Levy apoia limite para dívida da União e surpreende senadores

djalba-lima | 18/11/2015, 18h06

O ministro da Fazenda, Joaquim Levy, considerou “disciplinador” o Projeto de Resolução do Senado (PRS) 84/2007, que fixa limite para as dívidas líquida e bruta da União. Levy, que não constava da lista de participantes da audiência pública desta quarta-feira (18) na Comissão de Assuntos Econômicos (CAE), apareceu de surpresa e defendeu o projeto.

Para o ministro, “apenas aumentar impostos, como tem sido feito nos últimos 15 a 20 anos”, não resolve. Após considerar fundamental disciplinar as despesas do governo, Levy disse que “o Senado, em boa hora, aponta essa direção”. A posição de Levy surpreendeu o senador Lindbergh Farias (PT-RJ), que vinha mantendo contatos com técnicos do governo contrários ao projeto e liderando a oposição à matéria na CAE.

— O Tesouro discorda, inclusive, dos números. Estava contra o projeto. Conversei com o Banco Central, que também estava contra o projeto. Com o Ministério do Planejamento, que estava contra o projeto. Eu só estou questionando porque não entendi. Parece que houve uma reunião de governo na Casa Civil para uma posição contrária ao projeto. Eu fui surpreendido com a fala do ministro da Fazenda — disse Lindbergh.

Levy manteve seu ponto de vista, ponderando que podem ser debatidos os números, que classificou como uma discussão técnica. Entretanto, considerou acertado "dar mais esse passo na Lei de Responsabilidade Fiscal", incluindo a dívida bruta no controle. Sancionada em 2000, a LRF estabeleceu um prazo de 90 dias para o presidente da República submeter ao Senado proposta de limites globais para o montante da dívida consolidada da União, estados e municípios.

Em 2000, o então presidente Fernando Henrique Cardoso enviou a proposta para o Senado, mas a Casa fixou os limites apenas das dívida de estados e municípios. O teto para a União foi desarquivado recentemente por iniciativa do senador José Serra (PSDB-SP), que se tornou relator da proposta e apresentou uma emenda incluindo no limite a dívida bruta, que não constava da proposta original enviada ao Senado.

A audiência pública desta quarta-feira destinou-se a instruir o projeto, que deverá ser votado na próxima terça-feira (24). O presidente da CAE, senador Delcídio do Amaral (PT-MS), manifestou sua esperança de que até lá os integrantes da comissão fechem um acordo sobre o texto.

Críticas

Na audiência, o representante da Secretaria do Tesouro Nacional (STN), Otávio Ladeira de Medeiros, considerou restritivos os limites estabelecidos por Serra – 2,2 vezes a receita corrente líquida (RCL) para a dívida líquida e 4,4 vezes a RCL para a dívida bruta.

Medeiros afirmou que limites muitos restritivos à trajetória da dívida e sem medidas estruturais não passam uma mensagem de prudência para o mercado. Pelo contrário, acrescentou, “trazem preocupação e aumentam a percepção de risco da dívida”.

Para o representante da STN, mesmo a proposta de transição de 15 anos, contida no PRS, não seria suficiente para mitigar os riscos. Ele apontou perigos também para a execução da política monetária pelo Banco Central.

O chefe da assessoria Econômica do Ministério do Planejamento, Manoel Pires, também fez críticas ao texto da emenda ao PRS. Ele citou estudos do Fundo Monetário Internacional (FMI), segundo os quais as regras de dívida não fortalecem o controle fiscal porque não atuam sobre as causas do descontrole.

O professor Pedro Paulo Zahluth Bastos, do Instituto de Economia da Unicamp, criticou a proposta sob o argumento de que “a definição de limite para a dívida consolidada bruta parte de entendimento questionável da relação entre política fiscal, monetária e cambial e de seus efeitos”.

Bastos afirmou que, sob pretexto de restringir o custo fiscal das políticas cambial, monetária e creditícia, o texto define metas fiscais “contracionistas e inviáveis”. Segundo ele, mesmo que a meta fiscal pudesse ser alcançada, o risco de fracasso influencia o custo da dívida pública até 2030.

— Como a elevação do limite não é automática, o risco político amplia a percepção de risco financeiro. Na hipótese de rejeição da ampliação de limite, o custo financeiro não se limita a punir o governo, mas paralisa o Estado e pode provocar um pânico financeiro — acrescentou.

Defesa

O economista José Roberto Afonso, da Fundação Getúlio Vargas (FGV), defendeu a emenda de Serra e contestou os argumentos de que ela engessaria a administração pública federal. José Roberto lembrou que, durante os primeiros cinco anos, a proposta aceita o aumento da dívida bruta (de 5,6 para 7,1 vezes a RCL) e da dívida líquida (de 2,2 para 3,8 vezes a RCL) e reiterou  o “realismo frente à farra fiscal recente e às previsões ruins de juros e crescimento econômico”.

O economista da FGV acrescentou que, só entre o 6º ano e o 15º, ocorrerá uma queda para os limites de 4,4 vezes a RCL (dívida bruta) e 2,2 vezes a RCL (dívida líquida).

Um dos técnicos responsáveis pela elaboração da Lei de Responsabilidade Fiscal, José Roberto conclamou o Senado a não perder “a oportunidade ímpar de tirar país da contramão mundial em termos fiscais”. Segundo ele, é hora de “completar e federalizar a responsabilidade fiscal”.

O economista José Luís Oreiro, professor da UFRJ, também defendeu o projeto, pois considera a dívida pública brasileira muito alta para os padrões internacionais. Segundo ele, um quarto da riqueza líquida nacional está alocado em títulos da dívida pública, contra números menores no Reino Unido (17,64%) e na França (15,93%).

O professor da UFRJ argumentou que a redução da dívida pública trará benefícios para o crescimento de longo prazo da economia brasileira, pois permitirá a manutenção da taxa de câmbio num patamar competitivo.

Sinalização

Após considerar a crise de hoje a mais grave já enfrentada pelo Brasil, José Serra afirmou que o objetivo de sua proposta é assinalar um horizonte para a economia no longo prazo e promover um debate permanente da dívida e do déficit público. Na avaliação do relator, o projeto cria mecanismos de monitoramento do que está acontecendo nos gastos do governo.

Serra considerou um paradoxo a oposição da Secretaria do Tesouro Nacional, que, segundo ele, contribuiu com a última versão de sua emenda. O senador ressaltou também a contribuição da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional.

— Fizeram um documento com dez pontos, em que rebatemos cinco ou seis e absorvemos os outros quatro. Nunca imaginei que fosse ser diferente. Acho que chegamos, inclusive, num ponto correto de convergência de previsões daquilo que é razoável fazer no Brasil — acrescentou.

Agência Senado (Reprodução autorizada mediante citação da Agência Senado)