Ouvidoria abre canal para monitorar serviços

Guilherme Oliveira | 30/10/2018, 10h25

No início deste mês, a Ouvidoria-Geral da União (OGU) passou a publicar um painel de estatísticas sobre as relações entre os órgãos da administração pública federal e os cidadãos. O Painel Resolveu? apresenta os resultados da coleta e análise de números referentes aos serviços de atendimento das ouvidorias públicas do país, bem como do acesso a esses serviços, numa perspectiva ampla.

Aumentar a presença virtual das ouvidorias públicas é uma aposta da Ouvidoria-Geral para otimizar a atividade. Atualmente é possível fazer denúncias, sugestões, reclamações, solicitações ou elogios a qualquer ouvidoria federal por meio do Portal e-OUV, um sistema centralizado. A Controladoria-Geral da União também recebe manifestações feitas em seus perfis nas redes sociais, de acordo com o ouvidor-geral, Gilberto Waller Júnior. Ele acredita que manter essa estrutura faz parte das atribuições da ouvidoria moderna:

— O Estado não está esperando que o cidadão acione o canal oficial. Está indo buscar a demanda onde ela estiver. É mais fácil ficar passivo, esperando, mas hoje o cidadão conversa em outros meios.

A busca por maior capilaridade para o trabalho das ouvidorias se dá num contexto nacional peculiar — o da avaliação negativa dos serviços fornecidos pelo Estado. Recuperar a credibilidade é uma missão que necessita, entre outros ingredientes, de sistemas de percepção bem posicionados junto aos cidadãos.

Legislação

O trabalho das ouvidorias públicas do país se escora, desde 2017, na legislação mais completa sobre o tema. A Lei de Proteção e Defesa dos Usuários de serviços Públicos, sancionada em junho, se originou de um projeto do Senado (PLS 439/1999, do ex-senador Lúcio Alcântara).

A lei explicita os direitos básicos dos cidadãos diante da administração pública, direta e indireta, regulamenta ferramentas para avaliação e transparência de serviços públicos e disciplina prazos e condições para abertura de processo administrativo para apurar danos causados pelos agentes públicos.

Cabe às ouvidorias encaminhar uma demanda em até 60 dias (30 dias, com uma prorrogação). Outros órgãos podem complementar as informações no prazo máximo de 40 dias.

A multiplicidade de canais abertos para a população é atributo fundamental para o trabalho de uma ouvidoria pública. Além disso, a capacidade de iniciativa própria é uma característica que está nas origens do trabalho desses órgãos no Brasil.

É o que explica o jurista Manoel Eduardo Gomes, responsável pela condução da primeira ouvidoria estatal na história moderna do país: a da Prefeitura de Curitiba, entre 1986 e 1989. O ouvidor, observa Gomes, pode agir de ofício, a partir de notícias veiculadas pela imprensa ou de denúncias anônimas, sem precisar aguardar uma comunicação formal através dos canais oficiais.

A presidente da Associação Brasileira de Ouvidores/Ombudsman (ABO) no Distrito Federal, Danielle Ventura, descreve o profissional como um “facilitador” da comunicação entre duas partes.

— O ouvidor veste duas camisas ao mesmo tempo. Representamos a voz do cidadão dentro da instituição e, quando conseguimos o retorno, representamos a instituição para o cidadão.

Além de um canal de controle social, as ouvidorias são um instrumento de gestão. A resolução individual de cada problema encaminhado é o primeiro nível do trabalho do ombudsman, mas se resumir a isso seria “enxugar gelo”, com explica o ouvidor-geral da União.

— O que uma ouvidoria tem que fazer é uma análise qualitativa da demanda. o conjunto das reclamações mostra ao gestor a efetividade de uma política pública, de um serviço — diz Gilberto Waller Junior.

A consolidação estatística que a OGU passou a promover se relaciona com essa percepção, segundo Waller. Mapear onde se localizam as manifestações da sociedade a respeito de órgãos e programas, e também qual é a natureza delas, permite o aprimoramento da máquina pública.

Educação

Os números do Resolveu? mostram que a maior parte dos apelos a ouvidorias desde 2014 tem a ver com assuntos relacionados a educação: o Exame Nacional do Ensino médio (Enem) e o Fundo de Financiamento ao Estudante do Ensino superior (Fies) têm, combinados, mais de 15 mil manifestações nos canais federais. Além disso, o Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep), órgão responsável pelo Enem, é um dos mais procurados na administração federal: mais de 19 mil manifestações foram direcionadas a ele.

O tema individual com a maior procura é o Programa Microempreendedor Individual (MEI), que reúne, sozinho, mais de 11 mil manifestações. Entre os órgãos, a Controladoria-Geral da União é a mais acionada: mais de 41 mil manifestações.

Uma ouvidoria eficiente também pode contribuir para reduzir os custos da administração. Atuando como mediadores de conflitos entre os cidadãos e o Estado, elas são capazes de reduzir a margem para litígio judicial. Essa é a lógica predominante da atividade no setor privado.

No caso do Executivo federal brasileiro, a importância do aprimoramento das ouvidorias se mostra mais premente hoje, na esteira de investigações em grande escala, até mesmo do ponto de vista policial, relacionadas ao uso de verbas orçamentárias por meio da interação entre agentes públicos e privados.

O jurista Manoel Eduardo Gomes avalia que os eventos dos últimos anos revelaram o “pouco papel curativo” das ouvidorias brasileiras, uma vez que, na sua opinião, elas pouco puderam fazer para impedir ou minimizar os danos à imagem da administração pública.

Para ele, é preciso estabelecer uma rede fortalecida de ouvidorias com respaldo inquestionável da administração para realizar o trabalho. No comando dessa estrutura, opina ele, deveria estar um “notável”, uma figura de nome conhecido e histórico público.

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Agência Senado (Reprodução autorizada mediante citação da Agência Senado)