Jornal de Alagoas narrou em detalhes última pena de morte executada no Brasil

Ricardo Westin | 04/04/2016, 11h03

Na edição de 30 de abril de 1876, um domingo, o Jornal do Pilar noticiou com detalhes a execução do escravo Francisco, ocorrida na sexta-feira anterior. Ele foi condenado à forca por matar duas pessoas. A seguir, trechos da reportagem:

“À proporção que se aproximava a hora do sacrifício, não procurando esconder a enormidade de seu crime, voltara-se para Deus. Foi assim que o vimos, logo ao seguir caminho do sacrifício, dirigir- -se a seu pedido para a Igreja do Rosário com o fim, dizia, de ver Nossa Senhora do Pilar. Ali chegando, ajoelhou-se e como que orou.

Em todo esse trajeto e em diversos pontos, o oficial de Justiça fazia a leitura da sentença.

O condenado ia vestido com a roupa da prisão, de calça e camisa, algemado e de laço no pescoço, assim como o carrasco, que, encorrentado, seguia-o alguns passos atrás. Assim chegou ao lugar do suplício à 1 ½ hora da tarde, no mesmo terreno em que foram assassinados os infelizes capitão João Evangelista de Lima e sua mulher. Em frente à estribaria onde o condenado praticara seu horroroso crime, fora levantada a forca.

Declarou que ia morrer, mas que ninguém se gloriasse com a sua morte, que havia sido um dos assassinos do capitão João de Lima, porém que o fato não se dera como se contava e que só ele e Deus sabiam, e, finalmente, que pedia perdão a todos e que a todos também perdoava.

Subiu a escada do patíbulo [palanque de execução] a pé firme, seguido de uma praça, e logo após o carrasco, seguido de outra. Nesse ato, supondo o condenado que o algoz esmorecia, voltou-se para ele, exortou-o a que se animasse, dizendo-lhe que não tivesse medo, que tomasse coragem, e isso com o maior sangue frio.

Chegado que foi ao topo da escada, dirigiu-se ao centro do patíbulo, torceu o laço, que estava colocado sobre a nuca, para a garganta e disse adeus ao povo acenando com o chapéu, que logo após deixou cair ao chão. Em seguida, ajoelhou-se e principiou a acompanhar um dos sacerdotes que faziam parte da execução em rezar o Credo. Nessa ocasião, o carrasco vendou-lhe os olhos e, ao chegar às palavras ‘vida eterna’ desprendeu-se do patíbulo ao simples movimento do carrasco para impeli-lo.

Depois o carrasco, descendo pela corda, apoiou os dois pés sobre os ombros do condenado e forcejou por abreviar- -lhe a morte, o que se reproduziu por duas vezes e foi o mais horrível da cena. Estava consumado o ato.

O cadáver, depois de amortalhado, foi sepultado no cemitério público desta cidade. Deus se compadeça da alma daquele desgraçado, tão merecedor em vida das penas da lei quanto em morte da comiseração [compaixão] da humanidade.”

A seção Arquivo S, resultado de uma parceria entre o Jornal do Senado e o Arquivo do Senado, é publicada na primeira segunda-feira do mês.

Agência Senado (Reprodução autorizada mediante citação da Agência Senado)

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