Futuro exige definição de modelo da Previdência, diz Carlos Gabas

Paulo Sérgio Vasco | 09/09/2015, 18h01

A transição demográfica é um desafio à Previdência Social, visto que a população brasileira está envelhecendo e vivendo mais, o que exige a  construção de um sistema capaz de garantir a arrecadação e o pagamento das aposentadorias e benefícios sociais no futuro.

O alerta é do ministro da Previdência Social, Carlos Gabas, que nesta quarta-feira (9) participou da segunda audiência publica na comissão mista que examina a Medida Provisória (MP) 676/2015. A medida cria uma nova fórmula de cálculo da aposentadoria, em alternativa ao Projeto de Lei de Conversão (PLV) 4/2015, vetado em junho pela presidente Dilma Rousseff e que deu origem à Lei 13.135/2015. Relator da medida, que já recebeu 184 emendas, o deputado Afonso Florence (PT-BA) deve apresentar o texto do projeto de lei de conversão na semana que vem.

Em 1980, disse Gabas, a expectativa de vida no Brasil era de 62 anos e meio, a população se concentrava na faixa de 19 anos e 6,1% dos habitantes eram idosos. Em 2010, a expectativa de vida atingiu 73 anos e a expectativa de sobrevida, medida após os 50 anos de idade, era de 84 anos. A população já se concentra nos 29 anos de idade, e os idosos são 10% da população. Em 2030, eles serão 18% e, em 2060, um terço da população.

Gabas explicou que o modelo previdenciário brasileiro é de repartição e solidário, o que significa que a geração que trabalha contribui para pagar as aposentadorias e pensões de quem já se aposentou. Para que isso funcione bem, precisa haver uma quantidade grande de pessoas contribuindo. Hoje, essa relação é de 9,3 pessoas trabalhando para um aposentado. Em 2060, a proporção será de 2,3 para um, explicou o ministro da Previdência.

— Aí está o desafio: que Previdência precisamos estruturar agora para que lá na frente ela seja capaz de continuar pagando os benefícios. Vamos ter que rediscutir esse modelo. Previdência é política de longo prazo, é um pacto de gerações. É preciso planejar. Se não, lá na frente teremos sustos. Não estamos em situação de calamidade. Ainda temos tempo para estruturar esse modelo de Previdência que queremos para o futuro. O quanto antes encararmos esse desafio, melhor para nós — afirmou.

A idade média de aposentadoria no Brasil é de 54 anos, disse Gabas. A regra do Regime Geral da Previdência Social exige idade de 65 anos para os homens e 60 anos para as mulheres, associado a um tempo mínimo de contribuição (35 anos para os homens e 30 anos para as mulheres), mas sem estipular idade mínima para a aposentadoria. Apenas quatro países mantêm a aposentadoria por tempo de contribuição: Irã, Iraque, Equador e Brasil.

A proposta vetada por Dilma permitia a aplicação da regra 85/95 na hora da aposentadoria. A MP manteve a fórmula 85/95, referente à soma da idade e do tempo de contribuição dos segurados, mas criou um dispositivo progressivo que considera o aumento da expectativa de vida do brasileiro. As somas da idade e do tempo de contribuição deverão ser aumentados em um ponto a cada ano, a partir de 1º de janeiro de 2017; e, depois, em 1º de janeiro de 2019; 1º de janeiro de 2020; 1º de janeiro de 2021 e 1º de janeiro de 2022. Na prática, a medida adia o prazo para a aposentadoria para dar sustentabilidade ao sistema.

Longo prazo

Durante a audiência pública, o deputado Celso Pansera (PMDB-RJ) defendeu o pagamento de benefícios sociais, mas observou que o Estado tem a obrigação de pensar a Previdência a longo prazo, e apresentar uma alternativa consistente à população. O deputado Chico Alencar (PSOL-RJ), por sua vez, disse que a Previdência é o maior distribuidor de renda no país, e cumpre um papel estratégico na superação das desigualdades sociais. O relator Afonso Florence apontou controvérsias na MP 676/2015, mas disse que pretende chegar a um texto que garanta direitos e mantenha a possibilidade de financiamento básico do regime geral.

Gabas reconheceu que a tese da progressividade causou confusão na sociedade, e observou que a MP não retira o direito de se aposentar, mas apenas "atrasa" a aposentadoria em alguns meses, que variam de acordo com a situação de cada trabalhador.

— Precisamos debater a transição demográfica, as pessoas vivem mais. Como se aposentam com 54 anos, isto torna-se um desafio para sustentar a Previdência. Isso nos traz a preocupação de postergar em alguns meses as aposentadorias — afirmou.

O ministro da Previdência esclareceu ainda que a MP 676/2015 não acaba com o fator previdenciário. Ele lembrou que o mecanismo foi criado há alguns anos, diante da derrubada no Congresso de emenda que previa o estabelecimento de idade mínima para a aposentadoria

— Então se construiu uma fórmula que leva em consideração para o cálculo a expectativa de sobrevida, a idade que a pessoa tem e o quanto ela vai  viver. Isso não posterga, mas diminui o valor da aposentadoria. A justificativa para a criação do fator era postergar a aposentadoria. Na verdade, o que fazia era diminuir o valor da aposentadoria. Não era possível, do ponto de vista do equilíbrio, eliminar o cálculo do fator, e as pessoas se aposentando com 56 anos, com valor integral. Isso nos traz o desafio de sustentabilidade — afirmou.

Gabas também manifestou apoio à manutenção da aposentadoria rural nos moldes atuais. Ele explicou que o recolhimento da contribuição na modalidade urbana do regime é feito sobre a folha de salários, o que não ocorre na modalidade rural. Nesta, o trabalhador da agricultura familiar aposenta-se na condição diferenciada de segurado especial, sem eventualmente ter comprovado recolhimento de contribuição.

— Há uma confusão grande e uma tentativa de divisão do trabalhador do campo e da cidade. A contribuição é diferenciada, não é sobre a folha de salário porque não há folha de salário. Temos que encontrar mais formas de financiamento da aposentadoria rural, e não acabar com a proteção rural. No México, na China não há política pública de amparo. Temos que aperfeiçoar o nosso modelo, e não regredir — concluiu.

Em relação à greve dos servidores da Previdência, Gabas disse que mais de 60 dias de paralisação prejudicaram os gestores públicos e a população. Ele observou que a conjuntura econômica atual é desfavorável à negociação com as categorias, e que um “quadro de imprevisibilidade” impede o fechamento de acordos salariais.

Agência Senado (Reprodução autorizada mediante citação da Agência Senado)

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