Comissão de Impeachment debate relatório de Anastasia e se prepara para votação

Da Redação | 05/05/2016, 19h39

Foram quase sete horas de debate sobre o relatório que pede o afastamento da presidente Dilma Rousseff, na reunião desta quinta-feira (5) da Comissão Especial do Impeachment. Com a presença do advogado-geral da União, José Eduardo Cardozo, senadores se revezaram para defender e condenar o processo. O texto do senador Antonio Anastasia (PSDB-MG), apresentado no dia anterior, será votado na reunião desta sexta-feira (6).

Dois votos em separado foram apresentados. O primeiro, do líder do governo, senador Humberto Costa (PT-PE), pedindo a nulidade do processo. O segundo, da senadora Vanessa Grazziotin (PCdoB-AM) e Randolfe Rodrigues (Rede-AP), pede o arquivamento do pedido de impeachment.

Cunha

O afastamento do presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), pela manhã, acrescentou um novo ingrediente à reunião. Cunha foi suspenso do mandato de deputado federal em caráter liminar pelo ministro Supremo Tribunal Federal (STF) Teori Zavascki, atendendo a pedido da Procuradoria-Geral da República (PGR). A decisão foi confirmada pelo Plenário do Supremo, à tarde, quando todos os 11 ministros votaram a favor do afastamento. Para o advogado-geral da União, a tese “fica demonstrada agora judicialmente”.

— Isso qualifica o desvio de poder do presidente Eduardo Cunha, hoje atestado por uma decisão judicial. Não neste caso, mas no seu modus operandi, na sua atuação geral. Como pode-se dizer nesta comissão, no 'conjunto da obra'. E este impeachment faz parte desse conjunto da obra —  apontou Cardozo.

Assim como a defesa, parlamentares da base argumentaram que Cunha teria acolhido o pedido de impedimento da presidente Dilma por “vingança” após romper com o governo, o que ensejaria a nulidade do processo. Para o senador José Pimentel (PT-CE), o motivo pelo qual foi iniciado o processo gera um "vício de origem"

Eduardo Cardozo também criticou o "açodamento" da Comissão Especial de Impeachment e sustentou que o Senado deveria primeiro esperar o julgamento do Tribunal de Constas da União (TCU) sobre as contas de 2015 de Dilma. Ele lembrou que o processo de impeachment não é "meramente político".

— É um processo em que existe um crime de responsabilidade e a demonstração desse crime passa pela incidência de garantias do processo penal e do processo administrativo — afirmou Cardozo.

"Fundamentos válidos"

A senadora Simone Tebet (PMDB-MS) discordou da tese de Cardozo de que seria preciso aguardar parecer do TCU sobre as contas do exercício financeiro de 2015. Ela também ressaltou que, por se tratar de um julgamento político, não é possível trazer as normas penais para o processo, como quer a defesa.

Já o relator, Antonio Anastasia, e senadores da oposição sustentaram que a abertura do processo de contra Dilma continua válido.

— Nós tivemos a votação [na Câmara]. Uma grande maioria, acima dos dois terços, reconhece aquela situação [de crime de responsabilidade]. E esse tema foi analisado e destrinchado pelo próprio Supremo. Então, não me parece que haja aqui qualquer mácula — afirmou o relator.

A situação do presidente da Câmara, aliás, ocupou parte considerável da exposição do advogado-geral da União, o que foi criticado pela senadora Ana Amélia (PP-RS).

— De toda sua exposição, de uma hora, ele dedicou 15 minutos ao caso Eduardo Cunha. Os fundamentos da decisão proferida pelo STF permanecem válidos e afastam o desvio de poder no ato do presidente da Câmara dos Deputados — ponderou.

Ana Amélia também elogiou a decisão Zavascki de afastar o deputado Eduardo Cunha. A iniciativa, para a senadora, revela que as instituições brasileiras funcionam com autonomia e independência, sendo ainda uma mensagem de segurança ao país.

— A sociedade aplaude o gesto do ministro Teori Zavasck — afirmou.

"Desvio de finalidade"

Em razão do afastamento de Cunha, a senadora Fátima Bezerra (PT-RN) apresentou questão de ordem pedindo o arquivamento da denúncia contra Dilma, mas o presidente da Comissão de Impeachment, Raimundo Lira (PMDB-PB), a rejeitou.

A senadora condenou o relatório apresentado por Anastasia. A senadora reiterou que a defesa de Dilma vai recorrer ao STF para anular o processo de impeachment. Segundo ela, o processo apresenta desvio de finalidade praticado por Eduardo Cunha. Fátima disse que Cunha praticou “chantagem explícita” ao dar prosseguimento do processo de impedimento de Dilma.

O líder do governo no Senado, Humberto Costa (PT-PE), acrescentou que seu partido também pode entrar com ação no STF para a anulação do processo. Segundo ele, a decisão unânime dos ministros do Supremo de suspender Eduardo Cunha do seu mandato parlamentar e da Presidência da Câmara dos Deputados é uma demonstração que ele não tinha autoridade moral nem política para conduzir o caso.

— Este Senado, se quiser fazer um tributo à seriedade, deveria suspender a continuidade desse processo que está maculado desde a sua origem. Muito provavelmente nós vamos recorrer ao STF para a anulação desse e de todos os atos cometidos por aquele cidadão — disse Humberto Costa.

Admissibilidade

Anastasia concordou que o processo tem natureza jurídico-política, mas afirmou que há uma confusão com relação ao momento em que se discute os aspectos jurídicos da denúncia.

— O que aconteceu na Câmara foi o juízo político da admissibilidade, que nós estamos, grosso modo, repetindo nesse momento, sem avançar no mérito — respondeu, acrescentando que o representante do governo apenas "repisou" argumentos que já tinham sido apresentados.

O senador Aloysio Nunes Ferreira (PSDB-SP) afirmou que o embate travado entre o relator e o advogado-geral da União foi memorável e será lembrado por muito tempo. Ele elogiou o talento de Cardozo, mas disse que a causa defendida por ele é perdida.

— Anastasia soube demonstrar com sobriedade e precisão a adequação dos fatos à legislação. O relator espancou qualquer dúvida existente sobre a regularidade do procedimento — disse.

Pedaladas

Para Ronaldo Caiado (DEM-GO), o relatório apresentado por Anastasia explicita que as pedaladas fiscais se tornaram um “crime reiterado” por parte da presidente Dilma Rousseff. A estratégia também estaria na origem da crise econômica que o país vive hoje, com milhões de desempregados e a disparada nos pedidos de recuperação judicial por parte das empresas.

A mesma avaliação foi feita por outros parlamentares como Ataídes Oliveira (PSDB-TO), Magno Malta (PR-ES) e Waldemir Moka (PMDB-MS), para quem “a densidade e a solidez” do parecer apresentado por Anastasia “nocautearam” o advogado geral da União. O senador Zezé Perrella (PTB-MG) também defendeu o texto e elogiou o trabalho de Anastasia.

O senador Fernando Bezerra (PSB-PE) elogiou a qualidade técnica do parecer, que considerou de fácil compreensão, reunindo os elementos necessários para a decisão sobre o impeachment de Dilma. Na mesma linha, Ricardo Ferraço (PSDB-ES) disse que o relatório apresenta “precisão cirúrgica”.

Na mesma linha, o senador Gladson Cameli (PP-AC) elogiou o relatório e considerou que pode oferecer ao país a chance de dar um basta na inércia que se instalou nos últimos meses.  A irresponsabilidade na condução da administração, segundo o senador, não pode ser tolerada.

— Não se pode admitir a impunidade, sob pena de colocarmos em risco as instituições democráticas por absoluta falta de confiança. Responsabilidade deve ser a palavra de ordem entre os agentes públicos.

Voto alternativo

Na avaliação do senador Telmário Mota (PDT-RR), porém, José Eduardo Cardozo passou por cima dos argumentos do relator “como uma carreta”, destruindo-os. Para o senador, Cardozo demonstrou a inexistência de dolo ou má-fé nos decretos de crédito suplementares.

Em seu voto em separado, Humberto Costa afirmou que os decretos de créditos suplementares não ameaçaram a meta fiscal estabelecida naquele momento. Em relação às pedaladas fiscais, o senador reforçou que ainda não existe qualquer manifestação do TCU a respeito de possíveis irregularidades nas subvenções do Plano Safra. O senador disse ainda que a “discricionariedade política se subordina à aferição da precisa existência de tipificação” do crime.

— Não podemos desconsiderar o impacto que um impeachment, sem o devido embasamento constitucional e jurídico, teria sobre a governabilidade democrática no Brasil e até mesmo sobre a credibilidade institucional do Congresso Nacional — afirmou.

Golpe

Como nas reuniões anteriores, a palavra “golpe” foi várias vezes mencionada pelos governistas. Para Gleisi Hoffmann (PT-PR), está em curso “um golpe de voz mansa”. Ela criticou o relatório de Anastasia, principalmente em aspectos ligados a direito orçamentário e financeiro, e disse que o processo de impeachment é uma situação excepcional, que exige a comprovação do crime.

Vanessa Grazziotin avaliou que o Senado está julgando a presidente da República por “pseudo-crimes” e afirmou que "o golpe não se faz só com armas", mas também com "um caráter de institucionalidade, um caráter de legalidade".

— Nem nos tribunais de inquisição acontecia o que está acontecendo aqui. Aqui nós podemos comparar não só a um tribunal, mas a um colégio eleitoral de inquisição — declarou Vanessa Grazziotin.

Estado de Direito

Por sua vez o senador José Medeiros (PSD-MT) refutou a tese de que o impeachment de Dilma Rousseff seja um golpe, uma vez que as instituições brasileiras estão funcionando normalmente e que o afastamento segue o devido processo legal. Já o senador Eduardo Amorim (PSC-SE) afirmou que não é “inquisidor” ou “golpista”. Ele argumentou que Dilma já sabia, desde 2014, em função de decisão do TCU, que a edição de créditos suplementares não autorizados é ilegal, mas insistiu com a prática em 2015.

Para o senador Reguffe (sem partido-DF), em um Estado Democrático de Direito, o governante deve respeitar as leis orçamentárias, o que Dilma Rousseff não teria feito.

Agência Senado (Reprodução autorizada mediante citação da Agência Senado)