Veja como foi a votação do marco da biodiversidade nas Comissões do Senado

Augusto Castro e Iara Guimarães Altafin | 27/03/2015, 17h55

 

O Marco regulatório da Biodiversidade (PLC 2/2015) foi discutido e votado em quatro comissões permanentes do Senado Federal. Confira o que mudou no texto em cada um dos colegiados:

Agricultura

A Comissão de Agricultura e Reforma Agrária (CRA) aprovou o projeto na quinta-feira (19) da semana passada. Os senadores seguiram o voto do relator, Acir Gurgacz (PDT-RO), que incluiu duas emendas de redação e rejeitou as quatro emendas apresentadas na comissão e as 116 emendas oferecidas na CCJ.

Em seu voto, Acir afirma que proposta “foi amplamente discutida com a sociedade, cientistas, pesquisadores e técnicos da agricultura e da indústria”. Ele disse haver consenso sobre os entraves à exploração do patrimônio genético pela legislação em vigor (MP 2.186/2001).

Assim como Acir, o senador Ronaldo Caiado (DEM-GO) também defende a manutenção do texto como veio da Câmara, sem alteração.

Na CRA, foi rejeitada emenda de redação apresentada pelo senador Donizeti Nogueira (PT-TO) para trocar o termo “população indígena” por “povo indígena”, que designaria melhor a identidade cultural ou étnica. O relator alegou que a Constituição só usa a palavra povo para referir-se ao povo brasileiro, titular do poder soberano do país.

Foi incluída emenda de redação que trata especificamente das competências do Conselho de Gestão do Patrimônio Genético (CGEN) e da Comissão Técnica Nacional de Biossegurança (CTNBio),  para dar maior clareza às atribuições de cada órgão, regulamentados individualmente por lei própria.

Ciência e tecnologia

Na quarta-feira (25), o projeto passou pela Comissão de Ciência, Tecnologia, Inovação, Comunicação e Informática (CCT) e, em seguida, pela Comissão de Meio Ambiente, Fiscalização e Controle (CMA) e pela Comissão de Assuntos Econômicos (CAE). Na CCT foi aprovado o relatório de Telmário Mota, que modifica o termo população indígena, utilizado em diversas partes do projeto, por povos indígenas. Conforme Telmário, essa é a terminologia adequada às leis brasileiras e aos acordos internacionais dos quais o Brasil é signatário.

Também foi aprovada a obrigação de repartição de benefícios sempre que um produto resultar de uso de patrimônio genético ou de conhecimento tradicional associado, desde que o componente do patrimônio genético ou do conhecimento associado seja um dos elementos de agregação de valor do produto.

O parecer acatado pela CCT transforma a exigência de lista positiva — de produtos passíveis de repartição de benefícios — em lista negativa — de produtos cujos benefícios não devem ser repartidos. Com a mudança, será então instituída pelo governo federal uma lista de produtos isentos de repartição de benefícios.

Assuntos econômicos

Na CAE foi aprovado o relatório de Douglas Cintra (PTB-PE), com oito emendas acolhidas. No parecer, ele rejeitou as emendas com proposta de alteração da denominação “população indígena”, usada no texto original, por “povos indígenas”. Ele também não acatou as mudanças sugeridas na definição de “elementos principais” de agregação de valor ao produto para designar aqueles elementos cuja presença no produto acabado é determinante para a existência das características funcionais ou para a formação do apelo mercadológico.

O senador acolheu emendas que propõem destinar a repartição de benefícios na modalidade não monetária para unidades de conservação, terras indígenas, territórios quilombolas e áreas prioritárias para a conservação de biodiversidade. O texto da Câmara deixa a cargo do fabricante do produto oriundo de acesso ao patrimônio genético a indicação do beneficiário da repartição.

Também foi acolhida emenda que exclui a possibilidade de empresa estrangeira sem associação com instituição nacional acessar o patrimônio genético ou receber amostra desse patrimônio genético.

Ao rejeitar as emendas que tratam do conceito de “agricultor tradicional” para incluir também o “agricultor familiar”, Douglas Cintra absorveu o mérito das propostas e sugeriu o acréscimo da expressão ao previsto no projeto da Câmara.

Emendas que propõem a exclusão da vinculação à lei de proteção de cultivares e do sistema nacional de sementes e mudas também foram rejeitadas. O relator apresentou emenda para prever que o objeto de uso e da venda dos produtos pelos provedores tradicionais recairá sobre produtos, variedades tradicionais locais ou raças localmente adaptadas ou crioulas, permitindo assim a exclusão à remissão das citadas leis sem afetar seus destinatários.

O senador também não acatou as emendas que propõem a elaboração de uma lista de classificação de repartição de benefícios com todos os produtos sujeitos à repartição. Para superar o impasse sobre a natureza dessa lista, ele apresentou alternativa que prevê a definição da lista de classificação de repartição de benefícios por decreto.

Foram rejeitadas ainda as emendas propostas para excluir o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento do rol de órgãos competentes para fiscalização das infrações contra o patrimônio genético e conhecimento tradicional associado. Em seu lugar foi apresentada emenda de relator para que as infrações que envolverem o patrimônio genético de conhecimento tradicional associado às atividades agrícolas sejam fiscalizadas de forma articulada pelo Ibama e pelo referido ministério.

Meio ambiente

Na CMA foi aprovado o relatório de Jorge Viana, que possivelmente deve relatar a matéria, pela CCJ, no Plenário do Senado na terça (31). Em seu parecer há emendas que modificam 15 aspectos do texto da Câmara.

Ele acatou diversas emendas para ampliar a proteção a provedores de conhecimento tradicional, a maioria delas reunidas no texto base de seu relatório. Restaram sete aspectos divergentes, que foram destacados pelos senadores Ronaldo Caiado (DEM-GO), Reguffe (PDT-DF) e João Capiberibe (PSB-AP) e votados separadamente. Todos os destaques foram rejeitados.

Caiado queria a manutenção do termo população indígena na nova lei, a repartição de benefício só quando o componente do patrimônio genético ou do conhecimento tradicional associado fosse o principal elemento de agregação de valor ao produto e a isenção de repartição de benefício a toda exploração econômica resultado de acesso ao patrimônio genético antes de junho de 2000.

Reguffe apresentou destaques para excluir da lei dispositivos que anulam sanções e multas para aqueles que acessaram de forma irregular o patrimônio genético ou o conhecimento tradicional associado, conforme penalidades da legislação em vigor (MP 2.186/2001).

Já Capiberibe pediu a exclusão de dispositivo que isenta de repartição de benefício a exploração econômica resultado de acesso ao patrimônio genético antes de junho de 2000.

Principais mudanças aprovadas na CMA

- Estabelecer que será por decreto do Executivo a definição da Lista de Classificação de Repartição de Benefícios, com base na Nomenclatura Comum do Mercosul. Dessa forma, sai da nova lei a previsão se será lista positiva - de produtos passíveis de repartição de benefícios – ou lista negativa - de produtos isentos da repartição.

- Assegurar que, em caso de acesso a conhecimento tradicional associado de origem não identificável, os órgãos de defesa dos direitos de populações indígenas e de comunidades tradicionais deverão ser ouvidos, para definição de acordo setorial. O texto original previa que esses órgãos poderiam ser consultados.

- Determinar que, nas infrações que envolverem acesso a patrimônio genético ou a conhecimento tradicional associado em atividades agrícolas, a competência de fiscalização será de forma articulada pelo Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento e Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama).

- Estabelecer que repartição de benefícios prevista em acordo internacional não se aplica à exploração econômica de material reprodutivo para fins de atividade agrícola de espécie introduzida no país pela ação humana até a entrada em vigor desta Lei, ressalvada a obrigação prevista no Tratado Internacional sobre Recursos Fitogenéticos para a Alimentação e a Agricultura.

- Explicitar no conceito de agricultor tradicional que inclui o agricultor familiar;

- Substituir o termo “população indígena”, utilizado no substitutivo, por “povos indígenas”, para resguardar o sentido de identidade cultural, identidade étnica e o direito dos indígenas perante as leis brasileiras acordos internacionais assinados pelo Brasil.

- Determinar a obrigação da repartição de benefício sempre que um produto resultar de uso de conhecimento tradicional associado, mesmo que o componente desse conhecimento não esteja entre os principais elementos de agregação de valor ao produto. O substitutivo da Câmara limitava a casos em que o componente fosse um dos principais elementos de agregação de valor.

- Excluir a vinculação da definição de sementes crioulas à Lei de Proteção de Cultivares (Lei 9.456/1997) e ao Sistema Nacional de Sementes e Mudas (Lei 10.711/2003).

- Excluir dispositivo que permite a empresa estrangeira sem associação com instituição nacional acessar o patrimônio genético ou receber amostra desse patrimônio genético.

- Estender a povos indígenas e comunidades tradicionais a isenção da obrigação de repartição de benefícios, já prevista no projeto para microempresas, empresas de pequeno porte, microempreendedores individuais, agricultores tradicionais e suas cooperativas.

- Limitar a isenção da obrigação de repartição de benefícios à exploração econômica realizada antes de 29 de junho de 2000, data da edição da primeira medida provisória sobre o tema. O substitutivo da Câmara isenta de repartição de benefício produto resultado de acesso ao patrimônio genético antes de 29 de junho de 2000, mesmo que explorado após essa data.

- Determinar que seja por decreto do Executivo a escolha da forma de repartição de benefícios na modalidade não monetária, e não por ato de ministérios, como previsto no substitutivo. A modalidade de repartição não monetária inclui, entre outras, transferência de tecnologia, isenção de taxas de licenciamento de produto e apoio à proteção da biodiversidade.

- Destinar para unidades de conservação, terras indígenas, territórios quilombolas e áreas prioritárias para a conservação de biodiversidade a repartição de benefícios na modalidade não monetária. O substitutivo deixa a cargo do fabricante do produto oriundo de acesso ao patrimônio genético a indicação do beneficiário da repartição.

Agência Senado (Reprodução autorizada mediante citação da Agência Senado)