animal motiva controvérsias em audiência

Da Redação | 05/05/2016, 17h56

As barreiras que travam o avanço do Sistema Unificado de Atenção à Sanidade Agropecuária (SUASA) foram avaliadas em audiência pública na Comissão de Agricultura e Reforma Agrária (CRA) nesta quinta-feira (5). Segundo os expositores, a legislação é complexa e falta clareza a respeito das competências da União, estados e municípios. O ponto crucial seria a carência de recursos para a estruturação do sistema, sobretudo para a admissão, por concurso, de médicos veterinários para atuar na inspeção dos produtos de origem animal. A audiência foi proposta pelo senador Dário Berger (PMDB-SC), que se revezou na direção dos trabalhos com a presidente da CRA, senadora Ana Amélia (PP-RS).

Diante da falta de veterinários concursados, nos últimos tempos entrou em pauta a ideia de credenciar serviços privados para as inspeções de rotina em frigoríficos e outras indústrias de produtos de origem animal para consumo humano. Mas o secretário de Defesa Agropecuária do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA), Luis Eduardo Pacifici Rangel, ponderou que é necessário evitar “conflitos de interesse”. Ele lembrou que em 1915, quando foi criado o sistema de inspeção no país, exatamente por isso prevaleceu a reserva da atividade apenas para agentes públicos.

— Essa discussão aconteceu na época e se entendeu que era necessário o Estado ter uma pessoa ali [nos frigoríficos] que evitasse o conflito de interesse no processo. Evitar, por exemplo, que uma carcaça fosse liberada quando ela tem uma patologia que pudesse significar risco para a saúde pública — ressaltou.

Mesmo sem dizer que pode haver conflitos de interesse no que chamou de “terceirização”, o representante do MAPA reafirmou que, passados cem anos, os debates não podem desconhecer essa questão como um ponto central. Depois, reconheceu que as discussões devem acontecer exatamente no Congresso, levando em conta o que a sociedade quer e que se mostre como melhor solução para a saúde alimentar.

Falência

Partiu do consultor Mário Nascimento, da Confederação Nacional dos Municípios (CNM), a defesa da terceirização da inspeção. Depois de afirmar que os três níveis de governo estão falidos, ele sustentou que não há espaço para novos concursos. Assim, a saída seria mudar a legislação e permitir que a agroindústria contrate por sua conta serviços privados de inspeção. A União, os estados e os municípios ficariam apenas como fiscais do processo.

Nascimento registrou que, dos quase 5,6 mil municípios do país, até agora não mais que 1,3 mil instalaram o exigido Sistema de Inspeção Municipal (SIM). Ele salientou que a participação de veterinários contratados já vem sendo adotada nos estados de Santa Catarina e Paraná e esse mesmo caminho já é seguido pelo Rio Grande do Sul.

Lentidão

O presidente do Fórum Nacional dos Executores de Sanidade Agropecuária (FONESA), Inácio Afonso Kroetz, reconheceu que o SUASA continua “patinando” dez anos depois de sua criação. Citando dados do MAPA, ele registrou que, até o momento, as adesões ao sistema se limitam a sete estados, 12 municípios e três consórcios intermunicipais, além de 150 estabelecimentos produtivos.

Segundo o presidente da entidade, que congrega órgãos estaduais de sanidade agropecuária, a lentidão na implantação decorre das dificuldades econômicas e mesmo da falta de convergência entre as normas federais e estaduais. Quanto aos problemas materiais, ele disse que a situação deve perdurar diante da situação econômica e política do país.

O expositor observou que a carência de recursos não é um problema exclusivo do setor público. Segundo ele, as unidades industriais, especialmente as de pequeno e médio porte, também não dispõem de capital e acesso a financiamento para investir em suas plantas de produção, para se adequar às exigências.

Agravamento

Sobre a carência de veterinários (que afeta diretamente o chamado Sisbi, sigla do Sistema Brasileiro de Inspeção de Produtos de Origem Animal), Kroetz disse que o quadro pode até se agravar a partir de agora. O motivo seria uma decisão do Ministério Público Federal, publicada na quarta-feira (4), obrigando o Mapa a devolver médicos veterinários cedidos por prefeituras estados por meio de convênios.

Os convênios têm sido uma saída para evitar que os serviços de inspeção de frigoríficos sejam paralisados, em alguns municípios, por falta de inspetores sanitários federais. Entre os cedidos há inclusive profissionais não concursados.

— Se isso vingar, nós vamos ficar pior do que já estávamos. Daqui em diante, quem vai fazer as inspeções? — indagou.

Anacronismo

O representante do Mapa, observou que as discussões estão se concentrando no Sisbi, que é apenas a ponta final do SUASA, sistema mais abrangente que trata ainda da saúde dos rebanhos e da saúde vegetal. De todo modo, reconheceu que a defesa animal hoje é regulada por excesso de normas, contando com 14 leis, muitas delas parcialmente anacrônicas.

Ainda quanto ao tema da saúde animal, o representante do ministério salientou que alguns conceitos precisam ficar claros, o primeiro deles a ideia de que a “análise de risco” deve orientar modelos e procedimentos, inclusive para ajudar na simplificação de controles onde o risco seja pouco significativo. Disse ainda que também deve ser considerado que o país está inserido num sistema internacional, não podendo fugir das “balizas” da Organização Mundial de Sanidade Animal (OIE), um requisito para ter acesso a outros mercados.

— Não precisamos ter um sistema ‘idêntico’ ao da Europa para vender para a Europa, mas é necessário um sistema ‘equivalente’ para se conquistar aquele mercado — afirmou.

Agência Senado (Reprodução autorizada mediante citação da Agência Senado)