Exigência de farmacêutico em drogarias volta a causar polêmica em audiência pública

Tércio Ribas Torres | 11/11/2014, 17h32

A presença obrigatória de um farmacêutico na farmácia voltou a causar divergências na tarde desta terça-feira (11), em audiência pública promovida pela comissão que analisa medida provisória sobre o assunto (MP 653/2014). Na primeira audiência sobre o tema, na semana passada, a exigência já havia provocado polêmica.

A MP 653/2014 relaxa a exigência de farmacêutico em farmácias caracterizadas como pequenas ou microempresas. Pela Lei 13.021/2014, publicada em agosto, a presença desse profissional é obrigatória em todos os estabelecimentos farmacêuticos, enquanto o comércio funcionar. Com a medida provisória, porém, as farmácias enquadradas no Estatuto da Micro e Pequena Empresa (Lei Complementar 123/2014) passaram a adotar as regras da Lei 5.991/1973. Essa lei permite, em casos específicos, a presença de "prático de farmácia, oficial de farmácia ou outro", inscrito em Conselho Regional de Farmácia (CRF), como responsável do estabelecimento.

Para o assessor jurídico da Secretaria de Micro e Pequena Empresa da Presidência da República, José Levi de Mello Amaral Júnior, a MP é importante principalmente para as pequenas localidades, em que há dificuldade para encontrar farmacêuticos. Conforme explicou José Levi, a MP estabelece que no caso de farmácias caracterizadas como micro e pequenas empresas, esses estabelecimentos, desde que comprovada a ausência de farmacêutico na região, podem funcionar com um profissional responsável inscrito nos CRFs, como práticos ou oficiais de farmácia. Essas unidades ainda devem ser licenciadas pela autoridade sanitária local.

- Havendo farmacêutico, será este e necessariamente este o responsável. É preciso ser coerente com a realidade: não se tem farmacêutico para todas as drogarias do país – disse, defendendo a MP.

O presidente do Conselho Federal de Farmácia (CFF), Walter da Silva Jorge João, chegou a pedir desculpas por não conseguir deixar de mostrar a frustração de ter que discutir uma MP que deixou a todos os envolvidos “perplexos”. Para o presidente do CFF, a MP “mutila” a lei original. Ele disse que a versão final da lei foi redigida no gabinete da Casa Civil, com representantes de vários setores do comércio de remédios. Para João, o interesse econômico não pode se sobrepor ao interesse da saúde.

- A MP foi editada com o claro propósito de criar um grande imbróglio, depois de uma ampla discussão sobre a legislação que foi aprovada aqui no Congresso Nacional – criticou João, que garantiu que o Brasil tem farmacêuticos suficientes para atender a todas as drogarias.

Judicialização

De acordo com Alexandre Correia dos Santos, presidente da Federação Interestadual Farmacêutica, muitas das pequenas cidades oferecem um salário muito baixo, além de desrespeitarem a legislação trabalhista do farmacêutico. Ele disse que o tratamento diferenciado entre as farmácias, criado pela MP, pode judicializar a questão, já que a lei não traz a figura do técnico de farmácia. Na visão de Alexandre Correia dos Santos, a ausência de um farmacêutico pode causar problemas para a saúde pública.

- Somos pela defesa da saúde da população e pelo acesso ao atendimento do serviço do farmacêutico – declarou.

Para o diretor do Departamento de Assistência Farmacêutica e Insumos Estratégicos do Ministério da Saúde, José Miguel do Nascimento Júnior, a Lei 13.021 representa uma conquista para o povo brasileiro, ao identificar a farmácia como uma unidade de saúde e não comercial. José Miguel Júnior sugeriu que a MP inclua um artigo na lei, para prever a inscrição dos técnicos de farmácia nos CRFs, deixando aos conselhos a responsabilidade de regular a atuação desses profissionais.

O deputado Ivan Valente (PSOL-SP) lembrou que a Lei 13.021 passou, ao longo de 17 anos, por todas as tramitações e debates possíveis e contou com o compromisso do governo e das entidades representativas. Valente, que foi o responsável pelo substitutivo que resultou no texto final da lei, lamentou que poucos parlamentares tenham comparecido às audiências públicas da comissão e fez questão de manifestar sua “contrariedade absoluta” com o texto da MP.

- Eu não entendi a troco de quê a Presidência da República editou essa medida provisória. Só serve para judicializar o processo – criticou o deputado, que voltou a defender a perda da validade da MP.

Transformação

O presidente da Associação Brasileira de Redes de Farmácias e Drogarias (Abrafarma), José Mena Barreto, lembrou que em muitos países as farmácias estão sendo transformadas em lojas de conveniência. Assim, disse Barreto, a farmácia vem transformando seu papel na sociedade e está mais próxima do consumidor do que o médico. Segundo o presidente da Abrafarma, um novo papel para as farmácias está surgindo também no Brasil. Ele destacou que o Supremo Tribunal Federal (STF) já decidiu que as leis estaduais que permitem a venda de produtos de conveniência são constitucionais. Ele ainda elogiou o diálogo que resultou na Lei 13.021 e informou que o Brasil tem cerca de 85 mil farmácias, das quais 74 mil são micro e pequenas empresas.

O deputado Manoel Junior (PMDB-PB) elogiou os debatedores e disse que o contraditório é importante para as conclusões do seu relatório. Ele fez questão de destacar que a comissão não está a serviço de conselhos, sindicatos ou farmacêuticos, mas sim a serviço de todos os cidadãos brasileiros.

- O legislador precisa ser cirúrgico e tem que deixar o texto da lei o mais pontual possível. Vamos fazer o relatório de forma a aprimorar a legislação – afirmou o relator.

A audiência foi dirigida pela senadora Vanessa Grazziotin (PCdoB-AM), presidente da comissão, que tem o deputado Francisco Chagas (PT-SP) como vice-presidente e o senador Paulo Davim (PV-RN) como relator-revisor. Uma nova reunião da comissão foi convocada para quinta-feira (13), às 9h30, para apresentação do relatório da MP.

Agência Senado (Reprodução autorizada mediante citação da Agência Senado)

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